Fonte: Livro Imunologia Celular e Molecular - 8ª Ed.
Autores: Abul Lichtman, Andrew Abbas
Doenças Causadas por Anticorpos contra Células Fixas e Antígenos de Tecido
Doenças Mediadas por Imunocomplexos
DOENÇAS CAUSADAS POR LINFÓCITOS T
Doenças Causadas por Inflamação Mediada por Citocinas
Doenças Causadas por Linfócitos T Citotóxicos
ABORDAGENS TERAPÊUTICAS PARA AS DOENÇAS IMUNOLÓGICAS DOENÇAS IMUNOLÓGICAS SELECIONADAS: PATOGENIA E ESTRATÉGIAS TERAPÊUTICAS
Lúpus Eritematoso Sistêmico (LES): O Protótipo de Doença Mediada por Imunocomplexo
Artrite Reumatoide
Esclerose Múltipla Diabetes Melito Tipo 1
Doença Inflamatória Intestinal
RESUMO
A imunidade adaptativa tem a importante função de defesa do hospedeiro contra infecções microbianas, mas as respostas imunológicas também são capazes de produzir lesão tecidual e doenças. Os distúrbios causados por respostas imunes são chamados de hipersensibilidade. Este termo surgiu da definição clínica de imunidade como uma sensibilidade, baseando-se na observação de que um indivíduo que tenha sido exposto a um antígeno exibe uma reação detectável, ou torna-se sensível, a encontros subsequentes com esse antígeno. Em geral, as respostas imunes erradicam os organismos infectantes sem provocar graves lesões aos tecidos do hospedeiro. No entanto, essas respostas são, algumas vezes, controladas de maneira inadequada, inapropriadamente direcionadas aos tecidos do hospedeiro ou desencadeadas por microrganismos comensais ou antígenos ambientais, os quais geralmente são inofensivos. Nestas situações, a resposta imune, normalmente benéfica, torna-se a causa da doença.
Neste capítulo, descreveremos a patogenia de diferentes tipos de reações de hipersensibilidade, com ênfase nos mecanismos efetores que causam lesão tecidual.
Concluiremos com uma breve consideração sobre o tratamento de doenças imunológicas e exemplos de doenças que ilustram princípios importantes.
Causas da hipersensibilidade
As respostas imunes contra antígenos de diferentes fontes podem ser a causa subjacente de distúrbios de hipersensibilidade.• Autoimunidade: reações contra antígenos próprios. A falha dos mecanismos normais de autotolerância resulta em reações contra as próprias células e tecidos. Esse fenômeno é chamado de autoimunidade (Cap. 15). As doenças causadas por reações de autoimunidade são denominadas doenças autoimunes. Estima-se que as doenças autoimunes afetem, pelo menos, 2% a 5% da população nos países desenvolvidos, de modo que essa incidência é crescente. Muitas dessas doenças são comuns em indivíduos da faixa etária entre 20 a 40 anos de idade. Elas também são mais comuns em mulheres do que em homens, por motivos ainda desconhecidos. As doenças autoimunes são crônicas e debilitantes e representam um enorme fardo médico e econômico. Embora no passado, o tratamento para esses distúrbios tenha se mostrado frustrantes, foram desenvolvidas muitas abordagens novas e eficazes no início do século XXI com base em princípios científicos. Os mecanismos de autoimunidade foram descritos no Capítulo 15. Neste capítulo, apresentaremos diversas doenças autoimunes para ilustrar como a autoimunidade pode causá-las.
• Reações contra microrganismos. As respostas imunes contra antígenos microbianos podem causar doença se as reações forem excessivas ou se os microrganismos forem anormalmente persistentes. As respostas das células T contra microrganismos persistentes podem dar origem a uma inflamação grave, algumas vezes, com a formação de granulomas; esta é a causa da lesão tecidual observada na tuberculose e algumas outras infecções crônicas. Se forem produzidos anticorpos contra antígenos microbianos, eles podem se ligar aos antígenos para produzir imunocomplexos, que se depositam nos tecidos e desencadeiam inflamação. Raramente, os anticorpos ou células T contra um microrganismo apresentarão uma reação cruzada com o tecido do hospedeiro. Em algumas doenças que envolvem o trato intestinal, denominadas doença do intestino irritável, a resposta imune é direcionada contra bactérias comensais que normalmente residem no intestino e não causem danos. Muitas vezes, os mecanismos que uma resposta imune usa para erradicar um microrganismo patogênico requerem a morte das células infectadas e, por conseguinte, causam lesão do tecido do hospedeiro. Por exemplo, na hepatite viral, o vírus que infecta as células hepáticas não é citopático, mas é reconhecido como estranho pelo sistema imunológico. Os linfócitos T citotóxicos (CTLs) tentam eliminar as células infectadas, e essa resposta imune normal danifica as células do fígado. Esse tipo de reação normal não é considerada hipersensibilidade.
• Reações contra antígenos ambientais. A maioria dos indivíduos saudáveis não reage contra substâncias ambientais comuns, em geral inofensivas, mas quase 20% da população é anormalmente responsiva a uma ou mais destas substâncias. Esses indivíduos produzem anticorpos imunoglobulina E (IgE) que causam doenças alérgicas (Cap. 20). Alguns indivíduos tornam-se sensibilizados a antígenos ambientais e substâncias químicas, que, em contato com a pele, desenvolvem reações de células T que levam à inflamação mediada por citocinas, resultando em sensibilidade de contato.
Em todas essas condições, os mecanismos de lesão do tecido são os mesmos normalmente observados na eliminação de agentes infecciosos. Esses mecanismos incluem respostas imunes inatas e adaptativas que envolvem fagócitos, anticorpos, linfócitos T, mastócitos e várias outras células efetoras, além dos mediadores da inflamação. O problema na hipersensibilidade é que a resposta imune não é controlada adequadamente. Como os estímulos para essas respostas imunes anormais são difíceis ou impossíveis de se eliminar (p. ex., autoantígenos, microrganismos comensais e antígenos ambientais) e o sistema imune possui muitas alças de retroalimentação positiva intrínsecas (mecanismos de amplificação), sempre que uma resposta imune patológica é iniciada, é difícil controlá-la ou interrompê-la. Dessa maneira, as doenças de hipersensibilidade tendem a ser crônicas e progressivas, representando verdadeiros desafios terapêuticos na clínica médica.
Mecanismos e classificação das reações de hipersensibilidade
As hipersensibilidades são geralmente classificadas de acordo com o tipo de resposta imune e o mecanismo efetor responsável pela lesão celular e tecidual (Tabela 19-1).Tabela 19-1
Classificação das Doenças de Hipersensibilidade
• A hipersensibilidade imediata (hipersensibilidade do tipo I), causada por anticorpos IgE específicos para antígenos ambientais, é o tipo mais prevalente de hipersensibilidade e será descrita separadamente no Capítulo 20. A hipersensibilidade imediata, comumente chamada de alergia ou atopia, é o exemplo de doença resultante da ativação de células T auxiliares produtoras de IL-4, IL-5 e IL-13, classicamente denominadas células TH2, onde as células T estimulam a produção de anticorpos IgE e a inflamação.
• Os anticorpos IgG e IgM podem causar lesão tecidual por meio da ativação do sistema complemento, recrutando células inflamatórias e interferindo nas funções celulares normais. Alguns desses anticorpos são específicos para antígenos de determinadas células ou da matriz extracelular e são encontrados ligados a essas células ou tecidos ou como anticorpos livres na circulação; as doenças induzidas por esses anticorpos são chamadas de hipersensibilidade do tipo II. Outros anticorpos podem formar imunocomplexos na circulação – de modo que os complexos são subsequentemente depositados nos tecidos, particularmente nas paredes dos vasos sanguíneos – e causar lesões. As doenças decorrentes de imunocomplexos também são chamadas de hipersensibilidade do tipo III.
• A lesão tecidual pode ocorrer em razão dos linfócitos T que induzem inflamação ou matam diretamente as células-alvo; tais condições são chamadas de hipersensibilidade do tipo IV. Elas são causadas principalmente pela ativação de células T auxiliares CD4 + , as quais secretam citocinas que promovem a inflamação e ativam os leucócitos, especialmente neutrófilos e macrófagos. As células T auxiliares também estimulam a produção de anticorpos que danificam os tecidos e induzem a inflamação. Os CTLs contribuem para a lesão de tecidos em determinadas doenças.
Essa classificação é útil porque diferentes tipos de respostas imunopatológicas mostram distintos padrões de lesão tecidual e podem variar em relação à especificidade para o tecido. Como resultado, os diferentes mecanismos imunológicos produzem distúrbios com características clínicas e patológicas distintas. No entanto, em humanos, as doenças imunológicas são frequentemente complexas e causadas por combinações de respostas imunes humorais e mediadas por células, além de múltiplos mecanismos efetores. Essa complexidade não é surpreendente, dado que um único antígeno pode normalmente estimular ambas as respostas imunes humoral e mediada por células, nas quais são produzidos diversos tipos de anticorpos e de células T efetoras. Como os principais componentes da patologia e das manifestações clínicas dessas doenças são os múltiplos mecanismos que podem estar envolvidos e a repetição dos ataques de inflamação, eles podem ser, algumas vezes, agrupados sob a designação de doenças inflamatórias imunomediadas. Como discutiremos mais adiante neste capítulo, essas doenças, quando agrupadas, também possuem algum valor clínico, uma vez que muitas delas são tratadas com os mesmos agentes biológicos ou com agentes relacionados. Na discussão que se segue, utilizaremos as descrições que identificam os mecanismos patogênicos, em vez das designações numéricas menos informativas para os tipos de hipersensibilidade. Com esta introdução, vamos proceder a uma discussão sobre doenças mediadas por anticorpos e por células T.
Doenças causadas por anticorpos
Doenças mediadas por anticorpos são produzidas por anticorpos que se ligam a antígenos em determinadas células ou em tecidos extracelulares ou, ainda, por complexos antígenoanticorpo que se formam na circulação e são depositados nas paredes dos vasos (Fig. 19-1). Para provar que a doença é causada por anticorpos, seria necessário demonstrar que as lesões podem ser induzidas em um animal normal pela transferência passiva de imunoglobulina purificada do sangue ou tecidos afetados de indivíduos com a doença. Ocasionalmente, é possível observar um experimento dessa natureza em crianças cujas mães sofrem de doenças mediadas por anticorpos. Essas crianças podem nascer com manifestações transitórias de tais doenças em razão da passagem transplacentária de anticorpos. No entanto, em situações clínicas, o diagnóstico de doenças causadas por anticorpos ou imunocomplexos geralmente se baseia na demonstração de anticorpos ou de imunocomplexos na circulação ou depositados nos tecidos, além das semelhanças clinicopatológicas com doenças experimentais que se provaram ser mediadas por transferência adotiva de anticorpos.FIGURA 19-1 Tipos de doenças mediadas por anticorpos.
A, Os anticorpos podem se ligar especificamente a antígenos teciduais e os leucócitos recrutados causam lesão tecidual. B, Complexos de antígenos e anticorpos podem se formar na circulação e se depositar nos vasos sanguíneos e em outros locais. Esses imunocomplexos induzem inflamação vascular e subsequente dano isquêmico aos tecidos. Os anticorpos contra proteínas celulares também podem provocar depleção de células e anormalidades funcionais (não mostrado).
Doenças Causadas por Anticorpos contra Células Fixas e Antígenos de Tecido
Os anticorpos contra os antígenos celulares ou da matriz causam doenças que afetam especificamente as células ou tecidos onde esses antígenos estão presentes e, frequentemente, essas doenças não são sistêmicas. Os anticorpos contra antígenos de tecidos produzem doença por três mecanismos principais (Fig. 19-2).FIGURA 19-2 Mecanismos efetores da doença mediada por anticorpo.
A, Os anticorpos opsonizam as células e podem ativar o complemento, gerando produtos do complemento que também opsonizam células, levando à fagocitose delas por meio dos receptores de Fc ou receptores para C3b nos fagócitos. B, Os anticorpos recrutam os leucócitos pela ligação aos receptores de Fc ou pela ativação do complemento e, então, liberam subprodutos que são quimiotáticos para leucócitos. C, Os anticorpos específicos para receptores de hormônios ou de neurotransmissores da superfície celular podem estimular a atividade desses receptores mesmo na ausência do hormônio, como se observa na doença de Graves (hipertireoidismo) (painel à esquerda), ou podem inibir a ligação do neurotransmissor ao seu receptor, como ocorre na miastenia grave (painel à direita). TSH, hormônio estimulante da tireoide (do inglês thyroidstimulating hormone).
• Opsonização e fagocitose. Os anticorpos que se ligam a antígenos da superfície celular podem opsonizar diretamente as células ou ativar o sistema complemento, resultando na produção de proteínas do complemento que opsonizam as células. Essas células opsonizadas são fagocitadas e destruídas pelos fagócitos, que expressam receptores para as porções Fc dos anticorpos IgG e receptores para proteínas do complemento. Este é o principal mecanismo de destruição celular na anemia hemolítica autoimune e púrpura trombocitopênica autoimune, nas quais os anticorpos específicos para os eritrócitos ou para as plaquetas, respectivamente, levam à opsonização e remoção dessas células da circulação. O mesmo mecanismo é responsável pela hemólise nas reações transfusionais (Cap. 17).
• Inflamação. Os anticorpos depositados nos tecidos recrutam neutrófilos e macrófagos, que se ligam aos anticorpos ou às proteínas do complemento ligadas pelos receptores de Fc de IgG e do complemento. Esses leucócitos são ativados pela sinalização dos receptores (particularmente receptores de Fc) e produtos de leucócitos, incluindo enzimas lisossomais e espécies reativas de oxigênio, que são liberados e produzem lesão tecidual. O mecanismo de lesão na glomerulonefrite mediada por anticorpos e em muitas outras doenças é a inflamação e ativação de leucócitos.
• Funções celulares anormais. Os anticorpos que se ligam a receptores celulares normais ou outras proteínas podem interferir nas funções destes receptores ou proteínas e causar doença sem inflamação ou dano tecidual. Os anticorpos específicos para o receptor do hormônio estimulante da tireoide ou o receptor nicotínico da acetilcolina provocam anormalidades funcionais que levam à doença de Graves e à miastenia grave, respectivamente (Fig. 19-2, C). Os anticorpos específicos para o fator intrínseco, necessários para a absorção de vitamina B12 , causam anemia perniciosa.
Os anticorpos que causam doenças específicas de células ou de tecido geralmente são autoanticorpos produzidos como parte de uma reação autoimune, mas, algumas vezes, esses anticorpos são específicos para microrganismos. Exemplos de autoanticorpos contra antígenos dos tecidos estão listados na Tabela 19-2. Menos frequentemente, os anticorpos podem ser produzidos contra um antígeno estranho (p. ex., microbiano) que é imunologicamente reativo a um componente de tecidos próprios. Em uma rara sequela de infeção estreptocócica conhecida como febre reumática, os anticorpos produzidos contra as bactérias reagem de forma cruzada com antígenos do coração, depositam-se neste órgão e produzem inflamação e danos teciduais. Os depósitos de anticorpos no tecido podem ser detectados por exame morfológico em algumas dessas doenças, e a deposição de anticorpo frequentemente está associada a ativação local de complemento, inflamação e lesão dos tecidos (Fig. 19-3, A).
Tabela 19-2
Exemplos de Doenças Causadas por Anticorpos Específicos para Células ou Tecidos
ANCA, anticorpos citoplasmáticos antineutrófilos (do inglês anti-neutrophil cytoplasmic antibodies); TSH, hormônio estimulante da tireoide (do inglês thyroid-stimulating hormone).
FIGURA 19-3 Características patológicas da glomerulonefrite mediada por anticorpos.
A, Glomerulonefrite induzida por um anticorpo contra a membrana basal glomerular (síndrome de Goodpasture): a micrografia de luz mostra a inflamação glomerular e o dano grave, ao passo que a imunofluorescência evidencia os depósitos de anticorpo planos (lineares) ao longo da membrana basal. B, Glomerulonefrite induzida pela deposição de imunocomplexos (lúpus eritematoso sistêmico): a micrografia de luz mostra a inflamação neutrofílica, ao passo que a imunofluorescência e a eletromicrografia evidenciam os depósitos grosseiros (granulares) de complexos antígeno-anticorpo ao longo da membrana basal. (Micrografias de imunofluorescência foram cortesia de Dr. Jean Olson, Department of Pathology, University of California, San Francisco, e a eletromicrografia foi cortesia de Dr. Helmut Rennke, Department of Pathology, Brigham and Women’s Hospital, Boston, Massachusetts.)
Doenças Mediadas por Imunocomplexos
Os imunocomplexos que causam doença podem ser compostos por anticorpos ligados a autoantígenos ou a antígenos estranhos. As características patológicas das doenças provocadas por imunocomplexos refletem o local de deposição do complexo antígenoanticorpo e não são determinadas pela fonte celular do antígeno. Dessa maneira, as doenças mediadas por imunocomplexos tendem a ser sistêmicas e afetar vários órgãos e tecidos, embora alguns sejam particularmente suscetíveis, como os rins e as articulações.Desde o início dos anos 1900, suspeita-se da ocorrência de doenças causadas por imunocomplexos. O responsável por essa suspeita foi um médico astuto chamado Clemens von Pirquet. Naquele tempo, as infeções de difteria eram tratadas com soro de cavalos que tinham sido imunizados com a toxina da difteria, um clássico exemplo de imunização passiva contra a toxina por meio da transferência de soro contendo anticorpos antitoxina. Von Pirquet astutamente observou que determinados pacientes que foram injetados com o soro de cavalo contendo a antitoxina desenvolviam inflamação das articulações (artrite), erupção cutânea e febre. Duas características clínicas dessa reação sugeriam que isso não era resultado da infeção ou de um componente tóxico do próprio soro. Em primeiro lugar, esses sintomas apareciam mesmo após a injeção de um soro de cavalo que não continha a antitoxina; logo, as lesões não poderiam ser atribuídas ao anticorpo antidifteria. Em segundo lugar, os sintomas surgiam pelo menos 1 semana após a primeira injeção de soro de cavalo e mais rapidamente após cada repetição. Von Pirquet concluiu que essa doença ocorria em virtude de uma resposta do hospedeiro a algum componente do soro. Ele sugeriu que o hospedeiro produzia anticorpos contra as proteínas séricas do cavalo e esses anticorpos formavam complexos com as proteínas injetadas, ou seja, essa doença ocorria por causa dos anticorpos produzidos ou dos imunocomplexos. Sabemos, atualmente, quão precisa foi sua conclusão. Ele chamou essa condição de doença do soro. A mesma reação também foi observada em humanos que recebem terapia de soro para o tétano, que também é denominada doença do soro. Esse problema continua preocupante até os dias de hoje na clínica médica, considerando uma proporção de indivíduos que recebem anticorpos monoclonais terapêuticos derivados de roedores ou antissoros policlonais humano para o tratamento de picadas de cobras ou de raiva. Distúrbios mediados por imunocomplexos sistêmicos não relacionados com a injeção de proteína estranha também apresentam os mesmos mecanismos de lesão tecidual, como observado na doença do soro.
Modelos Experimentais de Doenças Mediadas por Imunocomplexos
Doença do SoroMuito do nosso conhecimento atual sobre doenças causadas por imunocomplexo está baseado em análises de modelos experimentais da doença do soro. A imunização de um animal como um coelho com uma grande dose de um antígeno proteico estranho leva à formação de anticorpos contra o antígeno (Fig. 19-4). Esses anticorpos ligam-se e formam complexos com o antígeno circulante, e os complexos são inicialmente captados por macrófagos no fígado e no baço. À medida que mais complexos antígeno-anticorpo são formados, alguns deles são depositados em leitos vasculares. Nesses tecidos, os complexos induzem inflamação rica em neutrófilos pela ativação da via clássica do complemento e pelo acoplamento a receptores de Fc em leucócitos. Como os complexos são frequentemente depositados em pequenas artérias, glomérulos renais e sinóvia das articulações, as manifestações clínicas e patológicas mais comuns são vasculite, nefrite e artrite. Os sintomas clínicos geralmente são de curta duração, e as lesões se curam a menos que o antígeno seja novamente injetado. Esse tipo de doença é um exemplo de doença do soro aguda. Uma doença mais indolente e mais prolongada, denominada doença do soro crônica, é produzida por meio de múltiplas injeções de antígeno, o que leva à formação de complexos menores que são depositados, na maioria das vezes, nos rins, nas artérias e nos pulmões.
FIGURA 19-4 Sequência de respostas imunológicas na doença do soro aguda experimental.
Ainjeção de albumina sérica bovina em um coelho leva à produção de anticorpos específicos e à formação de imunocomplexos. Esses complexos são depositados em diversos tecidos, ativam o complemento (levando à redução sérica das concentrações de proteínas do complemento) e causam lesões inflamatórias que se resolvem conforme os complexos e o antígeno remanescente são removidos e começa a aparecer anticorpo livre (não ligado ao antígeno) na circulação. (Adaptado de Cochrane CG: Immune complex-mediated tissue injury. In Cohen S, Ward PA, McCluskey RT [eds.]: Mechanisms of immunopathology, New York, 1979, Werbel & Peck, pp 29-48. Copyright © 1979, Wiley-Liss, Inc.)
Reação de Arthus
A forma localizada de uma vasculite experimental mediada por imunocomplexo é chamada de reação de Arthus. Ela é induzida pela injeção subcutânea de um antígeno em um animal previamente imunizado ou em um animal no qual tenha sido administrada uma injeção intravenosa de anticorpo específico para o antígeno. Os anticorpos circulantes ligam-se rapidamente ao antígeno injetado e formam imunocomplexos que são depositados nas paredes de pequenas artérias no local da injeção. Esta deposição dá origem a uma vasculite cutânea local, com trombose dos vasos afetados, levando à necrose tecidual. A relevância clínica da reação de Arthus é limitada; ocasionalmente, um indivíduo que recebeu uma dose de reforço de uma vacina pode desenvolver inflamação no local da injeção, em decorrência do acúmulo local de imunocomplexos, como em uma reação de Arthus.
Patogenia das Doenças Mediadas por Imunocomplexos
A quantidade de deposição de imunocomplexos nos tecidos é determinada pela natureza dos complexos e pelas características dos vasos sanguíneos. Os complexos antígenoanticorpo são gerados durante as respostas imunes normais, mas somente provocam doença quando são produzidos em quantidades excessivas, não são eficientemente eliminados e se depositam nos tecidos. Pequenos complexos muitas vezes não são fagocitados e tendem a ser mais depositados em vasos do que os grandes complexos, os quais geralmente são capturados pelos fagócitos. Os complexos contendo antígenos catiônicos ligam-se avidamente a componentes negativamente carregados das membranas basais dos vasos sanguíneos e dos glomérulos renais. Tais complexos normalmente produzem lesão tecidual grave e de longa duração. Os capilares nos glomérulos renais e na sinóvia são locais onde o plasma é ultrafiltrado (para formar a urina e o líquido sinovial, respectivamente), passando através de membranas basais especializadas, e esses locais estão entre os mais comuns de deposição de imunocomplexos. No entanto, os imunocomplexos podem ser depositados em pequenos vasos em praticamente qualquer tecido. Depósitos de anticorpo e de complemento podem ser detectados nos vasos e, se o antígeno for conhecido, também é possível identificar as moléculas de antígeno nos depósitos (Fig. 19-3, B).Os imunocomplexos depositados nas paredes dos vasos e nos tecidos ativam os leucócitos e mastócitos, que, então, secretam citocinas e mediadores vasoativos. Esses mediadores podem aumentar a deposição de imunocomplexo nas paredes dos vasos em razão do aumento da permeabilidade vascular e do fluxo sanguíneo que promovem.
Muitas doenças imunológicas sistêmicas em seres humanos são causadas pela deposição de imunocomplexos nos vasos sanguíneos (Tabela 19-3). O lúpus eritematoso sistêmico (LES) é uma doença autoimune na qual complexos constituídos de antígenos e anticorpos nucleares depositam-se nos rins, nos vasos sanguíneos, na pele e em outros tecidos. Em quase 50% dos casos de um tipo de vasculite mediada por imunocomplexo envolvendo artérias musculares médias, a poliarterite nodosa, os complexos são compostos de antígenos virais e anticorpos e a doença é uma complicação tardia da infeção viral, mais frequentemente com o vírus da hepatite B. Esse também é o mecanismo de uma doença chamada glomerulonefrite pós-estreptocócica, que se desenvolve em casos raros após a infeção estreptocócica e é causada por complexos de antígeno estreptocócico e anticorpos que se depositam nos glomérulos do rim. Em algumas formas de glomerulonefrite, os imunocomplexos não são detectados na circulação, o que nos faz acreditar que os antígenos são inicialmente fixados no rim e os complexos se formam localmente.
Tabela 19-3
Exemplos de Doenças Humanas Mediadas por Imunocomplexos
Doenças causadas por linfócitos T
Os linfócitos T danificam os tecidos pelo desencadeamento de inflamação ou por matar diretamente as células-alvo (Fig. 19-5). As reações inflamatórias são desencadeadas principalmente por células T CD4 + das subpopulações TH1 e TH17, que secretam citocinas que recrutam e ativam os leucócitos. Em algumas doenças mediadas por células T, os CTLs CD8 + matam as células hospedeiras. As células T que causam lesão dos tecidos podem ser autorreativas ou específicas para os antígenos proteicos estranhos que são apresentados no interior ou ligados a células ou tecidos. A lesão tecidual mediada por linfócitos T também pode ser acompanhada de fortes respostas imunes protetoras contra microrganismos persistentes, especialmente microrganismos intracelulares que resistem à erradicação pelos fagócitos e anticorpos.FIGURA 19-5 Mecanismos das doenças mediadas por células T.
A, Nas reações inflamatórias mediadas por citocinas, as células T CD4 + (e, às vezes, as células CD8 + ) respondem aos antígenos dos tecidos secretando citocinas que estimulam a inflamação e ativam os fagócitos, produzindo lesão tecidual. APC, célula apresentadora de antígeno (do inglês antigen-presenting cell). B, Em algumas doenças, as CTLs CD8 + matam diretamente as células dos tecidos.
A grande suspeita de um papel das células T na promoção de uma doença imunológica específica dá-se, em maioria, devido à demonstração da presença de células T em lesões e na deteção de níveis aumentados de citocinas no sangue ou tecidos que podem ser derivadas de células T. Os modelos animais foram muito úteis na elucidação da patogenia desses transtornos.
Doenças Causadas por Inflamação Mediada por Citocinas
Na inflamação imunomediada, as células TH1 e TH17 secretam citocinas que recrutam e ativam leucócitos. IL-17, produzida por células TH17, promove o recrutamento de neutrófilos; interferon-γ (IFN-γ), produzido por células TH1, ativa macrófagos; e o fator de necrose tumoral (TNF) e as quimiocinas, produzidos pelos linfócitos T e outras células, estão envolvidos no recrutamento e ativação de muitos tipos de leucócitos. Apesar de enfatizar as células TH1 e TH17 como as fontes dessas citocinas, muitas outras células podem produzir as mesmas citocinas nas lesões. Por exemplo, em alguns modelos animais de inflamação cutânea crônica, a fonte de IL-17 no início do curso da doença parece ser as células T γδ.A lesão tecidual resulta de produtos dos neutrófilos e macrófagos recrutados e ativados, tais como enzimas lisossomais, espécies reativas de oxigênio, óxido nítrico e citocinas pró-inflamatórias (Cap. 10). As células endoteliais vasculares nas lesões podem expressar níveis aumentados de proteínas de superfície, tais como moléculas de adesão e moléculas MHC classe II, regulados por citocinas. A inflamação associada a doenças mediadas por células T normalmente é crônica, mas crises de inflamação aguda podem se sobrepor em uma condição de inflamação crônica. A hipersensibilidade do tipo tardio (DTH, do inglês delayed-type hypersensitivity) é um exemplo dessas reações inflamatórias e será descrita mais adiante. As reações inflamatórias crônicas frequentemente produzem fibrose, como resultado da secreção de citocinas e de fatores de crescimento por macrófagos e células T.
Muitas doenças autoimunes específicas de órgãos são causadas pela interação de células T autorreativas com autoantígenos, o que leva à liberação de citocinas e inflamação. Acredita-se que esse seja o principal mecanismo de base da artrite reumatoide (AR), da esclerose múltipla, do diabetes melito do tipo 1, da psoríase e de outras doenças autoimunes (Tabela 19-4). Algumas delas são descritas em maior detalhe ao final deste capítulo.
Tabela 19-4
Doenças Mediadas pela Célula T
Lista de exemplos de doenças humanas mediadas por células T. Em muitos casos, a especificidade das células T e os mecanismos de lesão tecidual são referidos com base na similaridade com modelos experimentais dessas doenças em animais. Os papéis das células TH1 e TH17 foi inferido de modelos experimentais e pela presença de citocinas específicas de subpopulações nas lesões humanas. As citocinas podem ser produzidas por outras células além dos linfócitos T CD4 + . Os ensaios de acompanhamento clínico dessas citocinas-alvo podem fornecer novas informações acerca das contribuições das citocinas nas diferentes doenças.
Reações de células T específicas para microrganismos e outros antígenos estranhos também podem levar a inflamação e lesão dos tecidos. Bactérias intracelulares, tais como Mycobacterium tuberculosis, induzem fortes respostas de células T e de macrófagos que resultam em inflamação granulomatosa e fibrose (descritas mais adiante); a inflamação e a fibrose podem causar destruição extensa do tecido e incapacidade funcional, característicamente nos pulmões. A tuberculose é um bom exemplo de uma doença infecciosa, na qual a lesão tecidual se deve, principalmente, à resposta imune do hospedeiro (Cap. 16). Uma variedade de doenças cutâneas que resultam da exposição tópica a produtos químicos e antígenos ambientais, chamada sensibilidade de contato, ocorre em decorrência de reações inflamatórias, provavelmente desencadeadas por neoantígenos formados pela ligação dos produtos químicos a proteínas próprias. As células T CD4 + e CD8 + podem ser a fonte de citocinas nas reações de sensibilidade de contato. Exemplos de sensibilidade de contato incluem erupções cutâneas induzidas por hera venenosa e veneno de carvalho (nas quais as células T reagem contra proteínas próprias que foram modificadas por substâncias químicas produzidas pelas plantas, denominadas uruxióis) e erupções cutâneas induzidas pelo contato com metais (níquel e berílio), além de uma variedade de produtos químicos, tais como tiourama, que é utilizado na fabricação de luvas de látex. Algumas dessas reações tornam-se crônicas e são chamadas clinicamente de eczema. Acredita-se que as respostas das células T contra as bactérias intestinais são a base de algumas formas de doença intestinal inflamatória
A reação inflamatória clássica mediada por células T é chamada de hipersensibilidade de tipo tardio e será descrita a seguir.
Hipersensibilidade do Tipo Tardio
A hipersensibilidade do tipo tardio (DTH) é uma reação inflamatória prejudicial mediada por citocinas resultantes da ativação de células T, particularmente das células T CD4 + . A reação é chamada tardia porque se desenvolve tipicamente 24 a 48 horas após o desafio com o antígeno, em contraste com as reações de hipersensibilidade imediata (alérgicas), que se desenvolvem em minutos (Cap. 20).No modelo animal clássico de DTH, um porquinho-da-índia é imunizado pela primeira vez pela administração de um antígeno de uma proteína em adjuvante; este passo é chamado de sensibilização. Cerca de 2 semanas depois, o animal é desafiado por via subcutânea com o mesmo antígeno e a subsequente reação é analisada; este passo é chamado de fase de elicitação. Humanos podem ser sensibilizados para as reações DTH por infeção microbiana, por sensibilização de contato com produtos químicos e antígenos ambientais ou por injeção intradérmica ou subcutânea de antígenos proteicos (Fig. 19-6). A exposição subsequente ao mesmo antígeno (chamada de desafio) provoca a reação. Por exemplo, o derivado proteico purificado (PPD), um antígeno proteico do Mycobacterium tuberculosis, induz uma reação de DTH, a chamada reação de tuberculina, quando é injetado em indivíduos que tenham sido expostos ao M. tuberculosis. Uma resposta positiva do teste cutâneo de tuberculina é um indicador clínico amplamente utilizado para se evidenciar uma infeção prévia ou ativa de tuberculose.
FIGURA 19-6 Reação de hipersensibilidade do tipo tardio.
Ainfecção ou imunização (vacinação) sensibiliza um indivíduo, e o desafio subsequente com um antígeno do agente infeccioso elicita uma reação de DTH. Areação é manifestada pelo endurecimento com eritema e inchaço no local do desafio, com pico em aproximadamente 48 horas. (Cortesia de Dr. J. Faix, Department of Pathology, Stanford UniversitySchool of Medicine, Palo Alto, California.)
A resposta característica de DTH evolui durante 24 a 48 horas. Cerca de 4 horas depois da injeção do antígeno em um indivíduo sensibilizado, os neutrófilos acumulam-se em torno das vênulas pós-capilares no local da injeção. Aproximadamente após 12 horas, o local da injeção torna-se infiltrado por células T e monócitos sanguíneos, também organizados em uma distribuição perivenular (Fig. 19-7). As células endoteliais que revestem essas vênulas tornam-se intumescidas, exibem aumento da biossíntese de organelas e tornam-se permeáveis às macromoléculas plasmáticas. Há escape de fibrinogênio dos vasos sanguíneos para os tecidos circundantes, onde é convertido em fibrina. A deposição de fibrina, o edema e o acúmulo de células T e de monócitos no espaço extravascular do tecido em torno do local da injeção promovem o inchaço do tecido, que se torna firme (endurecido). O endurecimento, um recurso de diagnóstico de DTH, é detectável por cerca de 18 horas após a injeção do antígeno e torna-se máximo 24 a 48 horas após. Na prática clínica, a perda de resposta de DTH para antígenos universalmente encontrados (p. ex., antígenos de Candida) é uma indicação de deficiência da função das células T, uma condição conhecida como anergia. (Esta perda de capacidade de resposta imunológica geral é diferente da anergia de linfócitos, um mecanismo para a manutenção da tolerância a antígenos específicos, discutida no Cap. 15.)
FIGURA 19-7 Morfologia da reação de hipersensibilidade do tipo tardio.
A, Exame histopatológico da reação na pele ilustrada na Figura 19-6 mostra o infiltrado de células mononucleares perivasculares na derme. No maior aumento (não mostrado), o infiltrado observado consiste em linfócitos e macrófagos ativados ao redor dos vasos sanguíneos nos quais as células endoteliais também estão ativadas. B, Coloração imuno-histoquímica demonstra a presença de muitos linfócitos T CD4 + . (Cortesia de Dr. J. Faix, Department of Pathology, Stanford UniversitySchool of Medicine, Palo Alto, California).
Embora a DTH tenha sido tradicionalmente considerada uma reação prejudicial mediada por TH1, outras células T podem contribuir para a inflamação. Em algumas lesões de DTH, os neutrófilos são proeminentes, o que sugere o envolvimento de células TH17. Em infecções por alguns parasitas helmínticos, as reações contra os ovos do parasita provocam uma DTH com um forte componente de eosinófilos. Nesses casos, foi demonstrado um papel para as citocinas TH2. As células T CD8 + também produzem IFN- γ e contribuem para as reações de DTH, especialmente na pele.
As reações crônicas de DTH podem se desenvolver se uma resposta TH1 a uma infecção ativar os macrófagos, mas não conseguir eliminar os microrganismos fagocitados. Se os microrganismos estiverem localizados em uma área pequena, a reação produzirá nódulos de tecido inflamatório chamados de granulomas (Fig. 19-8, A). A DTH crônica, tal como exemplificado por uma inflamação granulomatosa, é causada por sinais prolongados de citocinas (Fig. 19-8, B). Nessas reações, as células T e os macrófagos ativados continuam a produzir citocinas e fatores de crescimento que amplificam as reações dos dois tipos celulares e modificam progressivamente o ambiente do tecido local. O resultado é um ciclo de lesão tecidual e inflamação crônica, seguido por substituição com tecido conjuntivo (fibrose). Em reações crônicas de DTH, os macrófagos ativados também sofrem alterações em resposta a sinais persistentes de citocinas. Esses macrófagos desenvolvem citoplasma e organelas citoplasmáticas aumentados e podem se assemelhar, histologicamente, às células epiteliais cutâneas, motivo pelo qual eles, às vezes, são chamados de células epitelioides. Os macrófagos ativados podem se fundir para formar células gigantes multinucleadas. A inflamação granulomatosa é uma tentativa de conter a infecção, mas também é a causa de lesão tecidual significativa e prejuízo funcional. Esse tipo de inflamação é uma resposta característica de alguns microrganismos persistentes, como M. tuberculosis e alguns fungos. Grande parte da dificuldade respiratória associada à tuberculose ou infecção fúngica crônica do pulmão é causada pela substituição do tecido pulmonar normal por tecido fibroso e não é diretamente atribuível aos microrganismos.
Fonte: Livro Imunologia Celular e Molecular - 8ª Ed.
Autores: Abul Lichtman, Andrew Abbas
A, Linfonodo de um paciente com tuberculose contendo granulomas com macrófagos ativados, células gigantes multinucleadas e linfócitos. Em alguns granulomas, pode existir uma área central de necrose. Estudos imuno-histoquímicos poderiam identicar os linfócitos como células T. B, Mecanismos de formação do granuloma. Citocinas estão envolvidas na geração de células TH1, ativação de macrófagos e recrutamento de leucócitos. As reações prolongadas desse tipo levam à formação de granulomas.
Doenças Causadas por Linfócitos T Citotóxicos
As respostas de CTLs à infecção viral podem levar à lesão tecidual em decorrência da morte das células infectadas, mesmo se o vírus por si só não tiver efeitos citopáticos. A principal função fisiológica dos CTLs é eliminar os microrganismos intracelulares, principalmente vírus, matando as células infectadas. Alguns vírus lesionam diretamente as células infectadas e são referidos como sendo citopáticos, ao passo que outros não o são. Como os CTLs podem não ser capazes de distinguir entre os vírus citopáticos e não citopáticos, matam células infectadas por vírus, não importando se a própria infecção é prejudicial para o hospedeiro. Exemplos de infecções virais, nas quais as lesões se devem à resposta de CTL do hospedeiro e não ao próprio vírus, incluem a coriomeningite linfocitária em camundongos e determinadas formas de hepatite viral em humanos (Cap. 16).Os CTLs podem contribuir para a lesão de tecidos em doenças autoimunes nas quais a destruição de determinadas células hospedeiras é um componente importante, como acontece no diabetes melito tipo 1, onde as células β produtoras de insulina nas ilhotas pancreáticas são destruídas.
Abordagens terapêuticas para as doenças imunológicas
Uma das realizações recentes mais impressionantes da Imunologia foi o desenvolvimento de novas terapias para doenças imunológicas com base no entendimento da ciência básica (Fig. 19-9). Os tratamentos podem ser divididos em vários grupos amplos.FIGURA 19-9 Novas terapias para doenças inflamatórias com alvo em respostas de células T.
Afigura ilustra locais de ação de alguns novos agentes desenvolvidos para o bloqueio de diferentes componentes das respostas imunes. Muitos desses agentes têm como alvo as citocinas e seus receptores. Adepleção de células B por anticorpos anti-CD20 também pode reduzir as respostas patológicas de células T (não mostrado).
Agentes Anti-Inflamatórios
A base do tratamento para as doenças de hipersensibilidade foi, durante muitos anos, o emprego de fármacos anti-inflamatórios, particularmente corticosteroides. Esses fármacos inibem a secreção de citocinas e de outros mediadores de inflamação e, assim, reduzem a inflamação associada às respostas imunes patológicas.Depleção de Células e de Anticorpos
Os anticorpos monoclonais que depletam todas as células linfoides, somente as células B ou somente as células T são utilizados para tratar doenças inflamatórias graves. No Capítulo 5, listamos alguns desses anticorpos usados na prática clínica (Tabela 5-3). Um desenvolvimento recente é a utilização bem-sucedida do anticorpo anti-CD20 (rituximab), que depleta apenas células B, para o tratamento de doenças que se pensava serem causadas principalmente pela inflamação mediada por células T. Este tratamento tem demonstrado eficácia em alguns pacientes com artrite reumatoide (AR), esclerose múltipla ou outros distúrbios autoimunes. A eficácia do anti-CD20 pode estar relacionada com um papel das células B nas respostas de células T, especialmente a geração e manutenção das células T de memória. A plasmaférese tem sido utilizada para eliminar os autoanticorpos e imunocomplexos circulantes.Terapias Anticitocinas
Um grande número de citocinas e seus receptores envolvidos na inflamação têm sido alvos de antagonistas específicos para o tratamento de doenças inflamatórias crônicas mediadas por célula T (Tabela 19-5). O primeiro sucesso com esta classe de agentes biológicos veio com uma forma solúvel do receptor de TNF e anticorpos anti-TNF, que se ligam e neutralizam esta citocina. Esses agentes proporcionam grande vantagem em muitos pacientes com AR, doença de Crohn e psoríase cutânea. Anticorpos contra o receptor da IL-6 foram utilizados com sucesso em ensaios para a AR juvenil e adulta. Antagonistas de outras citocinas pró-inflamatórias, tais como IL-1, a cadeia p40 que está presente em IL-12 e em IL-23, IL-6, IL-17 e outras, estão em uso ou em ensaios clínicos para doenças inflamatória.Tabela 19-5
Exemplos de Antagonistas de Citocinas em Uso Clínico ou em Ensaios Clínicos
Atabela lista exemplos de antagonistas contra citocinas (anticorpos ou receptores solúveis) que estão aprovados para uso ou ensaios clínicos.
IFN, interferon; IL, interleucina; TNF, fator de necrose tumoral (do inglês tumor necrosis factor).
Agentes que Inibem Interações Célula-Célula e Migração de Leucócitos
Os agentes que bloqueiam os coestimuladores B7 estão aprovados para o tratamento da AR e da rejeição ao enxerto. Os anticorpos contra as integrinas têm sido utilizados para inibir a migração de leucócitos para os tecidos, particularmente o sistema nervoso central (SNC) na esclerose múltipla; uma complicação rara, mas grave, do tratamento com este anticorpo será descrita posteriormente neste capítulo na discussão sobre esclerose múltipla. Os anticorpos contra o ligante de CD40 bloqueiam a ativação de células B e de macrófagos mediada por células T e foram benéficos em pacientes com esclerose múltipla e doença intestinal inflamatória, mas alguns dos pacientes tratados desenvolveram complicações trombóticas, aparentemente porque essa molécula é expressa em plaquetas humanas (onde sua função é desconhecida).IgG Intravenosa
Doses elevadas de IgG intravenosa (IVIG) apresentam efeitos benéficos em algumas hipersensibilidades. Não está claro como esse agente suprime a inflamação imune; uma possibilidade é que a IgG se ligue ao receptor inibidor de Fc (FcγRIIB) em macrófagos e linfócitos B e, assim, diminua a resposta inflamatória (Cap. 12). IVIG também pode competir com os anticorpos patogênicos para a ligação ao receptor Fc neonatal (FcRn), que funciona em adultos para proteger os anticorpos do catabolismo (Cap. 5), resultando na redução da meia-vida dos anticorpos patogênicos.Terapias Baseadas em Células T Reguladoras
Recentemente, tem havido grande interesse em explorar nosso conhecimento das células T reguladoras (Tregs) para tratar doenças inflamatórias. Diversos ensaios clínicos estão em andamento para purificar Tregs de pacientes, expandi-las e ativá-las em cultura e, então, transferi-las de volta para os pacientes. Outra abordagem é tratar os pacientes com doses baixas de IL-2 na expectativa de ativar e manter as Tregs mais do que as células efetoras.Há tentativas em andamento de tratamentos mais específicos, como a indução de tolerância em células T produtoras de doença. A esclerose múltipla e o diabetes melito tipo 1 são duas doenças imunes em que os antígenos-alvo foram definidos; em ambas as doenças, os estudos clínicos em curso apostam na administração de antígenos (peptídios de proteína básica de mielina e de insulina, respectivamente) a pacientes de forma a tolerizar linfócitos específicos para esses antígenos. Um risco de muitos tratamentos que bloqueiam vários componentes do sistema imune é a possível interferência com a função normal do sistema imunológico no combate a microrganismos e, portanto, tornar os indivíduos suscetíveis a infecções. A tolerância específica ao antígeno evita esse problema ao determinar seletivamente o alvo dos linfócitos que causam a doença. Esses princípios gerais assemelham-se àqueles nos quais se baseia o tratamento da rejeição ao transplante (Cap. 17).
Doenças imunológicas selecionadas: patogenia e estratégias terapêuticas
Na seção a seguir, descreveremos a patogenia de doenças selecionadas que são causadas por anticorpos e células T e a aplicação de novas terapias para essas doenças para ilustrar os princípios que discutimos anteriormente.Lúpus Eritematoso Sistêmico (LES): O Protótipo de Doença Mediada por Imunocomplexo
O LES é uma doença crônica, recidivante e remitente, autoimune multissistêmica, que afeta predominantemente o sexo feminino, com incidência nos Estados Unidos de 1 em 700 mulheres entre 20 e 60 anos de idade (cerca de 1 em 250 entre as mulheres negras) e uma relação de 10:1 entre mulheres e homens. As principais manifestações clínicas incluem erupções cutâneas, artrite e glomerulonefrite, mas anemia hemolítica, trombocitopenia e envolvimento do SNC também são comuns. Muitos autoanticorpos diferentes são encontrados em pacientes com LES. Os mais frequentes são os anticorpos antinucleares, particularmente anti-DNA; outros incluem anticorpos contra ribonucleoproteínas, histonas e antígenos de nucléolo. Os imunocomplexos formados a partir desses autoanticorpos e seus antígenos específicos são responsáveis por glomerulonefrite, artrite e vasculite envolvendo artérias pequenas por todo o corpo. A anemia hemolítica e a trombocitopenia ocorrem devido a autoanticorpos contra eritrócitos e plaquetas, respectivamente. O teste de diagnóstico principal para a doença é a presença de anticorpos antinucleares; os anticorpos contra o DNA nativo de fita dupla são específicos para o LES.Patogenia do Lúpus Eritematoso Sistêmico
O LES é uma doença complexa, na qual fatores genéticos e ambientais contribuem para a quebra de tolerância de linfócitos B e T autorreativos. Entre os fatores genéticos, a herança de determinados alelos HLA é um fator importante. A odds ratio (risco relativo) para indivíduos com HLA-DR2 ou HLA- DR3 é de 2 a 3 e, se ambos os haplótipos estiverem presentes, ela é de aproximadamente 5. As deficiências genéticas de proteínas da via clássica de ativação do complemento, especialmente C1q, C2 ou C4, são obsevadas em cerca de 5% dos pacientes com LES. As deficiências do complemento podem resultar na remoção defeituosa de imunocomplexos e de células apoptóticas e falha na tolerância de células B. Um polimorfismo no receptor de Fc inibidor, FcγRIIB, foi descrito em alguns pacientes; isso pode contribuir para o controle inadequado da ativação de células B ou para uma falha na atenuação das respostas inflamatórias em células do sistema imune inato. Muitos outros genes foram detectados por estudos de associação em todo o genoma e o papel de alguns destes, como o PTPN22, foi considerado no Capítulo 15. Também foram identificadas mutações em TREX1, conforme discutido a seguir. Os fatores ambientais incluem a exposição à luz ultravioleta (UV). Postula-se que isso conduza à morte apoptótica de células e liberação de antígenos nucleares.Duas observações levaram a novas hipóteses sobre a patogenia do LES. Em primeiro lugar, os estudos em pacientes revelaram que as células sanguíneas exibem uma assinatura molecular marcante (padrão de expressão de genes) que indica exposição ao IFN-α, um interferon de tipo I que é produzido principalmente por células dendríticas plasmocitoides. Alguns estudos mostraram que as células dendríticas plasmocitoides de pacientes com LES também produzem anormalmente grandes quantidades de IFN-α. Em segundo lugar, estudos em modelos animais demonstraram que os receptores do tipo Toll (TLRs) que reconhecem DNA e RNA, notadamente o TLR9, que reconhece DNA, e o TLR7, que reconhece RNA -TLR7, desempenham um papel na ativação de células B específicas para os autoantígenos nucleares. Com base nesses estudos, foi proposto um modelo para a patogenia de LES (Fig. 19-10). De acordo com este modelo, a radiação UV e outros insultos ambientais induzem apoptose de células. A remoção inadequada dos núcleos dessas células, em parte por causa de defeitos nos mecanismos de eliminação, como proteínas do complemento e nucleases como TREX1, resulta em grande liberação de antígenos nucleares. Polimorfismos em diversos genes de suscetibilidade para o lúpus levam à habilidade defeituosa para manter a autotolerância em linfócitos B e T, motivo pelo qual os linfócitos autorreativos permanecem funcionais. A falha na tolerância de células B pode ocorrer em virtude de defeitos na edição do receptor ou na deleção de células B imaturas na medula óssea ou na tolerância periférica. As células B autorreativas que não se tornam tolerantes são estimuladas por antígenos próprios nucleares e ocorre produção de anticorpos contra esses antígenos. Os complexos de antígenos e anticorpos ligam-se a receptores de Fc em células dendríticas e ao receptor de antígeno de células B e podem ser internalizados em endossomos. Os componentes de ácidos nucleicos ligamse a TLRs endossomais e estimulam as células B a produzirem autoanticorpos e as células dendríticas, particularmente as plasmocitoides, a produzirem IFN-α, que aumenta ainda mais a resposta imune e pode provocar mais apoptose. O resultado final é um ciclo de liberação de antígenos e ativação do sistema imune que leva à produção de autoanticorpos de alta afinidade.
FIGURA 19-10 Um modelo para a patogenia do lúpus eritematoso sistêmico (LES).
Nesse modelo hipotético, diversos genes de suscetibilidade interferem na manutenção da autotolerância e gatilhos externos levam à persistência dos antígenos nucleares. O resultado é uma resposta de anticorpos contra antígenos nucleares próprios, que é amplificada pela ativação dependente de TLR de células dendríticas e células B por ácidos nucleicos e pela produção de interferons do tipo I.
Novas Terapias para o Lúpus Eritematoso Sistêmico
Os recentes avanços em nossa compreensão de LES têm feito surgir novas abordagens terapêuticas. Há ensaios clínicos em andamento com objetivo de testar a eficácia de anticorpos anti-IFN-α na doença e de tentar inibir os sinais de TLR. Tem havido grande interesse na depleção de células B por meio da utilização de um anticorpo contra a proteína de superfície de células B, CD20. Um anticorpo que bloqueia o fator de crescimento de células B (BAFF) foi recentemente aprovado para o tratamento de LES. Os ensaios clínicos de depleção de célula B utilizando anticorpos anti-CD20 ou anti-BAFF têm apresentado sucesso limitado. Ainda que a ideia de depleção de células B não tenha sido abandonada, são necessárias novas abordagens terapêuticas.Artrite Reumatoide
A artrite reumatoide (AR) é uma doença inflamatória que envolve pequenas e grandes articulações das extremidades, incluindo dedos das mãos e pés, punhos, ombros, joelhos e tornozelos. A doença é caracterizada por inflamação da sinóvia associada à destruição da cartilagem articular e do osso, com uma imagem morfológica indicativa de uma resposta imune local. Ambas as respostas imunes, humoral e mediada por células, podem contribuir para o desenvolvimento de sinovite. Diversas células são encontrados na sinóvia inflamada, incluindo células TH1 CD4 + e TH17, linfócitos B ativados, plasmócitos e macrófagos, bem como outras células inflamatórias. Em casos graves, os folículos linfoides bem formados com centros germinativos (os chamados órgãos linfoides terciários) podem estar presentes. Inúmeras citocinas, incluindo IL-1, IL-8, TNF, IL-6, IL-17 e IFN-γ, foram detectadas no líquido sinovial (articular). Acredita-se que as citocinas recrutem leucócitos, cujos produtos causam lesão dos tecidos, além de também estimular células sinoviais residentes a produzirem enzimas proteolíticas, tais como a colagenase, que medeiam a destruição das cartilagens, ligamentos e tendões das articulações. A atividade aumentada dos osteoclastos nas articulações contribui para a destruição óssea na AR, o que pode ser causado pela produção do ligante de uma citocina da família do TNF, RANK (receptor ativador do fator nuclear κB), por células T ativadas. O ligante de RANK liga-se a RANK, um membro da família do receptor de TNF, que é expresso em precursores de osteoclastos e induz a diferenciação e ativação dessas células. Complicações sistêmicas da AR incluem vasculite, presumivelmente causada por imunocomplexos, e lesão pulmonar.Embora grande parte da ênfase em estudos de AR tenha sido sobre o papel das células T, os anticorpos também podem contribuir para a destruição da articulação. As células B ativadas e os plasmócitos estão frequentemente presentes na sinóvia das articulações afetadas. Os pacientes frequentemente apresentam anticorpos circulantes IgM ou IgG que reagem com as porções Fc (e raramente Fab) de suas próprias moléculas de IgG. Esses autoanticorpos são denominados fatores reumatoides, e sua presença é utilizada como um teste de diagnóstico para a AR. Os fatores reumatoides podem participar na formação de imunocomplexos prejudiciais, mas seu papel patogênico ainda não foi estabelecido. Outro tipo de anticorpo que foi detectado em pelo menos 70% dos pacientes é específico para peptídios citrulinados cíclicos (CCP, do inglês cyclic citrullinated peptides), que são derivados de determinadas proteínas que são modificadas em um ambiente inflamatório pela conversão enzimática de resíduos de arginina em citrulina. Esses anticorpos anti-CCP constituem um marcador diagnóstico para a doença e podem estar envolvidos na lesão tecidual.
Patogenia da Artrite Reumatoide
Como outras doenças autoimunes, a AR é uma doença complexa, na qual fatores genéticos e ambientais contribuem para a quebra de tolerância a antígenos próprios. A especificidade das células B e T patogênicas permanece desconhecida, embora já se tenha estabelecido a existência de ambas as células B e T capazes de reconhecer peptídios citrulinados. A suscetibilidade à AR está ligada ao haplótipo HLA-DR4. Estudos recentes de correlação e de associação do genoma total revelaram um grande número de genes nos quais existem polimorfismos associados à AR. Existe uma associação com o gene que codifica uma fosfatase de tirosina, o PTPN22, discutido no Capítulo 15.A identificação de respostas imunes anti-CCP levou a novas ideias sobre a patogenia da AR (Fig. 19-11). De acordo com um modelo, agressões ambientais, como tabagismo e algumas infecções, induzem a citrulinação de proteínas próprias, levando à criação de novos epítopos antigênicos. Em indivíduos geneticamente suscetíveis, a tolerância a esses epítopos pode falhar, resultando em respostas de anticorpos e de células T contra as proteínas. Se essas proteínas próprias modificadas também estiverem presentes nas articulações, as células T e os anticorpos atacarão as articulações. Células TH17, e talvez TH1, secretam citocinas que recrutam leucócitos para a articulação e ativam células sinoviais para produzir colagenases e outras enzimas. O resultado final é a destruição progressiva da cartilagem e do osso. As respostas imunes crônicas nas articulações podem levar à formação de tecidos linfoides terciários na sinóvia, e esses tecidos linfoides terciários podem manter e propagar a reação inflamatória local.
FIGURA 19-11 Um modelo para a patogenia da artrite reumatoides.
De acordo com esse modelo, as proteínas citrulinadas induzidas por estímulos ambientais produzem respostas de células T e de anticorpos em indivíduos geneticamente suscetíveis. As células T e os anticorpos adentram articulações, respondem a proteínas próprias e causam lesão tecidual principalmente por secreção de citocinas e, talvez, também por mecanismos efetores dependentes de anticorpos. Outras modificações de proteínas além da citrulinação podem levar ao mesmo resultado.
Novas Terapias para a Artrite Reumatoide
A percepção do papel central das células T e das citocinas na doença tem levado a avanços notáveis em termos de tratamento, com a definição de moléculas específicas como alvo, com base no conhecimento científico. A principal entre essas novas terapias são os antagonistas de TNF, que transformaram o curso da doença, em muitos pacientes, de uma destruição progressiva e inexorável das articulações para uma inflamação crônica latente, porém tratável. Uma variedade de outras terapias com alvos definidos foi desenvolvida nos últimos 5 a 10 anos; elas forneceram uma visão sobre a patogenia da doença. O bloqueio de outras citocinas além do TNF vem mostrando-se eficaz, incluindo um anticorpo que bloqueia o receptor de IL-6, um antagonista de IL-1 e uma pequena molécula que inibe a sinalização de JAK (um importante mediador de sinalização intracelular de uma variedade de receptores de citocinas). A inibição da ativação de células T tem sido realizada por meio do bloqueio da coestimulação de B7:CD28 com CTLA-4-Ig, uma proteína de fusão composta do domínio extracelular de CTLA-4 e da porção Fc da IgG que se liga a B7 (Cap. 9). A depleção de células B com anticorpo antiCD20 também se provou eficaz, embora os mecanismos subjacentes a esse efeito não estejam bem compreendidos.Esclerose Múltipla
A esclerose múltipla (EM) é uma doença autoimune do SNC, na qual as células T CD4 + das subpopulações TH1 e TH17 reagem contra os antígenos próprios de mielina, resultando em inflamação no SNC com ativação de macrófagos ao redor dos nervos do cérebro e da medula espinhal, destruição da mielina, anormalidades na condução nervosa e déficits neurológicos. É a doença neurológica mais comum de adultos jovens. No exame patológico, há inflamação na substância branca do SNC com desmielinização secundária. A EM é caracterizada clinicamente por fraqueza, paralisia e sintomas oculares com exacerbações e remissões; Os exames de imagem do SNC sugerem que, em pacientes com doença ativa, não há formação frequente de nova lesão.A EM possui um modelo experimental que é a encefalomielite autoimune experimental (EAE) em camundongos, ratos, cobaias e primatas não humanos, e este é um dos modelos experimentais mais bem caracterizados de uma doença autoimune específica de um órgão mediada principalmente por linfócitos T. A EAE é induzida pela imunização de animais com os antígenos normalmente presentes na mielina do SNC, tais como proteína básica de mielina, proteína proteolipídica e glicoproteína oligodendrocitária de mielina, com um adjuvante contendo micobactérias mortas pelo calor, o que é necessário para disparar uma resposta forte de células T. Cerca de 1 a 2 semanas após a imunização, os animais desenvolvem encefalomielite, caracterizada por infiltrados perivasculares compostos de linfócitos e macrófagos na substância branca do SNC, seguidos por desmielinização. As lesões neurológicas podem ser leves e autolimitadas ou crônicas e reincidentes. Essas lesões resultam em paralisia progressiva ou com remissão e recidiva. A doença também pode ser transferida para animais não imunizados pela transferência de células T dos animais doentes. Embora os anticorpos contra os antígenos de mielina sejam detectados em pacientes, bem como em modelos animais, o significado patogênico desses anticorpos não foi estabelecido.
Patogenia da Esclerose Múltipla
Há várias evidências de que, em camundongos, a EAE é causada por células TH1 CD4+ e TH17 ativadas específicas para antígenos de proteínas em mielina. Por analogia com a doença experimental, acredita-se que a EM também seja causada por células TH1 e TH17 específicas da mielina; essas células foram detectadas em pacientes e isoladas a partir do sangue e do SNC. O mecanismo pelo qual essas células são ativadas em pacientes continua a ser um enigma. Foi sugerido que uma infecção, mais provavelmente uma infecção viral, possa ativar as células T reativas à mielina própria pelo fenômeno de mimetismo molecular (Cap. 15). A autotolerância pode falhar por causa da herança de genes de suscetibilidade. Gêmeos idênticos possuem uma taxa de concordância de 25% a 30% para o desenvolvimento de EM, ao passo que gêmeos não idênticos têm uma taxa de concordância de 6%. Essas observações implicam fatores genéticos no desenvolvimento da doença, mas também indicam que a genética só pode contribuir com parte do risco. Os polimorfismos genéticos associados à EM incluem o lócus HLA, com os alelos HLADRB1*1501 sendo a ligação mais forte. Estudos de associação de genoma completo e outras análises genômicas revelaram mais de 100 variantes genéticas que contribuem para o risco de doença; a maioria dessas variações localiza-se em genes envolvidos na função imune. Uma associação interessante ocorre com um polimorfismo na região não codificante do gene para a cadeia α do receptor de IL-2, CD25. Esse polimorfismo pode alterar a geração e a manutenção de células T efetoras e/ou reguladoras. Outros estudos sugeriram que a manutenção periférica de células T reguladoras é defeituosa em pacientes com EM, mas não se sabe quanto isso contribui para uma falha da autotolerância. Uma vez que as células específicas de mielina T são ativadas, elas migram para o SNC, onde encontram as proteínas da mielina e liberam citocinas, que recrutam e ativam macrófagos e mais células T, levando à destruição da mielina. Estudos de EAE sugerem que a doença é propagada por meio de um processo conhecido como espalhamento de epítopos (Cap. 15). A ruptura do tecido resulta na liberação de novos antígenos proteicos e expressão de novos epítopos, previamente sequestrados, que ativam mais células T autorreativas.Novas Terapias em Esclerose Múltipla
No passado, a imunoterapia para EM contou com abordagens cuja base científica não era bem compreendida. Essas incluem a administração de interferon-β, que pode alterar as respostas de citocinas, e o tratamento com um polímero aleatório de quatro aminoácidos, o qual se postula que seja capaz de se ligar a moléculas de HLA e bloquear a apresentação de antígenos. Recentemente, no entanto, diversas novas terapias com modificadores imunológicos foram desenvolvidas. Uma delas é um anticorpo contra a integrina VLA-4 (Cap. 3), que bloqueia a migração de leucócitos para o SNC e se mostrou benéfíca em pacientes. No entanto, em um pequeno número de pacientes, este tratamento resultou na reativação de uma infecção latente de vírus JC que provoca uma doença grave e, por vezes, fatal no SNC. Outro fármaco recentemente aprovado para tratar a EM também interfere na migração de leucócitos. O fármaco, chamada fingolimod (FTY720), bloqueia a via mediada pela esfingosina 1-fosfato da célula T egressa de tecidos linfoides (Cap. 3). Em um grande subgrupo de pacientes, a depleção de células B com anticorpo anti-CD20 é benéfica. Esses resultados sugerem um papel importante das células B, presumivelmente como APCs, na ativação de células T patogênicas. Como a proteína básica de mielina (MBP) é conhecida por ser um importante autoantígeno que é o alvo da resposta imune em EM, tem havido uma grande esperança de que a administração de peptídios de MBP poderá induzir tolerância antígeno-específica ou gerar células T reguladoras específicas para o antígeno relevante. É também surpreendente que a maior parte das terapias seja eficaz na EM inicial, que é caracterizada pela inflamação; mas não na EM progressiva, que é caracterizada pela neurodegeneração e consiste na maior causa da invalidez permanente. Essa percepção está promovendo novas tentativas de se restaurar a mielinização e reparar os axônios e neurônios danificados.Diabetes Melito Tipo 1
O diabetes melito tipo 1, anteriormente chamado diabetes melito insulino-dependente, é uma doença metabólica multissistêmica resultante da produção prejudicada de insulina que afeta aproximadamente 0,2% da população dos Estados Unidos, com um pico no início da faixa etária de 11 a 12 anos de idade. A incidência da doença parece estar aumentando na América do Norte e na Europa. A doença é caracterizada por hiperglicemia e cetoacidose. As complicações crônicas do diabetes tipo 1 incluem aterosclerose progressiva das artérias, o que pode levar à necrose isquêmica dos membros e órgãos internos, e obstrução microvascular causando danos na retina, nos glomérulos renais e nos nervos periféricos. Esses pacientes apresentam uma deficiência de insulina resultante da destruição imunomediada das células β produtoras de insulina das ilhotas de Langerhans no pâncreas e é necessário proceder a uma terapia de reposição hormonal contínua. Geralmente, existe um longo período de muitos anos entre o início da autoimunidade e o aparecimento da doença clínica, porque 90% ou mais das ilhotas precisam ser destruídas antes da observação das manifestações clínicas.Patogenia do Diabetes Tipo 1
Vários mecanismos podem contribuir para destruição das células β, incluindo inflamação mediada por células TH1 CD4 + reativas com antígenos das ilhotas (incluindo insulina), lise de células das ilhotas mediada por CTL, produção local de citocinas (TNF e IL-1) que danificam células das ilhotas e autoanticorpos contra as células das ilhotas. Nos poucos casos em que as lesões pancreáticas foram examinadas nas fases ativas precoces da doença, as ilhotas exibem necrose celular e infiltração linfocitária consistindo em células T CD4 + e CD8 + . Essa lesão é denominada insulite. Os autoanticorpos contra as células das ilhotas e a insulina também são detectados no sangue desses pacientes. Em crianças suscetíveis que não desenvolveram diabetes (tais como parentes de pacientes), a presença de anticorpos contra as células das ilhotas é preditiva do desenvolvimento de diabetes tipo 1. Um modelo animal informativo da doença é o camundongo diabético não obeso (NOD), que desenvolve diabetes espontâneo. Neste modelo, existe evidência de sobrevivência e função defeituosas das células T reguladoras, bem como resistência de células T efetoras para supressão.Múltiplos genes estão associados ao diabetes tipo 1. Tem- se dedicado grande parte da atenção ao papel dos genes HLA. Entre 90% e 95% dos caucasianos com diabetes tipo 1 apresentam HLA-DR3, DR4 ou ambos, em contraste com aproximadamente 40% dos indivíduos normais; e 40% a 50% dos pacientes são heterozigotos DR3/DR4, em contraste com 5% dos indivíduos normais. Diversos genes não HLA também contribuem para a doença. O primeiro desses a ser identificado é o da insulina, com associação de repetições em tandem da região do promotor com a suscetibilidade à doença. O mecanismo desta associação é desconhecido e pode estar relacionado com o nível de expressão de insulina no timo, que determina se as células T insulino-específicas serão deletadas (selecionadas negativamente) durante a maturação. Vários outros polimorfismos foram identificados em pacientes e em camundongos NOD, incluindo os genes de IL2 e CD25. As consequências funcionais desses polimorfismos não são conhecidas. Alguns estudos sugerem que as infecções virais (p. ex., com vírus Coxsackie B4) pode preceder o aparecimento de diabetes tipo 1, talvez por iniciarem a lesão celular, induzindo a inflamação e a expressão do coestimuladores e desencadeando uma resposta autoimune. No entanto, dados epidemiológicos sugerem que as infecções repetidas protegem contra diabetes tipo 1 e isso ocorre de maneira semelhante no modelo NOD. De fato, foi postulado que uma das razões para o aumento da incidência de diabetes tipo 1 em países desenvolvidos é o controle de doenças infecciosas.
Novas Terapias para Diabetes Tipo 1
As novas estratégias terapêuticas mais interessantes para diabetes tipo 1 concentram-se na indução de tolerância com peptídios diabetogênicos de antígenos das ilhotas (como a insulina) ou gerando ou administrando células T reguladoras para os pacientes. Esses ensaios clínicos estão em estágio inicial.Doença Inflamatória Intestinal
A doença intestinal inflamatória é constituída por dois distúrbios, a doença de Crohn e a colite ulcerosa, nas quais a inflamação mediada por células T provoca lesão intestinal. A doença de Crohn é caracterizada pela inflamação crônica e destruição da parede intestinal, com formação frequente de fístulas. Na colite ulcerosa, as lesões são essencialmente limitadas à mucosa e consistem em úlceras com focos subjacentes de inflamação. A patogenia da doença intestinal inflamatória foi descrita no Capítulo 14. As novas terapias para essas doenças incluem anticorpos contra TNF e a cadeia p40 de IL-12 e IL-23.Resumo
Distúrbios causados por respostas imunes anormais são chamados de hipersensibilidade. As respostas imunes patológicas podem ser respostas autoimunes contra antígenos próprios ou respostas descontroladas e excessivas a antígenos estranhos (p. ex., microbianos).As hipersensibilidades podem resultar de anticorpos que se ligam a células ou tecidos (tipo II), imunocomplexos circulantes que são depositados nos tecidos (tipo III) ou de linfócitos T reativos com antígenos em tecidos (tipo IV). As reações de hipersensibilidade imediata (tipo I) são a causa das doenças alérgicas e estão descritas no Capítulo 20.
Os mecanismos efetores da lesão tecidual mediada por anticorpos são a ativação do complemento e a inflamação mediada pelo receptor de Fc. Alguns anticorpos causam doença por interferir nas funções celulares normais, sem produzir lesão tecidual.
Os mecanismos efetores da lesão tecidual mediada por células T são as reações inflamatórias induzidas por citocinas secretadas principalmente por células TH1 CD4 + e TH17 e pela lise celular por CTLs. A reação clássica mediada pela célula T é a hipersensibilidade tardia, induzida pela ativação de células T previamente ativadas e pela produção de citocinas, que recrutam e ativam vários leucócitos, principalmente os macrófagos.
O tratamento atual das doenças autoimunes tem como objetivo reduzir a ativação imune e as consequências prejudiciais da reação autoimune. Os agentes incluem aqueles que bloqueiam a inflamação, tais como anticorpos contra citocinas e integrinas, e aqueles que bloqueiam a ativação de linfócitos ou os destroem. Um futuro objetivo da terapia é inibir as respostas de linfócitos específicos para antígenos próprios e induzir a tolerância dessas células.
As doenças autoimunes, tais como lúpus eritematoso sistêmico, artrite reumatoide, esclerose múltipla e diabetes tipo 1, ilustram muitos dos mecanismos efetores que provocam lesão dos tecidos em reações de hipersensibilidade e os papéis dos genes de suscetibilidade e fatores ambientais no desenvolvimento da autoimunidade.
















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