domingo, 6 de maio de 2018

ARTICULAÇÕES DO MEMBRO INFERIOR

As articulações do membro inferior incluem as articulações do cíngulo do membro inferior – articulações lombossacrais, articulações sacroilíacas e sínfise púbica, que são apresentadas no Capítulo 3. As outras articulações do membro inferior são a articulação do quadril, articulações do joelho, articulações tibiofibulares, articulação talocrural e articulações do pé (Figura 5.77). Articulação do quadril A articulação do quadril é a conexão entre o membro inferior e o cíngulo do membro inferior (Figura 5.77A). É uma articulação sinovial esferóidea multiaxial forte e estável. A cabeça do fêmur é a esfera e o acetábulo é a cavidade (Figura 5.78). A articulação do quadril destina-se a garantir estabilidade em uma grande amplitude de movimentos. Depois da articulação do ombro, é a mais móvel de todas as articulações. Na posição de pé, todo o peso da parte superior do corpo é transmitido através dos ossos do quadril para as cabeças e os colos dos fêmures. FACES ARTICULARES DA ARTICULAÇÃO DO QUADRIL A cabeça redonda do fêmur articula-se com o acetábulo caliciforme do osso do quadril (Figuras 5.77 a 5.80). A cabeça do fêmur forma cerca de dois terços de uma esfera. Exceto pela fóvea da cabeça do fêmur, toda a cabeça é coberta por cartilagem articular, que é mais espessa nas áreas de sustentação de peso. O acetábulo, uma cavidade hemisférica na face lateral do osso do quadril, é formado pela fusão de três partes ósseas (ver Figura 5.5). O limbo do acetábulo, proeminente e forte, tem uma parte articular semilunar coberta por cartilagem articular, a face semilunar do acetábulo (Figuras 5.78 a 5.80). O limbo do acetábulo e a face semilunar formam aproximadamente três quartos de um círculo; o segmento inferior ausente do círculo é a incisura do acetábulo. Figura 5.77 Articulações do membro inferior. As articulações do membro inferior são (A) aquelas do cíngulo do membro inferior que unem o membro inferior livre à coluna vertebral, (B) as articulações do joelho e tibiofibular, e (C) a sindesmose tibiofibular, a articulação talocrural e as muitas articulações do pé. *N.R.T.: A terminologia anatômica não menciona a articulação femoropatelar. Figura 5.78 Articulação do quadril. O quadril foi desarticulado seccionando-se o ligamento da cabeça do fêmur e afastando a cabeça do acetábulo. O ligamento transverso do acetábulo é rebatido superiormente para mostrar o canal obturatório, que dá passagem ao nervo e aos vasos obturatórios da cavidade pélvica para a região medial da coxa. Figura 5.79 Fatores que aumentam a estabilidade da articulação do quadril. A. Esta vista superior da articulação do quadril mostra a tração medial e recíproca dos músculos periarticulares (rotadores medial e lateral; setas marrom-avermelhadas) e ligamentos intrínsecos da articulação do quadril (setas cinza) sobre o fêmur. As resistências relativas são indicadas pela largura da seta: Anteriormente, os músculos são menos abundantes, mas os ligamentos são robustos; posteriormente, predominam os músculos. B. Fibras paralelas que unem dois discos assemelham-se àquelas que formam a camada fibrosa tubular da cápsula articular do quadril. Quando um disco (o fêmur) gira em relação ao outro (o acetábulo), as fibras tornam-se cada vez mais oblíquas e aproximam os discos. Do mesmo modo, a extensão da articulação do quadril espirala as fibras da camada fibrosa (aumenta sua obliquidade), tracionando firmemente a cabeça e o colo do fêmur para o acetábulo, o que aumenta a estabilidade da articulação. A flexão retifica as fibras da cápsula. C. Neste corte frontal da articulação do quadril, o lábio do acetábulo e o ligamento transverso do acetábulo, transpondo a incisura do acetábulo (e incluídos no plano de corte aqui), estendem o limbo do acetábulo e formam uma cavidade completa. Assim, o complexo do acetábulo envolve a cabeça do fêmur. A epífise da cabeça do fêmur está totalmente dentro da cápsula articular. O osso espesso do ílio, que sustenta o peso, normalmente situa-se diretamente superior à cabeça do fêmur para transferência eficiente de peso para o fêmur (Figura 5.3). O ângulo de Wiberg (ver texto) é usado para determinar, em radiografias, o grau de superposição do acetábulo à cabeça do fêmur. D. Diversas linhas e curvaturas são usadas para detectar anormalidades do quadril (luxações, fraturas ou deslizamento das epífises). Normalmente, a linha de Kohler (A vermelho) é tangencial à abertura superior da pelve e ao forame obturado. A posição da fossa do acetábulo deve ser lateral a essa linha. Uma fossa que cruza a linha sugere fratura do acetábulo com deslocamento interno. A linha de Shenton (B vermelho) e a linha iliofemoral (C vermelho) devem aparecer em uma radiografia AP normal como linhas uniformes e contínuas que têm simetria bilateral. A linha de Shenton é uma indicação radiográfica do ângulo de inclinação (EIAS = espinha ilíaca anterossuperior). Figura 5.80 Anatomia seccional e radiográfica da região glútea e da região proximal anterior da coxa no nível da articulação do quadril. A e B. Desenho descritivo e imagem transversal (RM axial) de um corte anatômico da coxa. Os números entre parênteses em (A) referem-se às estruturas identificadas em (B). C. O desenho de orientação mostra o nível do corte. O lábio do acetábulo é uma orla fibrocartilaginosa fixada ao limbo do acetábulo que aumenta em quase 10% a área articular do acetábulo. O ligamento transverso do acetábulo, uma continuação do lábio, transpõe a incisura do acetábulo (Figuras 5.78 e 5.79C). Em razão da altura do limbo e do lábio, mais da metade da cabeça do fêmur encaixa-se no acetábulo (Figuras 5.79C e 5.80). Assim, durante a dissecção, a cabeça do fêmur tem de ser separada do limbo do acetábulo para permitir a desarticulação. No centro, uma parte não articular profunda, denominada fossa do acetábulo, é formada principalmente pelo ísquio (Figuras 5.78, 5.79C e 5.80). Essa fossa tem paredes finas (frequentemente translúcida) e é contínua na parte inferior com a incisura do acetábulo. As faces articulares do acetábulo e da cabeça do fêmur coincidem melhor quando o quadril está fletido a 90°, abduzido a • • • 5° e rodado lateralmente 10° (a posição na qual o eixo do acetábulo e o eixo da cabeça e colo do fêmur estão alinhados), que é a posição quadrúpede! Em outras palavras, ao assumir a posição ortostática, sacrificou-se um grau relativamente pequeno de estabilidade articular para maximizar a sustentação de peso. Mesmo assim, a articulação do quadril é nossa articulação mais estável, graças também à sua arquitetura esferóidea completa (profundidade da cavidade); à resistência de sua cápsula; e às fixações de músculos que atravessam a articulação, muitos dos quais estão localizados a alguma distância do centro do movimento (Palastanga et al., 2011). CÁPSULA DA ARTICULAÇÃO DO QUADRIL As articulações do quadril são revestidas por cápsulas articulares fortes, formadas por uma camada fibrosa externa (cápsula fibrosa) frouxa e uma membrana sinovial interna (Figura 5.79C). Na parte proximal, a camada fibrosa fixa-se ao acetábulo, na região imediatamente periférica ao limbo do acetábulo, no qual se fixa o lábio, e ao ligamento transverso do acetábulo (Figuras 5.79C e 5.81A, C e D). Na região distal, a camada fibrosa fixa-se no colo do fêmur apenas anteriormente na linha intertrocantérica e na raiz do trocanter maior (Figura 5.81B). Na parte posterior, a camada fibrosa cruza o colo proximal à crista intertrocantérica, mas não está fixada nela. A maioria das fibras da camada fibrosa da cápsula segue um trajeto espiral do osso do quadril até a linha intertrocantérica, mas algumas fibras profundas seguem circularmente ao redor do colo, formando a zona orbicular (Figuras 5.79C e 5.81D). Partes espessas da camada fibrosa formam os ligamentos da articulação do quadril, que seguem em trajeto espiral da pelve até o fêmur (Figura 5.81A, C e D). A extensão espirala ainda mais os ligamentos e fibras espirais, constringindo a cápsula e aproximando a cabeça do fêmur do acetábulo (Figura 5.79B). A camada fibrosa ajustada aumenta a estabilidade da articulação, mas restringe a extensão da articulação a 10 a 20° em relação à posição vertical. A flexão retifica cada vez mais os ligamentos e fibras espiralados. Isso permite considerável flexão da articulação do quadril com mobilidade crescente. Dos três ligamentos intrínsecos da cápsula articular abaixo, é o primeiro que reforça e fortalece a articulação: Anterior e superiormente, há o forte ligamento iliofemoral em forma de Y, que se fixa à espinha ilíaca anteroinferior e ao limbo do acetábulo na parte proximal e à linha intertrocantérica na parte distal (Figura 5.81A e C). Considerado o mais forte do corpo, o ligamento iliofemoral impede especificamente a hiperextensão da articulação do quadril durante a postura ereta, atarraxando a cabeça do fêmur no acetábulo pelo mecanismo descrito anteriormente Anterior e inferiormente, há o ligamento pubofemoral, que se origina da crista obturatória do púbis, segue em sentido lateral e inferior e se une à camada fibrosa da cápsula articular (Figura 5.81A). Esse ligamento une-se à parte medial do ligamento iliofemoral e é tensionado durante a extensão e a abdução da articulação do quadril. O ligamento pubofemoral impede a abdução excessiva da articulação do quadril Posteriormente, há o ligamento isquiofemoral, que se origina da parte isquiática do limbo do acetábulo (Figura 5.81D). O mais fraco dos três ligamentos, espirala-se em sentido superolateral até o colo do fêmur, medial à base do trocanter maior. A Figura 5.79A apresenta o tamanho relativo, a resistência e as posições dos três ligamentos da articulação do quadril. Os ligamentos e músculos periarticulares (os rotadores medial e lateral da coxa) têm um papel fundamental na manutenção da integridade estrutural da articulação. Os músculos e ligamentos puxam a cabeça do fêmur medialmente em direção ao acetábulo e, desse modo, alcançam um equilíbrio mútuo. Os flexores mediais, em posição anterior, existem em menor número, são mais fracos e têm menor vantagem mecânica, enquanto os ligamentos anteriores são mais fortes. Em contraposição, os ligamentos são mais fracos posteriormente, onde os rotadores mediais são abundantes, mais fortes e têm maior vantagem mecânica. Em todas as articulações sinoviais, a membrana sinovial reveste as faces internas da camada fibrosa e também todas as superfícies ósseas intracapsulares não revestidas por cartilagem articular. Assim, na articulação do quadril, onde a camada fibrosa se fixa ao fêmur distante da cartilagem articular que cobre a cabeça do fêmur, a membrana sinovial da articulação do quadril é refletida proximalmente ao longo do colo do fêmur até a margem da cabeça do fêmur. Existem pregas sinoviais (retináculos) longitudinais na membrana que cobre o colo do fêmur (Figura 5.79C). As artérias retinaculares subsinoviais (ramos da artéria circunflexa femoral medial, e algumas da artéria circunflexa femoral lateral) que irrigam a cabeça e o colo do fêmur seguem dentro das pregas sinoviais (Figura 5.82). O ligamento da cabeça do fêmur (Figuras 5.78, 5.79C, 5.80 e 5.82), basicamente uma prega sinovial que conduz um vaso sanguíneo, é fraco e tem pouca importância no fortalecimento da articulação do quadril. A extremidade larga fixa-se nas margens da incisura do acetábulo e no ligamento transverso do acetábulo; a extremidade estreita fixa-se na fóvea da cabeça do fêmur. Em geral, o ligamento contém uma pequena artéria para a cabeça do fêmur. Um corpo adiposo preenche a parte da fossa do acetábulo não ocupada pelo ligamento da cabeça do fêmur (Figura 5.78). Tanto o ligamento quanto o corpo adiposo são cobertos por membrana sinovial. A natureza maleável do corpo adiposo permite que mude de formato para acomodar as variações na congruência da cabeça do fêmur e do acetábulo, bem como alterações na posição do ligamento da cabeça durante os movimentos articulares. A protrusão sinovial além da margem livre da cápsula articular até a face posterior do colo do fêmur forma uma bolsa para o tendão do músculo obturador externo (Figura 5.81D). MOVIMENTOS DA ARTICULAÇÃO DO QUADRIL Os movimentos do quadril são flexão–extensão, abdução–adução, rotação medial–lateral e circundução (Figura 5.83). Os movimentos do tronco nas articulações do quadril também são importantes, como aqueles que ocorrem quando a pessoa levanta o tronco partindo da posição de decúbito dorsal durante exercícios abdominais ou quando mantém a pelve nivelada tendo um pé fora do solo. Figura 5.81 Ligamentos da pelve e articulação do quadril. A. A transferência de peso da coluna vertebral para o cíngulo do membro inferior é uma função dos ligamentos sacroilíacos. A transferência de peso na articulação do quadril é garantida principalmente pela disposição dos ossos, enquanto os ligamentos limitam a amplitude de movimento e aumentam a estabilidade. B. Faces articulares do quadril e locais de fixação e relações tendíneas dos ligamentos iliofemorais e cápsula articular. C. Ligamento iliofemoral. D. Ligamento isquiofemoral. Como a cápsula articular não se fixa à face posterior do fêmur, a membrana sinovial salienta-se em relação à cápsula articular, formando a bolsa do músculo obturador externo para facilitar o movimento do tendão desse músculo (mostrado na parte C) sobre o osso. 1. 2. 3. 4. 5. • • Figura 5.82 Vascularização da cabeça e do colo do fêmur. Ramos das artérias circunflexas femorais medial e lateral, ramos da artéria femoral profunda e o ramo acetabular da artéria obturatória suprem a cabeça e o colo do fêmur. No adulto, a artéria circunflexa femoral medial é a fonte mais importante de sangue para a cabeça do fêmur e colo adjacente (proximal). O grau de flexão e extensão possível na articulação do quadril depende da posição do joelho. Se o joelho estiver fletido, relaxando os músculos isquiotibiais, a articulação do quadril pode ser ativamente fletida até a coxa quase alcançar a parede abdominal anterior, e pode chegar até ela por meio de flexão passiva adicional. Nem todo esse movimento ocorre na articulação do quadril; parte dele resulta da flexão da coluna vertebral. Durante a extensão da articulação do quadril, a camada fibrosa da cápsula articular, sobretudo o ligamento iliofemoral, está tensa; portanto, o quadril geralmente só pode ser estendido um pouco além do eixo vertical, exceto pelo movimento da pelve óssea (flexão das vértebras lombares). A partir da posição anatômica, a amplitude de abdução da articulação do quadril geralmente é um pouco maior do que a de adução. É possível obter 60° de abdução quando a coxa está estendida na articulação do quadril, e mais ainda quando está fletida. A rotação lateral é muito mais forte do que a rotação medial. Os principais músculos que movimentam a articulação do quadril são apresentados na Figura 5.83B. Observe que: O músculo iliopsoas é o mais forte flexor do quadril Além de sua função como adutor, o músculo adutor magno também atua como flexor (parte anterior ou aponeurótica) e extensor (parte posterior ou do jarrete) Vários músculos participam da flexão e adução (pectíneo e grácil, bem como os três músculos “adutores”) Além de abdução, as partes anteriores dos músculos glúteos médio e mínimo também fazem rotação medial O músculo glúteo máximo atua como extensor primário da posição fletida para a posição ereta (de pé), e a partir desse ponto em sentido posterior, a extensão é feita principalmente pelos músculos do jarrete. O músculo glúteo máximo também é um rotador lateral. VASCULARIZAÇÃO DA ARTICULAÇÃO DO QUADRIL As artérias que suprem a articulação do quadril (Figura 5.82) são: As artérias circunflexas femorais mediais e laterais, que geralmente são ramos da artéria femoral profunda, mas às vezes são ramos da artéria femoral O ramo acetabular da artéria obturatória de tamanho variável; atravessa o ligamento da cabeça do fêmur. A principal vascularização da articulação do quadril provém das artérias retinaculares que são ramos das artérias femorais circunflexas. As artérias retinaculares originadas da artéria femoral circunflexa medial são mais abundantes, levando mais sangue para a cabeça e o colo do fêmur porque podem passar sob a margem posterior não fixada da cápsula articular. As artérias retinaculares originadas da artéria circunflexa femoral lateral precisam atravessar o espesso ligamento iliofemoral e são menores em tamanho e número. INERVAÇÃO DA ARTICULAÇÃO DO QUADRIL A lei de Hilton afirma que os nervos responsáveis pela inervação dos músculos que transpõem determinada articulação e nela atuam também inervam essa articulação. Os ramos articulares originam-se de ramificações intramusculares dos ramos • • • musculares e diretamente dos nervos nomeados. O conhecimento da inervação dos músculos e de sua relação com as articulações permite deduzir a inervação de muitas articulações. As possíveis deduções sobre a articulação do quadril e suas relações musculares são (Figura 5.83): Músculos flexores inervados pelo nervo femoral passam anteriormente à articulação do quadril; a face anterior da articulação do quadril é inervada pelo nervo femoral (diretamente e por meio de ramificações articulares dos ramos musculares para os músculos pectíneo e reto femoral) Figura 5.83 Relações entre a articulação do quadril e os músculos que movimentam a articulação. A. Corte sagital da articulação do quadril mostrando os músculos, vasos e nervos relacionados. Os músculos são identificados por cores para indicar sua(s) função(ões). Aplicando a lei de Hilton, é possível deduzir a inervação da articulação do quadril conhecendo os músculos que cruzam diretamente a articulação e atuam sobre ela e sua inervação. B. São mostradas as posições relativas dos músculos que movimentam a articulação do quadril e a direção dos movimentos. Os músculos rotadores laterais seguem inferior e posteriormente à articulação do quadril; a face inferior da articulação é suprida pelo nervo obturatório (diretamente e por meio de ramificações articulares do ramo muscular para o músculo obturador externo), e a face posterior é inervada pelo nervo para o músculo quadrado femoral Os músculos adutores inervados pelo nervo glúteo superior passam superiormente à articulação do quadril; a face superior da articulação é inervada pelo nervo glúteo superior. A dor percebida como proveniente da articulação do quadril pode induzir a erro porque pode ser referida da coluna vertebral. • • Articulação do joelho A articulação do joelho é a maior articulação e a mais superficial. É basicamente uma articulação sinovial do tipo gínglimo, que permite flexão e extensão; entretanto, os movimentos de dobradiça são associados ao deslizamento e rolamento e à rotação em torno de um eixo vertical. Embora a articulação do joelho seja bem construída, é comum o comprometimento de sua função quando é hiperestendida (p. ex., em esportes de contato, como hóquei no gelo e futebol). ARTICULAÇÕES, FACES ARTICULARES E ESTABILIDADE DA ARTICULAÇÃO DO JOELHO Os detalhes anatômicos relevantes sobre os ossos relacionados, inclusive suas faces articulares, foram apresentados em “Ossos do membro inferior”, anteriormente. As faces articulares do joelho são caracterizadas pelas grandes dimensões e formatos complexos e incongruentes. A articulação do joelho é formada por três articulações (Figuras 5.84 e 5.85): Duas articulações femorotibiais (lateral e medial) entre os côndilos laterais e mediais do fêmur e da tíbia. Uma articulação femoropatelar intermediária entre a patela e o fêmur. A fíbula não participa da articulação do joelho. A articulação do joelho é relativamente fraca do ponto de vista mecânico em razão da incongruência de suas faces articulares, que foi comparada a duas bolas sobre um tampo de mesa empenado. A estabilidade da articulação do joelho depende (1) da força e das ações dos músculos adjacentes e seus tendões e (2) dos ligamentos que unem o fêmur e a tíbia. Os músculos são os mais importantes entre essas sustentações; portanto, muitas lesões sofridas durante a prática de esportes podem ser evitadas mediante condicionamento e treinamento apropriado. O músculo mais importante na estabilidade da articulação do joelho é o grande músculo quadríceps femoral, sobretudo as fibras inferiores dos músculos vastos medial e lateral (Figura 5.86A). Se o músculo quadríceps femoral estiver bem condicionado, a articulação do joelho funciona muito bem após a distensão do ligamento, o que é uma surpresa. Figura 5.84 Ossos da articulação do joelho. A. Ossos que se articulam no joelho. O osso do quadril e a parte proximal do fêmur são incluídos para mostrar o ângulo Q, determinado durante o exame físico para indicar o alinhamento do fêmur e da tíbia e para avaliar o estresse em valgo ou varo no joelho. B. Os ossos e os acidentes ósseos da face posterior da articulação do joelho e da área do joelho. A posição ereta e estendida é a mais estável da articulação do joelho. Nessa posição, as faces articulares são mais congruentes (o contato é minimizado em todas as outras posições); os ligamentos primários da articulação (ligamentos colaterais e cruzados) encontram-se tensos e os muitos tendões que circundam a articulação proporcionam um efeito de imobilização. Figura 5.85 Radiografia da articulação do joelho. A e B. O desenho de orientação representa as estruturas visíveis na radiografia AP da articulação do joelho direita. Figura 5.86 Face externa da cápsula articular do joelho. A camada fibrosa da cápsula articular é relativamente fina em alguns lugares e mais espessa em outros para formar ligamentos intrínsecos (capsulares) de reforço. A. As modificações das faces anterior e laterais da camada fibrosa incluem os retináculos da patela, que se fixam às laterais do tendão do músculo quadríceps femoral, patela e ligamento da patela, e a incorporação do trato iliotibial (lateralmente) e do ligamento colateral medial (medialmente). B. Os músculos isquiotibiais, o gastrocnêmio e o septo intermuscular posterior foram seccionados e removidos para expor o músculo adutor magno, o septo intermuscular lateral e o assoalho da fossa poplítea. As modificações posteriores da camada fibrosa incluem os ligamentos poplíteos oblíquos e arqueados e uma perfuração inferior ao ligamento poplíteo arqueado para permitir a passagem do tendão do músculo poplíteo. CÁPSULA ARTICULAR DO JOELHO A cápsula articular do joelho é típica por consistir em uma camada fibrosa externa e uma membrana sinovial interna que reveste todas as faces internas da cavidade articular não recobertas por cartilagem articular (Figura 5.87B). A camada fibrosa tem algumas partes espessas que formam ligamentos intrínsecos, mas é fina em sua maior parte e, na verdade, incompleta em algumas áreas (Figura 5.86B). A porção superior da camada fibrosa fixa-se no fêmur, logo proximal às margens articulares dos côndilos. Na parte posterior, a camada fibrosa envolve os côndilos e a fossa intercondilar. A camada fibrosa tem uma abertura posterior ao côndilo lateral da tíbia para permitir que o tendão do músculo poplíteo saia da cápsula articular e se fixe na tíbia (Figura 5.87B). Na parte inferior, a camada fibrosa fixa-se na margem da face articular superior da tíbia (platô tibial), exceto no lugar onde o tendão do músculo poplíteo cruza o osso (Figuras 5.86A e B e 5.87B). O tendão do músculo quadríceps femoral, a patela e o ligamento da patela substituem a camada fibrosa anteriormente – isto é, a camada fibrosa é contínua com as margens lateral e medial dessas estruturas, e não há camada fibrosa distinta na região dessas estruturas (Figuras 5.86A e 5.87B). A extensa membrana sinovial da cápsula reveste todas as superfícies que limitam a cavidade articular (o espaço que contém líquido sinovial) e não são cobertas por cartilagem articular (Figura 5.87A e B). Assim, fixa-se na periferia da cartilagem articular que cobre os côndilos do fêmur e da tíbia; na face posterior da patela; e nas margens dos meniscos, os discos fibrocartilagíneos existentes entre as faces articulares da tíbia e do fêmur. A membrana sinovial reveste a face interna da camada fibrosa lateral e medialmente, mas separa-se da camada fibrosa na parte central. A partir da face posterior da articulação, a membrana sinovial reflete-se anteriormente para a região intercondilar, cobrindo os ligamentos cruzados e o corpo adiposo infrapatelar, excluindo-os da cavidade articular. Isso cria uma prega sinovial infrapatelar mediana, uma prega vertical de membrana sinovial que se aproxima da face posterior da patela, ocupando toda a região intercondilar, exceto a parte mais anterior. Assim, quase subdivide a cavidade articular em cavidades articulares femorotibiais direita e esquerda; na verdade, é assim que os cirurgiões artroscópicos consideram a cavidade articular. Pregas alares laterais e mediais preenchidas por gordura cobrem a face interna dos corpos adiposos que ocupam o espaço de cada lado do ligamento da patela internamente à camada fibrosa. Superiormente à patela, a cavidade articular do joelho estende-se profundamente ao músculo vasto intermédio como a bolsa suprapatelar (Figuras 5.86A e 5.88A e B). A membrana sinovial da cápsula articular é contínua com o revestimento sinovial da bolsa. Essa grande bolsa geralmente estende-se cerca de 5 cm acima da patela; entretanto, pode estender-se até a metade da face anterior do fêmur. Alças musculares situadas profundamente ao músculo vasto intermédio formam o músculo articular do joelho, que se fixa à membrana sinovial e retrai a bolsa durante a extensão do joelho (Figuras 5.22 e 5.86A). LIGAMENTOS EXTRACAPSULARES DA ARTICULAÇÃO DO JOELHO A cápsula articular é fortalecida por cinco ligamentos extracapsulares ou capsulares (intrínsecos): ligamento da patela, ligamento colateral fibular, ligamento colateral tibial, ligamento poplíteo oblíquo e ligamento poplíteo arqueado (Figura 5.86A e B). Às vezes são chamados de ligamentos externos para diferenciá-los dos ligamentos internos, como os ligamentos cruzados. O ligamento da patela, a parte distal do tendão do quadríceps femoral, é uma faixa fibrosa espessa e forte que segue do ápice e das margens adjacentes da patela até a tuberosidade da tíbia (Figura 5.86A). O ligamento da patela é o ligamento anterior da articulação do joelho. Lateralmente, recebe os retináculos medial e lateral da patela, expansões aponeuróticas dos músculos vastos medial e lateral e fáscia muscular sobrejacente. Os retináculos formam a cápsula articular do joelho de cada lado da patela (Figuras 5.86A e 5.87B) e têm papel importante na manutenção do alinhamento da patela em relação à face articular patelar do fêmur. O posicionamento oblíquo do fêmur e/ou a linha de tração do músculo quadríceps femoral em relação ao eixo do tendão patelar e da tíbia, clinicamente chamado de ângulo Q, favorece o deslocamento lateral da patela (Figura 5.84). Os ligamentos colaterais do joelho encontram-se tensos na posição de extensão completa do joelho, contribuindo para a estabilidade na posição de pé (Figura 5.88A e D). Durante a flexão, eles se tornam cada vez mais frouxos, permitindo e limitando (atuando como ligamentos de contenção para) a rotação no joelho. O ligamento colateral fibular (LCF), um ligamento extracapsular semelhante a um cordão, é forte. Estende-se inferiormente a partir do epicôndilo lateral do fêmur até a face lateral da cabeça da fíbula (Figura 5.88A e C). O tendão do poplíteo passa profundamente ao LCF, separando-o do menisco lateral. O tendão do bíceps femoral é dividido em duas partes pelo LCE (Figura 5.88A). O ligamento colateral tibial (LCT)é uma faixa forte, plana, intrínseca (capsular) que se estende do epicôndilo medial do fêmur ao epicôndilo medial e parte superior da face medial da tíbia (Figura 5.88D e E). Em seu ponto médio, as fibras profundas do LCT estão firmemente fixadas no menisco medial. A lesão do LCT, que é mais fraco do que o LCF, é mais comum. Consequentemente, o LCT e o menisco medial rompem-se com frequência durante a prática de esportes de contato como futebol americano e hóquei no gelo. O ligamento poplíteo oblíquo é uma expansão recorrente do tendão do semimembranáceo que reforça a cápsula articular posteriormente quando transpõe a fossa intracondilar (Figura 5.86B). O ligamento origina-se posteriormente ao côndilo medial da tíbia e segue em sentido superolateral em direção ao côndilo lateral do fêmur, fundindo-se com a parte central da face posterior da cápsula articular. O ligamento poplíteo arqueado também fortalece a parte posterolateral da cápsula articular. Origina-se da face posterior da cabeça da fíbula, segue em sentido superomedial sobre o tendão do poplíteo, e estende-se sobre a face posterior da articulação do joelho. Seu desenvolvimento parece estar inversamente relacionado com a presença e ao tamanho de uma fabela na fixação proximal da cabeça lateral do músculo gastrocnêmio (ver, no boxe azul, “Fabela no músculo gastrocnêmio”; Figura B5.21, anteriormente). Acredita-se que as duas estruturas contribuam para a estabilidade posterolateral do joelho. Figura 5.87 Face interna da cápsula articular do joelho: membranas, cavidade articular e faces articulares. A. A cápsula articular foi aberta transversalmente, a patela foi serrada e, depois, o joelho foi fletido, abrindo a cavidade articular. A prega infrapatelar de membrana sinovial reveste os ligamentos cruzados, excluindo-os da cavidade articular. Todas as faces internas que não são recobertas nem formadas por cartilagem articular (azul, ou cinza no caso dos meniscos) são revestidas por membrana sinovial (principalmente roxa, mas transparente e incolor nos locais onde cobre faces não articulares do fêmur). B. Fixações da membrana fibrosa e da membrana sinovial à tíbia. Observe que, embora sejam adjacentes de cada lado, separam-se no centro para acomodar estruturas intercondilares e infrapatelares que são intracapsulares (situadas dentro da camada fibrosa), mas extraarticulares (excluídas da cavidade articular pela membrana sinovial). Figura 5.88 Ligamentos colaterais e bolsas da articulação do joelho. A. Ligamento colateral fibular. Foi injetado látex roxo para mostrar a cavidade articular extensa e complexa. A cavidade/membrana sinovial estende-se em sentido superior, profundamente ao músculo quadríceps femoral, formando a bolsa suprapatelar. B. Artrografia, articulação do joelho em leve flexão. A bolsa suprapatelar é insuflada com CO2 . C. Os locais de fixação do LCF (verde) e músculos relacionados (vermelho, proximal; azul, distal). D. Ligamento colateral tibial (isolado da camada fibrosa da cápsula articular, da qual faz parte). E. Os locais de fixação do LCT e músculos relacionados. LIGAMENTOS INTRA-ARTICULARES DO JOELHO Os ligamentos intra-articulares do joelho consistem nos ligamentos cruzados e meniscos. O tendão poplíteo também é intraarticular durante parte de seu trajeto. Os ligamentos cruzados cruzam-se dentro da cápsula articular, mas fora da cavidade sinovial (Figuras 5.89 e 5.90). Os ligamentos cruzados estão localizados no centro da articulação e cruzam-se obliquamente, como a letra X. Durante a rotação medial da tíbia sobre o fêmur, os ligamentos cruzados espiralam-se ao redor um do outro; assim, o grau de rotação medial possível é limitado a cerca de 10°. Como eles se desenrolam durante a rotação lateral, é possível realizar quase 60° de rotação lateral quando o joelho é fletido a cerca de 90°, sendo o movimento finalmente limitado pelo LCT. O quiasma (ponto de cruzamento) dos ligamentos cruzados é o eixo para movimentos giratórios no joelho. Em razão de sua orientação oblíqua, em todas as posições um ligamento cruzado, ou partes de um ou de ambos os ligamentos, está tenso. Os ligamentos cruzados mantêm contato com as faces articulares do fêmur e da tíbia durante a flexão do joelho (Figura 5.89C). Figura 5.89 Ligamentos cruzados da articulação do joelho. A. Face superior da face articular superior da tíbia (platô tibial) mostrando os côndilos medial e lateral (faces articulares) e a eminência intercondilar entre eles. Os locais de fixação dos ligamentos cruzados são coloridos de verde; aqueles do menisco medial, de roxo; e os do menisco lateral, laranja. B. O tendão do músculo quadríceps femoral foi seccionado e a patela (dentro do tendão e sua continuação, o ligamento da patela) foi rebatida inferiormente. O joelho é fletido para mostrar os ligamentos cruzados. C. Nestas vistas lateral e medial, o fêmur foi seccionado longitudinalmente e foi removida quase a metade dele com a parte proximal do ligamento cruzado correspondente. A vista lateral mostra como o ligamento cruzado posterior resiste ao deslocamento anterior do fêmur sobre o platô tibial. A vista medial mostra como o ligamento cruzado anterior resiste ao deslocamento posterior do fêmur sobre o platô tibial. D. As duas cabeças do gastrocnêmio foram rebatidas superiormente, e o músculo bíceps femoral foi rebatido inferiormente. A cavidade articular foi preenchida com látex roxo para mostrar sua continuidade com as várias bolsas e as reflexões e fixações da complexa membrana sinovial. Figura 5.90 Meniscos da articulação do joelho. A. O tendão do músculo quadríceps femoral foi seccionado, e a patela e o ligamento da patela foram rebatidos inferior e anteriormente. Podem-se ver os meniscos, suas fixações à área intercondilar da tíbia e as fixações tibiais dos ligamentos cruzados. B. O ligamento colateral tibial, semelhante a uma faixa, está fixado ao menisco medial. O ligamento colateral fibular, semelhante a um cordão, foi separado do menisco lateral. O ligamento meniscofemoral posterior fixa o menisco lateral no côndilo medial do fêmur. C e D. Os números na imagem de RM referem-se às estruturas identificadas no corte coronal (frontal) anatômico correspondente. (A parte C é cortesia do Dr. W. Kucharczyk, Professor e Neuroradiologist Senior Scientist, Department of Medical Resonance Imaging, University Health Network, Toronto, Ontario, Canada.) O ligamento cruzado anterior (LCA), o mais fraco dos dois ligamentos cruzados, origina-se na área intercondilar anterior da tíbia, imediatamente posterior à fixação do menisco medial (Figura 5.89A e B). O LCA tem vascularização relativamente pequena, estende-se em sentido superior, posterior e lateral e se fixa na parte posterior da face medial do côndilo lateral do fêmur (Figura 5.89C). Limita a rolagem posterior dos côndilos do fêmur sobre o platô tibial durante a flexão, convertendo-o em rotação (sem sair do lugar). Também impede o deslocamento posterior do fêmur sobre a tíbia e a hiperextensão da articulação do joelho. Quando a articulação é fletida em ângulo reto, a tração anterior da tíbia não é possível (como ao puxar uma gaveta) porque é segura pelo LCA. O ligamento cruzado posterior (LCP), o mais forte dos dois ligamentos cruzados, origina-se da área intercondilar posterior da tíbia (Figura 5.89A e D). O LCP segue em sentido superior e anterior na face medial do LCA para se fixar à parte anterior da face lateral do côndilo medial do fêmur (Figura 5.89B e C). O LCP limita a rolagem anterior do fêmur sobre o platô tibial durante a extensão, convertendo-a em rotação. Também impede o deslocamento anterior do fêmur sobre a tíbia ou o deslocamento posterior da tíbia sobre o fêmur e ajuda a evitar a hiperflexão da articulação do joelho. No joelho fletido com sustentação de peso, o LCP é o principal fator estabilizador do fêmur (p. ex., ao caminhar em um declive). Os meniscos da articulação do joelho são lâminas em forma de meia-lua (“hóstias”) de fibrocartilagem na face articular da tíbia que aprofundam a superfície e absorvem o choque (Figuras 5.89 e 5.90). Os meniscos são mais espessos em suas margens externas e afilam-se até formarem margens finas, não fixadas no interior da articulação. Os meniscos, que têm formato de cunha em corte transversal, estão firmemente fixados em suas extremidades na área intercondilar da tíbia (Figura 5.89A). As margens externas fixam-se à cápsula articular do joelho. Os ligamentos coronários são partes da cápsula articular que se estendem entre as margens dos meniscos e a maior parte da periferia dos côndilos da tíbia (Figuras 5.89B e 5.90A). Uma faixa fibrosa delgada, o ligamento transverso do joelho une-se às margens anteriores dos meniscos, cruzando a área intercondilar anterior (Figura 5.9A) e fixando os meniscos um ao outro durante movimentos do joelho. O menisco medial tem formato de C, é mais largo na parte posterior do que na anterior (Figura 5.90A). Sua extremidade (corno) anterior está fixada à área intercondilar anterior da tíbia, anteriormente à fixação do LCA (Figuras 5.89A e B e 5.90A). A extremidade posterior está fixada à área intercondilar posterior, anteriormente à fixação do LCP. O menisco medial adere firmemente à face profunda do LCT (Figuras 5.88D e 5.90A a D). Em razão de suas fixações amplas laterais na área intercondilar tibial e mediais no LCT, o menisco medial é menos móvel sobre o platô tibial do que o menisco lateral. O menisco lateral é quase circular, menor e tem mais mobilidade do que o menisco medial (Figura 5.90A). O tendão do músculo poplíteo tem duas partes na região proximal. Uma parte fixa-se no epicôndilo lateral do fêmur e segue entre o menisco lateral e a parte inferior da face epicondilar lateral do fêmur (sobre a face medial do tendão) e o LCF que se situa na sua face lateral (Figuras 5.88A e 5.89B e D). A outra parte mais medial do tendão do músculo poplíteo fixa-se no ramo posterior do menisco lateral. Uma alça tendínea forte, o ligamento meniscofemoral posterior, une o menisco lateral ao LCP e ao côndilo medial do fêmur (Figuras 5.89D e 5.90A e B). MOVIMENTOS DA ARTICULAÇÃO DO JOELHO A flexão e a extensão são os principais movimentos do joelho; há alguma rotação quando o joelho está fletido. A Figura 5.91 ilustra os principais movimentos da articulação do joelho, e o Quadro 5.16 apresenta os músculos responsáveis e detalhes relevantes. Quando está completamente estendido com o pé apoiado no solo, o joelho “trava” passivamente por causa da rotação medial dos côndilos do fêmur sobre o platô tibial (o “mecanismo de aparafusamento”). Essa posição torna o membro inferior uma sólida coluna e mais adaptado para sustentação de peso. Quando o joelho é “travado”, os músculos da coxa e da perna podem relaxar rapidamente sem tornarem o joelho instável demais. Para “destravar” o joelho, o músculo poplíteo se contrai, girando o fêmur lateralmente cerca de 5° sobre o platô tibial, o que permite a flexão do joelho. Movimentos dos meniscos. Embora o movimento de rolamento dos côndilos do fêmur durante a flexão e a extensão seja limitado (convertido em rotação) pelos ligamentos cruzados, há algum rolamento, e o ponto de contato entre o fêmur e a tíbia move-se posteriormente com a flexão e retorna anteriormente com a extensão. Além disso, durante a rotação do joelho, um côndilo femoral move-se anteriormente sobre o côndilo da tíbia correspondente enquanto o outro côndilo do fêmur movese posteriormente, girando em torno dos ligamentos cruzados. Os meniscos devem ser capazes de migrar sobre o platô tibial quando os pontos de contato entre o fêmur e a tíbia se modificam. VASCULARIZAÇÃO DA ARTICULAÇÃO DO JOELHO As artérias que suprem a articulação do joelho são os 10 vasos que formam a rede articular do joelho: os ramos geniculares dos ramos femoral, poplíteo e recorrentes anterior e posterior das artérias recorrente tibial anterior e circunflexa fibular (Figuras 5.92 e 5.93B). Os ramos geniculares médios da artéria poplítea penetram a camada fibrosa da cartilagem articular e suprem os ligamentos cruzados, a membrana sinovial e as margens periféricas dos meniscos. INERVAÇÃO DA ARTICULAÇÃO DO JOELHO Refletindo a lei de Hilton, os nervos que suprem os músculos que cruzam (atuam sobre) a articulação do joelho também suprem a articulação (Figura 5.93D); assim, os ramos articulares dos nervos femoral (os ramos para os músculos vastos), tibial e fibular comum suprem suas faces anterior, posterior e lateral, respectivamente. Além disso, porém, os nervos obturatório e safeno (cutâneo) enviam ramos articulares para sua face medial. Figura 5.91 Movimentos da articulação do joelho. Quadro 5.16 Movimentos da articulação do joelho e músculos responsáveis. Movimento Graus possíveis Músculos que produzem movimento Fatores limitantes (controladores) do movimento Comentários Primários Secundários Extensão Joelhos saudáveis estendem-se até 0° (alinhamento reto dos eixos da tíbia e do fêmur) a Quadríceps femoral Fracamente: tensor da fáscia lata A margem anterior do menisco lateral toca o sulco superficial entre as faces tibial e patelar dos côndilos do fêmur; o ligamento cruzado anterior toca o sulco na fossa intercondilar A capacidade de o M. quadríceps femoral produzir extensão é maior quando a articulação do quadril está estendida; a flexão diminui sua eficiência Flexão 120° (quadril estendido); 140° (quadril fletido); 160° passivamente Isquiotibiais (semitendíneo, semimembranáceo, cabeça longa do bíceps femoral); cabeça curta do M. bíceps femoral Grácil, sartório, gastrocnêmio, poplíteo A panturrilha toca a coxa; o comprimento dos músculos isquiotibiais também é importante — é possível realizar maior flexão do joelho quando a articulação do quadril está fletida; não é possível realizar flexão total do joelho quando o quadril está estendido Normalmente, o papel do M. gastrocnêmio é mínimo, mas quando existe fratura supracondilar, ele gira (flete) o fragmento distal do fêmur Rotação medial 10° com o joelho fletido; 5° com o joelho estendido Semitendíneo e semimembranáceo quando o joelho está fletido; poplíteo quando o joelho que não sustenta o peso está estendido Grácil, sartório Ligamentos colaterais, frouxos durante a flexão sem rotação, tornam-se tensos nos limites da rotação Quando o joelho estendido está sustentando peso, a ação do M. poplíteo provoca rotação lateral do fêmur; quando não está sustentando peso, o M. poplíteo gira a patela medialmente Rotação lateral 30° Bíceps femoral quando o joelho está fletido Os ligamentos colaterais tornam-se tensos; o ligamento cruzado anterior espirala-se ao redor do ligamento cruzado posterior No fim da rotação, sem oposição, o M. tensor da fáscia lata pode ajudar a manter a posição aO alinhamento reto do eixo da tíbia com o eixo do fêmur é de 0°; a faixa normal de variação estende-se a – 3° (3° de hiperextensão). BOLSAS AO REDOR DA ARTICULAÇÃO DO JOELHO Existem pelo menos 12 bolsas ao redor da articulação do joelho, porque a maioria dos tendões segue paralelamente aos ossos e traciona a articulação no sentido longitudinal durante movimentos do joelho. As principais bolsas do joelho são ilustradas na Figura 5.94 e descritas no Quadro 5.17. As bolsas subcutâneas pré-patelar e infrapatelar estão localizadas na face convexa da articulação, permitindo que a pele seja capaz de se movimentar livremente durante movimentos do joelho (ver Figuras 5.87A e 5.88A). Figura 5.92 Anastomoses arteriais ao redor do joelho. Além de garantir a circulação colateral, as artérias da rede articular do joelho suprem as estruturas que circundam a articulação e a própria articulação (p. ex., sua articulação ou cápsula articular). Compare essas vistas com a vista anterior na Figura 5.93B. Figura 5.93 Articulações e estruturas neurovasculares da perna e do pé. A. As articulações tibiofibulares incluem a articulação tibiofibular sinovial e a sindesmose tibiofibular; esta última é formada pela membrana interóssea da perna e os ligamentos tibiofibulares anterior e posterior. A direção oblíqua das fibras da membrana interóssea, que se estendem principalmente no sentido inferolateral a partir da tíbia, permite pequeno movimento da fíbula para cima, mas resiste à sua tração para baixo. B. Irrigação arterial das articulações da perna e do pé. Anastomoses periarticulares circundam o joelho e o tornozelo. C. Dos nove músculos fixados à fíbula, todos, exceto um, tracionam a fíbula para baixo. D. Inervação da perna e do pé. A partir do joelho e progredindo distalmente no membro, os nervos cutâneos participam cada vez mais da inervação das articulações, assumindo-a por completo na região distal do pé e nos dedos. Quatro bolsas comunicam-se com a cavidade sinovial da articulação do joelho: bolsa suprapatelar, bolsa do poplíteo (profundamente à parte distal do músculo quadríceps femoral), bolsa anserina (profundamente às fixações tendíneas distais dos músculos sartório, grácil e semitendíneo) e bolsa do músculo gastrocnêmio (Figuras 5.88A e 5.89D). A grande bolsa suprapatelar (Figuras 5.86A e 5.88A) tem importância especial porque uma infecção nela pode se disseminar para a cavidade articular do joelho. Embora se desenvolva separadamente da articulação do joelho, a bolsa torna-se contínua com ela. Articulações tibiofibulares A tíbia e a fíbula estão unidas por duas articulações: a articulação tibiofibular superior e a sindesmose tibiofibular (tibiofibular inferior). Além disso, uma membrana interóssea une os corpos dos dois ossos (Figura 5.93A). As fibras da membrana interóssea e todos os ligamentos das duas articulações tibiofibulares seguem em sentido inferior da tíbia até a fíbula. Assim, a membrana e os ligamentos resistem fortemente à tração inferior da fíbula por oito dos nove músculos fixados a ela (Figura 5.93C). Entretanto, permitem pequeno movimento superior da fíbula que ocorre quando a extremidade larga (posterior) da tróclea do tálus está encunhada entre os maléolos durante a dorsiflexão no tornozelo. O movimento na articulação tibiofibular superior é impossível sem movimento na sindesmose tibiofibular inferior. Os vasos tibiais anteriores atravessam um hiato na extremidade superior da membrana interóssea (Figura 5.93A e B). Na extremidade inferior da membrana há um hiato menor atravessado pelo ramo perfurante da artéria fibular. ARTICULAÇÃO TIBIOFIBULAR A articulação tibiofibular é uma articulação sinovial plana entre a face articular plana na cabeça da fíbula e uma face articular semelhante em posição posterolateral no côndilo lateral da tíbia (Figuras 5.90B e D e 5.93A). Uma cápsula articular tensa circunda a articulação e fixa-se nas margens das faces articulares da fíbula e tíbia. A cápsula articular é fortalecida pelos ligamentos anterior e posterior da cabeça da fíbula, que seguem em sentido superomedial desde a cabeça da fíbula até o côndilo lateral da tíbia (Figura 5.90B). A articulação é cruzada posteriormente pelo tendão do poplíteo. Uma bolsa de membrana sinovial da articulação do joelho, o recesso poplíteo (Figura 5.94; Quadro 5.17), passa entre o tendão do poplíteo e o côndilo lateral da tíbia. Em cerca de 20% dos casos, a bolsa também se comunica com a cavidade sinovial da articulação tibiofibular, permitindo a transmigração de processos inflamatórios entre as duas articulações. Figura 5.94 Bolsas ao redor da articulação do joelho e na parte proximal da perna. Quadro 5.17 Bolsas na região do joelho. Bolsas Localizações Comentários Suprapatelar Entre o fêmur e o tendão do M. quadríceps femoral Mantida em posição pelos músculos articulares do joelho; comunica-se livremente com a (extensão superior da) cavidade sinovial da articulação do joelho Poplítea (recesso poplíteo) Entre o tendão do M. poplíteo e o côndilo lateral da tíbia Abre-se na cavidade sinovial da articulação do joelho inferiormente ao menisco lateral Anserina Separa os tendões dos Mm. sartório, grácil e semitendíneo da tíbia e do ligamento colateral tibial Área onde os tendões desses músculos fixam-se à tíbia; assemelha-se a um pé de ganso Do músculo gastrocnêmio Profundamente à fixação proximal do tendão da cabeça medial do M. gastrocnêmio Uma extensão da cavidade sinovial da articulação do joelho Do músculo semimembranáceo Entre a cabeça medial do M. gastrocnêmio e o tendão do M. semimembranáceo Relacionada à fixação distal do músculo semimembranáceo Subcutânea pré- patelar Entre a pele e a face anterior da patela Permite o livre movimento da pele sobre a patela durante movimentos da perna Subcutânea infrapatelar Entre a pele e a tuberosidade da tíbia Ajuda o joelho a resistir à pressão ao ajoelhar-se Infrapatelar profunda Entre o ligamento da patela e a face anterior da tíbia Separada da articulação do joelho pelo corpo adiposo infrapatelar Movimento. Há pequeno movimento da articulação durante a dorsiflexão do pé em virtude do encunhamento da tróclea do tálus entre os maléolos (ver “Faces articulares da articulação talocrural”, adiante). Vascularização. As artérias da articulação tibiofibular superior originam-se das artérias inferior lateral do joelho e recorrente tibial anterior (Figuras 5.92A e 5.93B). Inervação. Os nervos da articulação tibiofibular provêm do nervo fibular comum e do nervo para o músculo poplíteo (Figura 5.93D). SINDESMOSE TIBIOFIBULAR 1. 2. A sindesmose tibiofibular é uma articulação fibrosa composta. É a união fibrosa da tíbia e fíbula por meio da membrana interóssea (que une os corpos) e os ligamentos tibiofibulares anterior, interósseo e posterior (estes últimos formam a parte inferior da articulação, que une as extremidades distais dos ossos). A integridade da sindesmose tibiofibular é essencial para a estabilidade da articulação talocrural porque mantém o maléolo lateral firmemente contra a face lateral do tálus. Faces articulares e ligamentos. A área articular triangular áspera na face medial da extremidade inferior da fíbula articula-se com uma face na extremidade inferior da tíbia (Figura 5.93A). O forte ligamento tibiofibular interósseo profundo, contínuo superiormente com a membrana interóssea, forma a principal conexão entre a tíbia e a fíbula. A articulação também é fortalecida nas partes anterior e posterior pelos fortes ligamentos tibiofibulares anterior e posterior externos. A continuação profunda distal do ligamento tibiofibular posterior, o ligamento transverso (tibiofibular) inferior, forma uma forte conexão entre as extremidades distais da tíbia (maléolo medial) e a fíbula (maléolo lateral). Toca o tálus e forma a “parede” posterior de um encaixe quadrado (com três paredes profundas e uma parede anterior rasa ou aberta), o encaixe maleolar, para a tróclea do tálus. As paredes lateral e medial do encaixe são formadas pelos respectivos maléolos (Figura 5.95). Movimento. Há pequeno movimento da articulação para acomodar o encunhamento da porção larga da tróclea do tálus entre os maléolos durante a dorsiflexão do pé. Vascularização. As artérias originam-se do ramo perfurante da artéria fibular e dos ramos maleolares mediais das artérias tibiais anterior e posterior (Figura 5.93B). Inervação. Os nervos para a sindesmose provêm dos nervos fibular profundo, tibial e safeno (Figura 5.93D). Articulação talocrural A articulação talocrural (articulação do tornozelo) é sinovial do tipo gínglimo. Está localizada entre as extremidades distais da tíbia e da fíbula e a parte superior do tálus (Figuras 5.95 e 5.96). A articulação talocrural pode ser palpada entre os tendões na face anterior do tornozelo como uma pequena depressão, cerca de 1 cm proximal à extremidade do maléolo medial. FACES ARTICULARES DA ARTICULAÇÃO TALOCRURAL As extremidades distais da tíbia e da fíbula (junto com a parte transversal inferior do ligamento tibiofibular posterior) (Figura 5.93A) formam um encaixe maleolar no qual se encaixa a tróclea do tálus, que tem formato de polia (Figuras 5.95B e 5.96). A tróclea é a face articular superior arredondada do tálus (ver Figura 5.99C). A face medial do maléolo lateral articula-se com a face lateral do tálus. A tíbia articula-se com o tálus em dois lugares: A face inferior forma o teto do encaixe maleolar, transferindo o peso do corpo para o tálus O maléolo medial articula-se com a face medial do tálus. Os maléolos seguram o tálus firmemente quando este gira no encaixe durante os movimentos da articulação. A preensão dos maléolos na tróclea é mais forte durante a dorsiflexão do pé (quando uma pessoa “se apoia no calcanhar” ao descer uma ladeira íngreme ou no cabo de guerra) porque esse movimento força a parte anterior, mais larga, da tróclea posteriormente entre os maléolos, afastando um pouco a tíbia e a fíbula. Esse afastamento é limitado principalmente pelo forte ligamento tibiofibular interósseo e também pelos ligamentos tibiofibulares anterior e posterior que unem a tíbia e a fíbula (Figuras 5.96 e 5.97). O ligamento interósseo está posicionado profundamente entre as faces quase congruentes da tíbia e da fíbula; embora seja mostrado no detalhe da Figura 5.93A, o ligamento só pode ser realmente observado quando roto ou em corte transversal. 1. Figura 5.95 Imagem radiológica da articulação talocrural. A. Tornozelo esquerdo (cortesia do Dr. P. Bobechko e Dr. E. Becker, Department of Medical Imaging, University of Toronto, Toronto, Ontario, Canada.) B. Articulação talocrural de um menino de 14 anos. As lâminas epifisiais são evidentes nessa idade. Figura 5.96 Anatomia seccional da região do tornozelo. A e B. O desenho de orientação representa as estruturas visíveis na RM do tornozelo. (Cortesia do Dr. W. Kucharczyk, Professor e Neuroradiologist Senior Scientist, Department of Medical Resonance Imaging, University Health Network, Toronto, Ontario, Canada.) A articulação talocrural é relativamente instável durante a flexão plantar porque a tróclea é mais estreita na parte posterior e, portanto, está relativamente frouxa no encaixe. É durante a flexão plantar que ocorre a maioria das lesões do tornozelo (geralmente em virtude da inversão súbita, inesperada – e, portanto, sem resistência adequada – do pé). CÁPSULA DA ARTICULAÇÃO TALOCRURAL A cápsula da articulação talocrural é fina nas partes anterior e posterior, mas é sustentada de cada lado pelos fortes ligamentos colaterais medial e lateral (Figuras 5.97 e 5.98; áreas finas da cápsula foram removidas na Figura 5.97, deixando apenas as partes reforçadas – os ligamentos – e uma prega sinovial). A camada fibrosa está fixada superiormente às margens das faces articulares da tíbia e maléolos, e inferiormente ao tálus. A membrana sinovial é frouxa e reveste a camada fibrosa da cápsula. A cavidade sinovial costuma estender-se superiormente entre a tíbia e a fíbula até o ligamento tibiofibular interósseo. LIGAMENTOS DA ARTICULAÇÃO TALOCRURAL A articulação talocrural é reforçada lateralmente pelo ligamento colateral lateral, uma estrutura composta formada por três ligamentos completamente separados (Figura 5.97A e B). Ligamento talofibular anterior, uma faixa plana e fraca que se estende em sentido anteromedial do maléolo lateral até o 2. 3. • • colo do tálus Ligamento talofibular posterior, uma faixa espessa, bastante forte, que segue em trajeto horizontal, em sentido medial e ligeiramente posterior a partir da fossa do maléolo até o tubérculo lateral do tálus Ligamento calcaneofibular, um cordão redondo que segue em sentido posteroinferior da extremidade do maléolo lateral até a face lateral do calcâneo. A cápsula articular é reforçada medialmente pelo grande e forte ligamento colateral medial (ligamento deltóideo) cuja fixação proximal é no maléolo medial (Figura 5.98). O ligamento medial abre-se em leque a partir do maléolo, fixando-se distalmente ao tálus, calcâneo e navicular por meio de quatro partes adjacentes e contínuas: a parte tibionavicular, a parte tibiocalcânea e as partes tibiotalares anterior e posterior. O ligamento medial estabiliza a articulação talocrural durante a eversão e impede a subluxação da articulação. MOVIMENTOS DA ARTICULAÇÃO TALOCRURAL Os principais movimentos da articulação talocrural são dorsiflexão e flexão plantar do pé, que ocorrem em torno de um eixo transversal que passa pelo tálus (Figura 5.99B). Como a extremidade estreita da tróclea do tálus situa-se frouxamente entre os maléolos quando o pé encontra-se em flexão plantar, é possível algum “balanço” (pequenos graus de abdução, adução, inversão e eversão) nessa posição instável. A dorsiflexão do tornozelo é produzida pelos músculos no compartimento anterior da perna (ver Quadro 5.10). A dorsiflexão geralmente é limitada pela resistência passiva do músculo tríceps sural ao estiramento e por tensão nos ligamentos colaterais medial e lateral Figura 5.97 Dissecção da articulação talocrural e das articulações de inversão e eversão. Em (A), o pé foi invertido (colocando-se uma cunha sob ele) para mostrar as faces articulares e tensionar os ligamentos laterais. A flexão plantar do tornozelo é produzida pelos músculos no compartimento posterior da perna (ver Quadro 5.13). Quando os bailarinos dançam na ponta dos pés, por exemplo, o dorso do pé está alinhado com a face anterior da perna. VASCULARIZAÇÃO DA ARTICULAÇÃO TALOCRURAL As artérias são derivadas de ramos maleolares das artérias fibular e tibiais anterior e posterior (Figura 5.93B). INERVAÇÃO DA ARTICULAÇÃO TALOCRURAL Os nervos são derivados do nervo tibial e do nervo fibular profundo, uma divisão do nervo fibular comum (Figura 5.93D). Articulações do pé As muitas articulações do pé envolvem os ossos tarsais, os metatarsais e as falanges (Figura 5.99; Quadro 5.18). As articulações intertarsais importantes são a articulação talocalcânea e a articulação transversa do tarso (articulações calcaneocubóidea e talocalcaneonavicular). A inversão e a eversão do pé são os principais movimentos dessas articulações. As outras articulações intertarsais (p. ex., articulações intercuneiformes) e as articulações tarsometatarsais e intermetatarsais são relativamente pequenas e estão unidas tão firmemente por ligamentos que só há pequenos movimentos entre elas. No pé, a flexão e a extensão ocorrem no antepé, nas articulações metatarsofalângica e interfalângica (Figura 5.100A e B; Quadro 5.19). A inversão é potencializada por flexão dos dedos (sobretudo o hálux e o 2 o dedo), e a eversão por sua extensão (sobretudo dos dedos laterais). Todos os ossos do pé proximais às articulações metatarsofalângicas são unidos pelos ligamentos dorsais e plantares. Os ossos das articulações metatarsofalângicas e interfalângicas são unidos pelos ligamentos colaterais lateral e medial. Figura 5.98 Tendões e ligamentos na face medial do tornozelo e do pé. A. Relações entre os tendões dos músculos flexores, o maléolo medial e o sustentáculo do tálus em seu trajeto de descida na face posterolateral da região do tornozelo e entrada no pé. O retináculo dos músculos flexores foi removido, com exceção da parte que aprisiona o tendão do músculo flexor longo do hálux. B. Esta dissecção mostra as quatro partes do ligamento medial (deltóideo) do tornozelo. A articulação talocalcânea situa-se no local onde o tálus se apoia e articula com o calcâneo. A articulação talocalcânea anatômica é uma articulação sinovial única entre a face articular calcânea posterior do tálus, ligeiramente côncava, e a face articular posterior convexa do calcâneo (Figuras 5.96B e 5.97B). A cápsula articular é fraca, mas é sustentada por ligamentos talocalcâneos medial, lateral, posterior e interósseo (Figuras 5.96B e 5.97A). O ligamento talocalcâneo interósseo situa-se dentro do seio tarsal, que separa as articulações talocalcânea e talocalcaneonavicular e é bastante forte. Os ortopedistas usam o termo articulação talocalcânea para designar a articulação funcional composta formada pela articulação talocalcânea anatômica mais a parte talocalcânea da articulação talocalcaneonavicular. Os dois elementos separados da articulação • talocalcânea clínica “cavalgam” o ligamento interósseo talocalcâneo. Estruturalmente, a definição anatômica é lógica porque a articulação talocalcânea anatômica é uma articulação distinta, que tem suas próprias cápsula articular e cavidade articular. Do ponto de vista funcional, porém, a definição clínica é lógica, porque as duas partes da articulação composta funcionam como uma unidade; seu funcionamento independente é impossível. A articulação talocalcânea (por qualquer definição) é o local onde ocorre a maior parte da inversão e eversão, ao redor de um eixo que é oblíquo. A articulação transversa do tarso é uma articulação composta formada por duas articulações separadas alinhadas transversalmente: a parte talonavicular da articulação talocalcaneonavicular e a articulação calcaneocubóidea (Figura 5.99B e C). Nessa articulação, as partes média e anterior do pé giram como uma unidade sobre a parte posterior do pé, em torno de um eixo longitudinal (AP), aumentando os movimentos de inversão e eversão que ocorrem na articulação talocalcânea clínica. A transecção da articulação transversa é um método padronizado para amputação cirúrgica do pé. PRINCIPAIS LIGAMENTOS DO PÉ Os principais ligamentos da face plantar do pé (Figura 5.101) são: Ligamento calcaneonavicular plantar, que atravessa e preenche um espaço cuneiforme entre o sustentáculo do tálus e a margem inferior da face articular posterior do navicular (Figura 5.101A e B). O ligamento calcaneonavicular plantar sustenta a cabeça do tálus e tem papéis importantes na transferência de peso do tálus e na manutenção do arco longitudinal do pé, do qual é o elemento fundamental (elemento superior) Figura 5.99 Articulações do pé. Quadro 5.18 Articulações do pé. Articulação Tipo Faces articulares Cápsula articular Ligamentos Movimentos Vascularização Face inferior do corpo do tálus (face articular Ligamentos talocalcâneos Talocalcânea Articulação sinovial plana calcânea posterior) articula-se com a face superior (face articular talar posterior) do calcâneo A membrana fibrosa da cápsula articular está fixada às margens das faces articulares medial, lateral e posterior sustentam a cápsula; o ligamento talocalcâneo interósseo une os ossos Inversão e eversão do pé Aa. tibial posterior e fibular Talocalcaneonavicular Articulação sinovial; a parte talonavicular é do tipo esferóidea A cabeça do tálus articula-se com o calcâneo e o navicular A cápsula articular envolve incompletamente a articulação O ligamento calcaneonavicular plantar (“em mola”) sustenta a cabeça do tálus São possíveis movimentos de deslizamento e rotatórios A. tibial anterior via A. tarsal lateral, um ramo da A. dorsal do pé Calcaneocubóidea Articulação sinovial plana A extremidade anterior do calcâneo articula-se com a face posterior do cuboide A cápsula fibrosa envolve a articulação Ligamentos calcaneocubóideo dorsal, calcaneocubóideo plantar e plantar longo sustentam a cápsula articular Inversão e eversão do pé; circundução Cuneonavicular O navicular anterior articula-se com as faces posteriores dos cuneiformes A cápsula comum envolve as articulações Ligamentos cuneonaviculares dorsal e plantar Há pouco movimento Tarsometatarsal Ossos tarsais anteriores articulam-se com as bases dos ossos metatarsais Cápsulas articulares separadas envolvem cada articulação Os ligamentos tarsometatarsais dorsais, plantares e interósseos unem os ossos Deslizamento Intermetatarsal Articulação sinovial plana As bases dos ossos metatarsais articulam-se entre si Cápsulas articulares separadas envolvem cada articulação Os ligamentos metatarsais dorsais, plantares e interósseos unem os quatro ossos metatarsais laterais Há pouco movimento individual A. tarsal lateral (um ramo da A. dorsal do pé) Metatarsofalângica Articulação sinovial elipsóidea As cabeças dos ossos metatarsais articulam-se com as bases das Os ligamentos colaterais sustentam a cápsula de cada lado; o ligamento plantar Flexão, extensão e alguma abdução, adução e falanges proximais sustenta a parte plantar da cápsula circundução Interfalângica Articulação sinovial tipo gínglimo A cabeça de uma falange articula-se com a base da outra distalmente Ligamentos colaterais e plantares sustentam as articulações Flexão e extensão Ramos digitais do arco plantar Figura 5.100 Movimentos das articulações do antepé. Quadro 5.19 Movimento das articulações do antepé e músculos responsáveis. Movimento (as letras referem-se à Figura 5.100) Músculos a Articulações metatarsofalângicas Flexão (A) Flexor curto dos dedos Lumbricais Interósseos Flexor curto do hálux Flexor longo do hálux Flexor curto do dedo mínimo Flexor longo dos dedos Extensão (B) Extensor longo do hálux Extensor longo dos dedos Extensor curto dos dedos Abdução (C) Abdutor do hálux Abdutor do dedo mínimo Interósseos dorsais Adução (D) Adutor do hálux Interósseos plantares Articulações interfalângicas Flexão (A) Flexor longo do hálux Flexor longo dos dedos Fexor curto dos dedos Quadrado plantar Extensão (B) Extensor longo do hálux Extensor longo dos dedos Extensor curto dos dedos aOs músculos em negrito são os principais responsáveis pelo movimento; os outros músculos são seus auxiliares. • • Figura 5.101 Ligamentos plantares. A e B. Estágios sequenciais de uma dissecção profunda da planta do pé direito mostrando as fixações dos ligamentos e os tendões dos músculos eversores e inversores longos. Ligamento plantar longo, que segue da face plantar do calcâneo até o sulco no cuboide. Algumas de suas fibras estendem-se até as bases dos metatarsais, formando, assim, um túnel para o tendão do músculo fibular longo (Figura 5.101A). O ligamento plantar longo é importante para manter o arco longitudinal do pé O ligamento calcaneocubóideo plantar, que está situado em um plano entre os ligamentos calcaneonavicular plantar e plantar longo (Figura 5.101B). Estende-se da face anterior da face inferior do calcâneo até a face inferior do cuboide. Também participa na manutenção do arco longitudinal do pé. ARCOS DO PÉ Se os pés fossem estruturas mais rígidas, cada impacto no solo produziria forças enormes de curta duração (choques) que seriam propagadas através do sistema esquelético. Como o pé é formado por muitos ossos unidos por ligamentos, tem considerável flexibilidade, o que permite sua deformação a cada contato com o solo e a absorção de grande parte do choque. Além disso, os ossos tarsais e metatarsais são dispostos em arcos longitudinais e transversos sustentados passivamente e contidos ativamente por tendões flexíveis que aumentam a capacidade de sustentação de peso e a resiliência do pé. Desse modo, forças musculares muito menores e de maior duração são transmitidas através do sistema esquelético. Os arcos distribuem o peso sobre o pé, agindo não apenas na absorção de choque, mas também como trampolins para impulsioná-lo durante a marcha, a corrida e o salto. Os arcos resilientes aumentam a capacidade do pé de se adaptar a alterações no contorno da superfície. O peso do corpo é transmitido da tíbia para o tálus. Então, é transmitido posteriormente ao calcâneo e anteriormente à “bola do pé” (os sesamoides do metatarsal I e a cabeça do metatarsal II), e o peso/pressão é • • 1. 2. 3. 4. • • • • compartilhado lateralmente com as cabeças dos 3 o a 5 o metatarsais quando necessário para equilíbrio e conforto (Figura 5.102). Entre esses pontos de sustentação de peso estão os arcos relativamente elásticos do pé, que são ligeiramente achatados pelo peso do corpo na posição de pé. Normalmente reassumem sua curvatura quando não estão sustentando o peso do corpo. O arco longitudinal do pé é formado pelas partes medial e lateral (Figura 5.103). Do ponto de vista funcional, as duas partes atuam como uma unidade com o arco transverso do pé, distribuindo o peso em todas as direções. O arco longitudinal medial é mais alto e mais importante do que o arco longitudinal lateral (Figura 5.103A e B). O arco longitudinal medial é formado pelo calcâneo, tálus, navicular, três cuneiformes e três metatarsais. A cabeça do tálus é o elemento principal do arco longitudinal medial. O músculo tibial anterior, que se fixa ao 1 o metatarsal e ao cuneiforme medial, ajuda a fortalecer o arco longitudinal medial. O tendão do músculo fibular longo, que segue da região lateral para a medial, também ajuda a sustentar esse arco (Figura 5.103C e E). O arco longitudinal lateral é muito mais plano do que a parte medial do arco e apoia-se no solo na posição de pé (Figura 5.103B e D). É formado pelo calcâneo, pelo cuboide e pelos dois metatarsais laterais. Figura 5.102 Áreas de sustentação de peso do pé. O peso do corpo é dividido de forma aproximadamente igual entre a parte posterior do pé (calcâneo) e a parte anterior do pé (cabeças dos metatarsais). A parte anterior do pé tem cinco pontos de contato com o solo: um ponto grande medial, que inclui os dois ossos sesamoides associados à cabeça do metatarsal I, e as cabeças dos quatro metatarsais laterais. O metatarsal I sustenta a maior parte do peso, e a região lateral da parte anterior proporciona equilíbrio. O arco transverso do pé segue de um lado ao outro (Figura 5.103C). É formado pelo cuboide, cuneiformes e bases dos metatarsais. As partes medial e lateral do arco longitudinal atuam como pilares para o arco transverso. Os tendões dos músculos fibular longo e tibial posterior, que cruzam sob a planta do pé como um estribo (Figura 5.103C), ajudam a manter a curvatura do arco transverso. A integridade dos arcos ósseos do pé é mantida por fatores passivos e suportes dinâmicos (Figura 5.103E). Os fatores passivos que participam da formação e manutenção dos arcos do pé são: O formato dos ossos unidos (os dois arcos, mas principalmente o arco transverso) Quatro camadas sucessivas de tecido fibroso que contêm o arco longitudinal (da região superficial para a profunda): Aponeurose plantar Ligamento plantar longo Ligamento calcaneocubóideo plantar Ligamento calcaneonavicular plantar. As sustentações dinâmicas que contribuem para a manutenção dos arcos do pé são: Ação de sustentação ativa (reflexa) dos músculos intrínsecos do pé (arco longitudinal) Contração ativa e tônica dos músculos com tendões longos que se estendem até o pé: Flexores longos do hálux e dos dedos para o arco longitudinal Fibular longo e tibial posterior para o arco transverso. Figura 5.103 Arcos do pé. A e B. O arco longitudinal medial é mais alto do que o arco longitudinal lateral, que pode tocar o solo na postura ereta. C. O arco transverso é mostrado no nível dos cuneiformes, recebendo sustentação, semelhante a um estribo, de um importante inversor (M. tibial posterior) e eversor (M. fibular longo). D. Componentes dos arcos longitudinais medial (cinzaescuro) e lateral (cinza-claro). O calcâneo (cinza-médio) é comum a ambos. O arco medial é o principal a sustentar o peso, enquanto o arco lateral propicia equilíbrio. E. Sustentações ativa (linhas vermelhas) e passiva (cinza) dos arcos longitudinais. Existem quatro camadas de sustentação passiva (1–4). Desses fatores, os ligamentos plantares e a aponeurose plantar suportam a maior tensão e são mais importantes na manutenção dos arcos do pé. Anatomia de superfície das articulações do joelho, talocrural e do pé A região do joelho está situada entre a coxa e a perna (Figura 5.104A). Acima dela estão as grandes saliências formadas pelos músculos vastos lateral e medial. Na região superolateral ao joelho está o trato iliotibial, que pode ser acompanhado em sentido inferior até o côndilo lateral da tíbia (tubérculo de Gerdy). A patela, que é palpada com facilidade e tem mobilidade lateral durante a extensão, situa-se anteriormente aos côndilos do fêmur (palpáveis de cada lado da patela). Estendendo-se a partir do ápice da patela, o ligamento da patela é facilmente visível, sobretudo em pessoas magras, como uma faixa espessa fixada na proeminente tuberosidade da tíbia. O plano da articulação do joelho, entre os côndilos do fêmur e o platô tibial, pode ser palpado de cada lado da junção do ápice da patela com o ligamento da patela quando o joelho está estendido. Na parte lateral, a cabeça da fíbula é facilmente localizada acompanhando-se o tendão do músculo bíceps femoral em sentido inferior. Esse tendão é bastante proeminente na posição de flexão parcial do joelho (Figura 5.104B). O ligamento colateral fibular pode ser palpado como uma estrutura semelhante a um cordão, superior à cabeça da fíbula e anterior ao tendão do músculo bíceps femoral, quando há flexão completa do joelho. As proeminências dos maléolos lateral e medial permitem determinar aproximadamente o eixo da articulação talocrural (Figura 5.104C a E). Quando o tornozelo está em posição de flexão plantar, a margem anterior da extremidade distal da tíbia é palpável proximal aos maléolos, indicando o plano da articulação talocrural. É mais fácil palpar o sustentáculo do tálus, situado cerca de 2 cm distal à extremidade do maléolo medial, por baixo, onde é um pouco encoberto pelo tendão do músculo flexor longo dos dedos, que o cruza. Na face lateral, quando o pé é invertido, a margem lateral da face anterior do calcâneo fica descoberta e é palpável. Isso indica o local da articulação calcaneocubóidea. Quando o pé encontra-se em flexão plantar, há exposição da cabeça do tálus. Palpe-a na região dorsal ao local onde é palpada a face anterior do calcâneo. O tendão do calcâneo na face posterior do tornozelo é facilmente palpado e acompanhado até sua fixação na tuberosidade do calcâneo. Na depressão de cada lado do tendão, a articulação talocrural é superficial. Quando a articulação está excessivamente cheia de líquido, essas depressões podem ser obliteradas. A articulação transversa do tarso é indicada por uma linha que vai da face posterior da tuberosidade do navicular até um ponto a meio caminho entre o maléolo lateral e a tuberosidade do quinto metatarsal. A articulação metatarsofalângica do hálux situa-se distal à protuberância formada pela cabeça do metatarsal I. A gota, um distúrbio metabólico, costuma causar edema e dor à palpação dessa articulação, assim como a osteoartrite (doença articular degenerativa). A dor intensa na 1 a articulação metatar-sofalângica é denominada podagra. Não raro, a 1 a articulação metatarsofalângica é a primeira afetada por artrite. Figura 5.104 Anatomia de superfície das articulações do joelho, da perna, do tornozelo e do pé. ARTICULAÇÕES DO MEMBRO INFERIOR Bipedalismo e congruência das superfícies articulares do quadril O acetábulo está voltado em direção inferior, lateral e anterior em seres humanos. A parte ilíaca do limbo do acetábulo, que sustenta o peso, situa-se sobre a cabeça do fêmur, o que é importante para transferência de peso para o fêmur na posição ereta (de pé/durante a marcha) (Figuras 5.77A e 5.79C). Por conseguinte, entre as posições habituais assumidas pelo ser humano, a estabilidade mecânica da articulação do quadril é maior quando a pessoa está sustentando peso, como ao levantar um objeto pesado, por exemplo. Diminuições no ângulo de superposição do ílio à cabeça do fêmur (detectados nas radiografias como o ângulo de Wiberg – Figura 5.79C e D) podem indicar instabilidade articular. Em razão da direção anterior do eixo do acetábulo e da direção posterior do eixo da cabeça e colo do fêmur quando se estende lateralmente (por causa do ângulo de torção – já discutido anteriormente), há um ângulo de 30 a 40° entre seus eixos (Figura B5.28). Logo, não há congruência total das superfícies articulares da cabeça e do acetábulo na postura ereta (bípede). A parte anterior da cabeça do fêmur é “exposta” e articula-se principalmente com a cápsula articular (Figuras 5.79C, 5.80, 5.81A e C e 5.84). Raramente mais de 40% da superfície articular disponível da cabeça do fêmur está em contato com a superfície do acetábulo em qualquer posição. Em relação a outras articulações e em vista do grande tamanho da articulação do quadril, esse contato é extenso, contribuindo bastante para a grande estabilidade da articulação. Fraturas do colo do fêmur As fraturas do colo do fêmur (infelizmente chamadas de “fraturas do quadril”, sugerindo que há fratura do osso do quadril) são raras na maioria dos esportes de contato, porque os participantes costumam ser jovens e o colo do fêmur é forte nas pessoas que têm menos de 40 anos. Quando ocorrem nessa faixa etária, geralmente são causadas por impactos fortes (p. ex., durante acidentes em corridas automobilísticas, com esqui, com trampolins e em eventos hípicos) quando o membro inferior é estendido e a força do impacto é transmitida à articulação do quadril, mesmo se aplicado a alguma distância da articulação. Por exemplo, se o pé estiver firmemente apoiado contra o assoalho do carro com o joelho travado, ou se o joelho estiver apoiado contra o painel durante uma colisão frontal, a força do impacto pode ser transmitida superiormente e causar a fratura do colo do fêmur. Essas fraturas são bastante comuns em indivíduos acima de 60 anos, sobretudo nas mulheres, porque os colos dos fêmures são mais fracos e se quebram com facilidade em virtude da osteoporose (Figura B5.29). Em geral, as fraturas do colo do fêmur são intracapsulares, e o realinhamento dos fragmentos do colo exige fixação óssea interna. As fraturas do colo do fêmur causam rotação lateral do membro inferior. Muitas vezes, essas fraturas interrompem a vascularização para a cabeça do fêmur. A maior parte do sangue para a cabeça e colo do fêmur provém da artéria circunflexa femoral medial (Figura 5.82). As artérias do retináculo originadas dessa artéria costumam se romper quando há fratura do colo do fêmur ou luxação da articulação do quadril. Após algumas fraturas do colo do fêmur, a artéria para o ligamento da cabeça do fêmur pode ser a única fonte remanescente de sangue para o fragmento proximal. Frequentemente, essa artéria é inadequada para manter a cabeça do fêmur; logo, o fragmento pode sofrer necrose vascular asséptica. Figura B5.28 Figura B5.29 Artroplastia do quadril Embora a articulação do quadril seja forte e estável, está sujeita a lesão traumática grave e doença degenerativa. A osteoartrite da articulação do quadril, caracterizada por dor, edema, limitação do movimento e erosão da cartilagem articular, é uma causa comum de incapacidade (Figura B5.30A). Durante a artroplastia do quadril, a cabeça e o colo do fêmur são substituídos por uma prótese metálica fixada ao fêmur por cimento ósseo (Figura B5.30B). Uma cavidade plástica cimentada ao osso do quadril substitui o acetábulo. Figura B5.30 Necrose da cabeça do fêmur em crianças Em crianças, as luxações traumáticas da articulação do quadril rompem a artéria para a cabeça do fêmur. As fraturas que resultam em separação da epífise superior do fêmur (a placa de crescimento entre a cabeça e o colo do fêmur) também tendem a resultar em vascularização inadequada para a cabeça do fêmur e em necrose avascular pós-traumática da cabeça do fêmur. Desse modo, há incongruência das superfícies articulares, e o crescimento na epífise é retardado. Esses distúrbios, mais comuns em crianças com 3 a 9 anos de idade, causam dor no quadril que pode se irradiar para o joelho. Luxação da articulação do quadril A luxação congênita da articulação do quadril é comum, e acomete aproximadamente 1,5 por 1.000 neonatos; é bilateral em cerca de metade dos casos. A incidência em meninas é no mínimo oito vezes maior do que em meninos (Salter, 1999). A luxação ocorre quando a cabeça do fêmur não está bem localizada no acetábulo. A incapacidade de abduzir a coxa é característica da luxação congênita. Além disso, o membro afetado parece (e funciona como se fosse) mais curto porque a cabeça do fêmur deslocada está situada mais alto do que no lado normal, resultando em um sinal de Trendelenburg positivo (o quadril parece cair de um lado durante a marcha). Cerca de 25% dos casos de artrite do quadril em adultos são consequência direta de defeitos residuais da luxação congênita do quadril. A luxação adquirida da articulação do quadril é rara porque essa articulação é muito forte e estável. Todavia, a luxação pode ocorrer durante um acidente automobilístico quando o quadril está em posição de flexão, adução e rotação medial, a posição habitual do membro inferior quando uma pessoa está guiando um veículo. As luxações posteriores da articulação do quadril são mais comuns. Uma colisão frontal que causa o choque do joelho contra o painel pode causar luxação do quadril quando a cabeça do fêmur é forçada a sair do acetábulo (Figura B5.31A). A cápsula articular se rompe nas partes inferior e posterior, a cabeça do fêmur atravessa a ruptura e passa sobre a margem posterior do acetábulo até a superfície lateral do ílio, com encurtamento e rotação medial do membro afetado (Figura B5.31B). Figura B5.31 Em vista de sua proximidade com a articulação do quadril (Figura 5.80A), o nervo isquiático pode ser lesado (estirado e/ou comprimido) durante luxações posteriores ou fraturas–luxações dessa articulação. Esse tipo de lesão pode resultar em paralisia dos músculos isquiáticos (do jarrete) e dos músculos distais ao joelho supridos pelo nervo isquiático. Também pode haver alterações sensitivas na pele sobre as faces posterolaterais da perna e sobre grande parte do pé em virtude da lesão dos ramos sensitivos do nervo isquiático. A luxação anterior da articulação do quadril resulta de uma lesão violenta que força a extensão, abdução e rotação lateral do quadril (p. ex., ao bater com a extremidade do esqui ao esquiar na neve). Nesses casos, a cabeça do fêmur situa-se inferiormente ao acetábulo. Com frequência, há fratura do limbo do acetábulo, com consequente fratura–luxação da articulação do quadril. A cabeça do fêmur, ao sofrer luxação, costuma levar consigo o fragmento ósseo do acetábulo e o lábio do acetábulo. Essas lesões também ocorrem nas luxações posteriores. Joelhos valgo e varo A posição do fêmur na coxa é diagonal, enquanto a posição da tíbia na perna é quase vertical, criando, no joelho, um ângulo entre os eixos longitudinais desses ossos (Figura B5.32A). O ângulo entre os dois ossos, clinicamente designado ângulo Q, é avaliado traçando-se uma linha que vai da EIAS até o meio da patela e uma segunda linha (vertical) que atravessa o meio da patela e a tuberosidade da tíbia (Figura 5.84). Normalmente, o ângulo Q é maior em mulheres adultas, porque suas pelves são mais largas. Quando normal, o ângulo do fêmur na coxa situa o meio da articulação do joelho diretamente inferior à cabeça do fêmur na posição de pé, centralizando a linha de sustentação de peso na região intercondilar do joelho (Figura B5.32A). A angulação medial da perna em relação à coxa, na qual o fêmur é anormalmente vertical e o ângulo Q é pequeno, é uma deformidade denominada joelho varo (pernas arqueadas) que acarreta a sustentação desigual do peso: a linha de sustentação de peso situa-se medialmente ao centro do joelho (Figura B5.32B). Há pressão excessiva sobre a face medial da articulação do joelho, o que resulta em artrose (destruição das cartilagens do joelho), e o ligamento colateral fibular é submetido à tensão exagerada (Figura B.32D). A angulação lateral da perna (ângulo Q grande, > 17°) em relação à coxa (exagero do ângulo do joelho) é chamada de joelho valgo (Figura B5.32C). Em virtude do ângulo exagerado do joelho no joelho valgo, a linha de sustentação de peso situa-se lateralmente ao centro do joelho. Assim, o ligamento colateral tibial é hiperdistendido e há tensão excessiva no menisco lateral e nas cartilagens dos côndilos laterais do fêmur e da tíbia. A patela, normalmente tracionada em sentido lateral pelo tendão do músculo vasto lateral, é puxada ainda mais para o lado quando a perna é estendida no joelho valgo, sendo sua articulação com o fêmur anormal. Muitas vezes as crianças parecem ter joelho varo por 1 a 2 anos depois que começam a andar, sendo o joelho valgo frequente nas crianças com 2 a 4 anos de idade. A persistência desses ângulos anormais do joelho no final da infância geralmente é um sinal de deformidades congênitas, que podem exigir correção. Qualquer irregularidade de uma articulação acaba por levar ao desgaste (artrose) das cartilagens articulares e a alterações articulares degenerativas (osteoartrite [artrose]). Luxação da patela A luxação da patela é quase sempre lateral. É mais comum em mulheres, provavelmente por causa do maior ângulo Q, que, além de representar a posição oblíqua do fêmur em relação à tíbia, representa o ângulo de tração do músculo quadríceps femoral em relação ao eixo da patela e da tíbia (o termo ângulo Q foi cunhado como referência ao ângulo de tração do músculo quadríceps femoral). A tendência à luxação lateral normalmente é neutralizada pela tração medial e mais horizontal do poderoso músculo vasto medial. Além disso, a projeção anterior do côndilo lateral do fêmur e a inclinação mais profunda para a face patelar lateral maior constituem um impedimento mecânico à luxação lateral. Um desequilíbrio da tração lateral e os mecanismos que resistem a ela resultam em trajeto anormal da patela na face patelar e dor patelar crônica, mesmo quando não há luxação real. Figura B5.32 Síndrome patelofemoral A dor profundamente à patela costuma ser causada pela corrida excessiva, principalmente em declives; portanto, esse tipo de dor costuma ser chamado de “joelho do corredor”. A dor é causada por microtraumatismos repetitivos provocados pelo trajeto anormal da patela em relação à face patelar do fêmur, um distúrbio conhecido como síndrome patelofemoral. Essa síndrome também pode resultar de um golpe direto na patela e de osteoartrite do compartimento patelofemoral (desgaste degenerativo das cartilagens articulares). Em alguns casos, o fortalecimento do músculo vasto medial corrige a disfunção patelofemoral. Esse músculo tende a evitar a luxação lateral da patela resultante do ângulo Q, porque o vasto medial se fixa na margem medial da patela e a traciona. Desse modo, a fraqueza do músculo vasto medial predispõe o indivíduo à disfunção patelofemoral e à luxação da patela. Lesões da articulação do joelho As lesões do joelho são comuns porque essa é uma articulação baixa, móvel, que sustenta peso e serve como fulcro entre duas alavancas longas (coxa e perna). Sua estabilidade depende quase totalmente dos ligamentos associados e dos músculos adjacentes. A articulação do joelho é essencial para atividades diárias como ficar de pé, caminhar e subir escadas. Também é uma articulação importante nos esportes que incluem corrida, salto, chute e mudanças de direção. Para realizar essas atividades, a articulação do joelho deve ser móvel; entretanto, sua mobilidade a torna suscetível a lesões. A lesão mais comum do joelho em esportes de contato é a distensão dos ligamentos, que ocorrem quando o pé está fixo no solo (Figura B5.33A). A aplicação de uma força contra o joelho quando o pé estiver impedido de se mover tende a causar lesões dos ligamentos. Os ligamentos colaterais tibial e fibular (LCT e LCF) são muito estirados quando a perna é estendida, o que normalmente impede a ruptura das partes laterais da articulação do joelho. A firme fixação do LCT no menisco medial tem grande significado clínico, pois a ruptura desse ligamento costuma resultar em ruptura concomitante do menisco medial. Com frequência, a lesão é causada por um golpe na face lateral do joelho estendido ou por torção lateral excessiva do joelho fletido que rompe o LCT e, ao mesmo tempo, rompe e/ou separa o menisco medial da cápsula articular (Figura B5.33A). Essa lesão é comum em atletas que torcem os joelhos fletidos durante a corrida (p. ex., no basquetebol, nas várias formas de futebol e no voleibol). O LCA, que serve como eixo para movimentos giratórios do joelho e é tensionado durante a flexão, também pode se romper depois da ruptura do LCT, criando uma “tríade infeliz” de lesões do joelho. Figura B5.33 A hiperextensão e a grande força anterior contra o fêmur com o joelho semifletido (p. ex., um bloqueio cruzado no futebol americano) podem romper o LCA. A ruptura do LCA também é uma lesão comum do joelho em acidentes com esqui. Essa lesão causa o deslizamento anterior da tíbia livre sob o fêmur fixado, conhecido como sinal da gaveta anterior (Figura B5.33B), avaliado clinicamente pelo teste de Lachman. O LCA pode ser arrancado do fêmur ou da tíbia; entretanto, as rupturas costumam ocorrer na parte média do ligamento. Embora forte, o LCP pode se romper quando um jogador cai sobre a tuberosidade da tíbia com o joelho fletido (p. ex., ao cair de joelhos no chão em um jogo de basquetebol). As rupturas do LCP geralmente estão associadas a rupturas do ligamento tibial ou fibular. Essas lesões também podem ocorrer em colisões frontais quando a pessoa não usa cinto de segurança e a extremidade proximal da tíbia se choca contra o painel. As rupturas do LCP permitem que a tíbia livre deslize posteriormente sob o fêmur fixado, conhecido como sinal da gaveta posterior (Figura B5.33C). As rupturas do menisco costumam acometer o menisco medial. O menisco lateral geralmente não se rompe graças à sua mobilidade. A dor causada pela rotação lateral da tíbia sobre o fêmur indica lesão do menisco lateral (Figura B5.34A), enquanto a dor à rotação medial da tíbia sobre o fêmur indica lesão do menisco medial (Figura B5.34B). A maioria das rupturas do menisco ocorre em conjunto com as rupturas do LCT ou LCA. As rupturas periféricas do menisco costumam ser reparadas ou podem cicatrizar sozinhas em razão da generosa vascularização dessa área. Se as rupturas do menisco que não cicatrizarem ou não puderem ser reparadas, o menisco é retirado (p. ex., por cirurgia artroscópica). As articulações do joelho que tiveram um menisco removido não apresentam perda da mobilidade; entretanto, o joelho pode ser menos estável e os platôs tibiais costumam sofrer reações inflamatórias. Figura B5.34 Artroscopia do joelho A artroscopia é um exame endoscópico que permite visualização do interior da cavidade articular do joelho e provoca ruptura tecidual mínima (Figura B5.35). O artroscópio e uma (ou mais) cânula(s) adicionais são inseridos através de incisões bem pequenas, conhecidas como portais. A segunda cânula destina-se à introdução de instrumentos especializados (p. ex., sondas ou pinças de manipulação) ou equipamento para aparar, moldar ou remover tecido danificado. Essa técnica permite a retirada de meniscos lacerados, corpos livres na articulação (como fragmentos ósseos) e desbridamento (a excisão de material cartilaginoso articular desvitalizado) em casos avançados de artrite. O reparo ou a substituição de ligamentos também podem ser feitos por artroscopia. Embora a anestesia geral seja preferível na maioria das vezes, a artroscopia do joelho pode ser feita sob anestesia local ou regional. Durante a artroscopia, deve-se tratar a cavidade articular do joelho basicamente como duas articulações femorotibiais diferentes (medial e lateral) em razão da imposição da prega sinovial ao redor dos ligamentos cruzados. Aspiração do joelho As fraturas da extremidade distal do fêmur ou as lacerações do compartimento anterior da coxa podem incluir a bolsa suprapatelar e acarretar infecção da articulação do joelho. A infecção e a inflamação da articulação do joelho podem causar aumento da quantidade de líquido sinovial. Os derrames articulares, a saída de líquido dos vasos sanguíneos ou linfáticos, aumentam o volume de líquido na cavidade articular. Como a bolsa suprapatelar comunica-se livremente com a cavidade sinovial da articulação do joelho, a distensão da coxa na região da bolsa suprapatelar pode indicar aumento do líquido sinovial. Essa bolsa pode ser aspirada para retirar o líquido para exame. A aspiração direta da articulação do joelho geralmente é feita com o paciente sentado sobre uma mesa e com o joelho fletido. O acesso à articulação é feito lateralmente, usando-se três pontos ósseos como pontos de referência para introdução da agulha: o tubérculo anterolateral do côndilo lateral da tíbia (tubérculo de Gerdy), o epicôndilo lateral do fêmur e o ápice da patela. Além de ser a via para aspiração de líquido seroso e sanguíneo, essa área triangular também serve para injeção de medicamentos no tratamento de doenças da articulação do joelho. Figura B5.35 Bursite na região do joelho A bursite pré-patelar é causada por atrito entre a pele e a patela; entretanto, a bolsa também pode ser lesada por forças compressivas resultantes de um golpe direto ou por queda sobre o joelho fletido. Se a inflamação for crônica, a bolsa é distendida por líquido e surge um edema anterior ao joelho. Esse distúrbio foi chamado de “joelho de faxineira” (Figura B5.36); entretanto, outras pessoas que trabalham ajoelhadas sem proteção, como instaladores de pisos de madeira e tapete, também podem desenvolver bursite pré-patelar. Figura B5.36 A bursite subcutânea infrapatelar é causada por atrito excessivo entre a pele e a tuberosidade da tíbia; o edema ocorre sobre a extremidade proximal da tíbia. O distúrbio era chamado de “joelho de padre” devido à frequente genuflexão; entretanto, é mais comum em telhadores e ladrilheiros que não usam protetores no joelho. A bursite infrapatelar profunda provoca edema entre o ligamento da patela e a tíbia, superior à tuberosidade da tíbia. A inflamação geralmente é causada pelo uso excessivo e subsequente atrito entre o tendão da patela e as estruturas posteriores a ele, o corpo adiposo infrapatelar e a tíbia (Anderson et al., 2000). O aumento da bolsa infrapatelar profunda oblitera as depressões que normalmente ocorrem de cada lado do ligamento da patela quando a perna é estendida (ver Figura 5.104A). Escoriações ou feridas penetrantes podem ocasionar bursite suprapatelar, uma infecção causada por bactérias que entram na bolsa suprapatelar pela ruptura da pele (ver Figura 5.94A). A infecção pode disseminar-se para a cavidade da articulação do joelho, causando eritema localizado e aumento dos linfonodos poplíteos e inguinais. Cistos poplíteos Os cistos poplíteos (cistos de Baker) são sacos anormais, cheios de líquido, da membrana sinovial na região da fossa poplítea. Um cisto poplíteo é quase sempre uma complicação do derrame articular crônico do joelho. O cisto pode ser uma herniação da bolsa dos músculos gastrocnêmio ou semimembranáceo através da camada fibrosa da cápsula articular para a fossa poplítea, comunicando-se com a cavidade sinovial da articulação do joelho por um estreito pedículo (Figura B5.37). O líquido sinovial também pode escapar da articulação do joelho (derrame sinovial) ou de uma bolsa ao redor do joelho e acumular-se na fossa poplítea. Aí forma um novo saco revestido por sinóvia, ou cisto poplíteo. Os cistos poplíteos são comuns em crianças, mas raramente causam sintomas. Em adultos, os cistos poplíteos podem ser grandes, estendendo-se até a região média da panturrilha, e podem interferir com os movimentos do joelho. Substituição do joelho Um joelho doente, com osteoartrite, por exemplo, pode ser substituído por uma prótese (artroplastia total do joelho) (Figura B5.38). A articulação artificial do joelho consiste em componentes plásticos e metálicos cimentados às extremidades ósseas femoral e tibial após a remoção das áreas defeituosas. A associação de metal e plástico imita o deslizamento da cartilagem sobre cartilagem e produz bons resultados em pessoas com “baixa demanda” que tenham um estilo de vida relativamente sedentário. Em pessoas de “alta demanda”, praticantes de esportes, as junções entre osso e cimento podem se romper, e os componentes artificiais do joelho podem se soltar; mas aperfeiçoamentos da bioengenharia e da técnica cirúrgica garantiram melhores resultados. Figura B5.37 Figura B5.38 Lesões do tornozelo O tornozelo é a grande articulação do corpo lesada com maior frequência. As entorses do tornozelo (ruptura de fibras dos ligamentos) são mais comuns. A entorse do tornozelo é quase sempre uma lesão por inversão, que inclui a rotação do pé em flexão plantar e sustentando peso. A pessoa pisa em uma superfície irregular e o pé é invertido à força. As entorses do ligamento lateral ocorrem em esportes de corrida e salto, sobretudo no basquete (70 a 80% dos jogadores já sofreram no mínimo uma entorse do tornozelo). O ligamento lateral é lesado porque é muito mais fraco do que o ligamento medial e é o ligamento que resiste à inversão na articulação talocrural. O ligamento talofibular anterior – parte do ligamento lateral – é mais vulnerável e se rompe, parcial ou completamente, com maior frequência durante entorses do tornozelo, resultando em instabilidade dessa articulação (Figura B5.39). O ligamento calcaneofibular também pode se romper. Em entorses graves, pode também haver fratura do maléolo lateral da fíbula. As lesões por cisalhamento fraturam o maléolo lateral na articulação talocrural ou superiormente a ela. As fraturas por avulsão rompem o maléolo inferiormente à articulação talocrural; um fragmento de osso é arrancado pelo(s) ligamento(s) fixado(s). A fratura–luxação do tornozelo de Pott ocorre quando o pé é evertido à força (Figura B5.40). Essa ação traciona o ligamento medial, que é extremamente forte, e muitas vezes rompe o maléolo medial. O tálus então se desloca lateralmente, arrancando o maléolo lateral ou, na maioria das vezes, fraturando a fíbula superiormente à sindesmose tibiofibular. Se a tíbia for levada anteriormente, a margem posterior da extremidade distal da tíbia também é arrancada pelo tálus, produzindo uma “fratura trimaleolar”. Ao aplicar esse termo à lesão desse tipo, toda a extremidade distal da tíbia é erroneamente considerada um “maléolo”. Compressão do nervo tibial O nervo tibial deixa o compartimento posterior da perna passando profundamente ao retináculo dos músculos flexores no espaço entre o maléolo medial e o calcâneo (Figura 5.71A). O aprisionamento e a compressão do nervo tibial (síndrome do túnel do tarso) ocorrem quando há edema e constrição no tornozelo envolvendo as bainhas sinoviais dos tendões dos músculos no compartimento posterior da perna. A área acometida vai do maléolo medial até o calcâneo, e a dor no calcanhar resulta da compressão do nervo tibial pelo da pele, no local onde a superfície dorsal do dedo sofre atrito retináculo dos músculos flexores. contínuo do calçado. Figura B5.39 Figura B5.40 Hálux valgo O hálux valgo é uma deformidade do pé causada por pressão do calçado e doença articular degenerativa; é caracterizado por desvio lateral do hálux (Figura B5.41). O L na palavra valgo indica desvio lateral. Em algumas pessoas, o desvio doloroso é tão grande que o hálux superpõe-se ao 2 o dedo (Figura B5.41A), e há diminuição do arco longitudinal medial. Esse desvio ocorre principalmente em mulheres, e sua frequência aumenta com a idade. Essas pessoas não conseguem afastar o hálux do 2 o dedo porque, em geral, há deslocamento dos ossos sesamoides situados sob a cabeça do 1 o metatarsal para o espaço entre as cabeças do 1 o e 2 o metatarsais (Figura B5.41B). O 1 o metatarsal sofre desvio medial e os sesamoides, lateral. Muitas vezes, há edema dos tecidos adjacentes e a pressão e o atrito resultantes contra o sapato causam a formação de uma bolsa subcutânea; quando dolorosa e inflamada, a bolsa é denominada joanete (Figura B5.41A). Amiúde, também se formam calosidades duras (áreas inflamadas de pele espessa) sobre as articulações interfalângicas proximais, sobretudo do dedo mínimo. Dedos em martelo O dedo em martelo é uma deformidade do pé na qual a falange proximal encontra-se em dorsiflexão permanente e acentuada (hiperextensão) na articulação metatarsofalângica e a falange média apresenta-se em flexão plantar forte na articulação interfalângica proximal. Também é frequente a hiperextensão da falange distal do dedo. Isso confere ao dedo (geralmente o 2 o) uma aparência de martelo (Figura B5.42A). Essa deformidade de um ou mais dedos pode ser causada pela fraqueza dos músculos lumbricais e interósseos, que fletem as articulações metatarsofalângicas e estendem as articulações interfalângicas. Muitas vezes forma-se uma calosidade ou calo, espessamento rígido da camada de queratina da pele, no local onde a superfície dorsal do dedo sofre atrito contínuo do calçado. Dedos em garra Os dedos em garra são caracterizados por hiperextensão das articulações metatarsofalângicas e flexão das articulações interfalângicas distais (Figura B5.42B). Em geral, há participação dos quatro dedos laterais. Calosidades se formam nas superfícies dorsais dos dedos por causa da pressão do sapato. Também podem se formar calosidades nas superfícies plantares das cabeças dos metatarsais e nas pontas dos dedos porque sustentam peso adicional no caso de dedos em garra. Pé plano A aparência plana da sola do pé antes dos 3 anos de idade é normal e é causada pela espessa camada de gordura subcutânea na planta do pé. À medida que as crianças crescem, há perda da gordura, e pode-se ver um arco longitudinal medial normal (Figura B5.42C). Os pés planos podem ser flexíveis (planos, sem arco medial, ao sustentar peso, mas têm aparência normal quando não estão sustentando peso [Figura B5.42D]) ou rígidos (planos mesmo quando não estão sustentando peso). Os pés planos flexíveis, mais comuns, são causados por frouxidão ou degeneração dos ligamentos intrínsecos (sustentação passiva inadequada do arco). O pé plano flexível é comum na infância, mas costuma desaparecer com a idade à medida que os ligamentos se desenvolvem e amadurecem. Às vezes o distúrbio persiste na vida adulta e pode ou não ser sintomático. Os pés planos rígidos desde a infância tendem a ser causados por deformidade óssea (como a fusão de ossos tarsais adjacentes). Os pés planos adquiridos provavelmente são secundários à disfunção do músculo tibial posterior (suporte dinâmico do arco) decorrente de traumatismo, degeneração com a idade ou desnervação. Na ausência de suporte passivo ou dinâmico normal, o ligamento calcaneonavicular plantar não sustenta a cabeça do tálus. Assim, há deslocamento inferomedial da cabeça do tálus, que se torna proeminente (Figura B5.42D, setas vermelhas). A consequência é o achatamento parcial da parte medial do arco longitudinal, juntamente com desvio lateral da parte anterior do pé. Os pés planos são comuns em pessoas idosas, sobretudo se ficarem de pé por muito tempo sem que estejam acostumadas ou se ganharem peso rapidamente, aumentando o estresse sobre os músculos e a tensão sobre os ligamentos que sustentam os arcos. Figura B5.41 Figura B5.42 Pé torto equinovaro O pé torto é a torção anormal do pé. Dos vários tipos, todos são congênitos (presentes ao nascimento). O pé torto equinovaro, o tipo comum (2 por 1.000 neonatos), acomete a articulação talocalcânea; os meninos são afetados com frequência duas vezes maior do que as meninas. Há inversão do pé, flexão plantar do tornozelo e adução da parte anterior do pé (voltada em direção à linha mediana de forma anormal) (Figura B5.43A). O pé assume a posição de um casco de cavalo, daí o prefixo “equino”. Na metade das pessoas afetadas, há malformação dos dois pés. Uma pessoa com pé torto não corrigido não consegue colocar o calcanhar e a planta do pé planos e sustenta o peso com a superfície lateral da parte anterior do pé. Por isso, a marcha é dolorosa. A principal anormalidade é o encurtamento e a contração dos músculos, tendões, ligamentos e cápsulas articulares na face medial e na face posterior do pé e do tornozelo (Figura B5.43B). Figura B5.43 Pontos-chave ARTICULAÇÕES DO MEMBRO INFERIOR Articulação do quadril: A articulação do quadril é a articulação mais forte e mais estável. ♦ Essa estabilidade resulta (1) da força mecânica de sua arquitetura em esfera e cavidade (profunda), que permite extenso contato da face articular; (2) da sua forte cápsula articular; e (3) dos seus muitos músculos adjacentes. ♦ Mas ainda é vulnerável, sobretudo na idade avançada, por causa do ângulo do colo do fêmur (inclinação) e da íntima associação entre a vascularização da cabeça do fêmur e o colo. Desse modo, as fraturas resultam em necrose avascular da cabeça do fêmur. ♦ Os principais movimentos são flexão e extensão, possíveis em uma grande amplitude; rotação medial e lateral com abdução fazem parte de cada passo da marcha bípede normal. Articulação do joelho: O joelho é uma articulação do tipo gínglimo com uma grande amplitude de movimento (basicamente flexão e extensão, sendo a rotação permitida com a flexão progressiva). ♦ É a articulação mais vulnerável em razão das faces articulares incongruentes e da desvantagem mecânica acarretada pela sustentação de peso mais impulso, ao mesmo tempo que serve como fulcro entre duas longas alavancas. ♦ A compensação é tentada de várias formas, inclusive (1) fortes ligamentos intrínsecos, extracapsulares e intracapsulares; (2) imobilização por muitos tendões adjacentes (inclusive o trato iliotibial); e (3) meniscos que ocupam o espaço vazio, propiciando mobilidade das faces articulares. ♦ As estruturas que têm maior importância clínica são (1) os ligamentos colaterais, que são tensionados durante (e limitam) a extensão e relaxados durante a flexão, permitindo a rotação, durante a qual atuam como ligamentos de contenção; (2) os ligamentos cruzados que mantêm a articulação durante a flexão, garantindo o eixo para rotação; e (3) o menisco medial que está fixado ao ligamento colateral tibial e é lesado com frequência por causa dessa fixação. Articulações tibiofibulares: As articulações tibiofibulares incluem uma articulação sinovial proximal, uma membrana interóssea e uma sindesmose tibiofibular distal, que consiste nos ligamentos tibiofibulares anterior, interósseo e posterior. ♦ Juntas, essas articulações constituem um sistema compensatório que permite um pequeno movimento superior da fíbula em razão da expansão transversal forçada do encaixe maleolar durante a dorsiflexão máxima do tornozelo. ♦ Todas as conexões tibiofibulares fibrosas descem da tíbia para a fíbula, permitindo esse pequeno movimento para cima enquanto resistem fortemente à tração descendente aplicada à fíbula pela contração de oito dos nove músculos fixados a ela. Articulação talocrural: A articulação talocrural é composta de um encaixe superior, formado pela face inferior com sustentação de peso da tíbia e os dois maléolos, que recebem a tróclea do tálus. ♦ A articulação é mantida medialmente por um ligamento medial forte (deltóideo) e um ligamento lateral, muito mais fraco. ♦ O ligamento lateral (especificamente seu componente talofibular anterior) é o ligamento do corpo lesado com maior frequência. ♦ A lesão ocorre principalmente por inversão inadvertida do pé que sustenta o peso, em flexão plantar. ♦ É possível realizar cerca de 70° de dorsiflexão e flexão plantar na articulação, além dos quais pode haver pequenos graus de balanço na posição de flexão plantar menos estável. Articulações do pé: Do ponto de vista funcional, o pé tem três articulações compostas; (1) a articulação talocalcânea clínica, entre o tálus e o calcâneo, onde ocorrem inversão e eversão em torno de um eixo oblíquo; (2) a articulação transversa do tarso, onde o mediopé e o antepé giram como uma unidade sobre o retropé ao redor de um eixo longitudinal, aumentando a inversão e a eversão; e (3) as demais articulações do pé, que permitem que o pé forme os arcos longitudinal e transversos dinâmicos. ♦ Os arcos garantem a resiliência necessária para a marcha, corrida e salto, e são mantidos por quatro camadas de suporte passivo fibroso mais o suporte dinâmico propiciado pelos músculos intrínsecos do pé e os tendões dos músculos fibular longo, tibial e flexores.

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