quinta-feira, 3 de maio de 2018

Drenagem linfática das vísceras pélvicas

Os vasos linfáticos da pelve, em sua maior parte, acompanham o sistema venoso, seguindo as tributárias da veia ilíaca interna até os linfonodos ilíacos internos, diretamente ou por intermédio dos linfonodos sacrais (Figura 3.48). No entanto, as estruturas localizadas superiormente na parte anterior da pelve drenam para os linfonodos ilíacos externos, uma via linfática que não é paralela à drenagem venosa. A linfa dos linfonodos ilíacos externos e internos flui através dos linfonodos ilíacos comuns e lombares (cavais/aórticos), drenando através dos troncos linfáticos lombares para a cisterna do quilo. DRENAGEM LINFÁTICA DO SISTEMA URINÁRIO A porção superior da parte pélvica dos ureteres drena principalmente para os linfonodos ilíacos externos, enquanto a porção inferior drena para os linfonodos ilíacos internos (Figura 3.48A; Quadro 3.7). Os vasos linfáticos das faces superolaterais da bexiga urinária seguem até os linfonodos ilíacos externos, enquanto aqueles do fundo e do colo da bexiga seguem até os linfonodos ilíacos internos. Alguns vasos do colo da bexiga drenam para os linfonodos sacrais ou ilíacos comuns. A maioria dos vasos linfáticos da uretra feminina e da parte proximal da uretra masculina segue até os linfonodos ilíacos internos. No entanto, alguns vasos da uretra feminina também drenam para os linfonodos sacrais e, da porção distal da uretra feminina, para os linfonodos inguinais. DRENAGEM LINFÁTICA DO RETO Os vasos linfáticos da porção superior do reto seguem até os linfonodos mesentéricos inferiores e, no caminho, muitos deles passam pelos linfonodos pararretais (situados diretamente sobre a camada muscular do reto) e/ou linfonodos sacrais (Figura 3.48B; Quadro 3.7). Os linfonodos mesentéricos inferiores drenam para os linfonodos lombares (cavais/aórticos). Os vasos linfáticos da metade inferior do reto drenam diretamente para os linfonodos sacrais ou, sobretudo os da ampola distal, acompanham os vasos retais médios e drenam para os linfonodos ilíacos internos. DRENAGEM LINFÁTICA DAS VÍSCERAS PÉLVICAS MASCULINAS Os vasos linfáticos dos ductos deferentes, ductos ejaculatórios e partes inferiores das glândulas seminais drenam para os linfonodos ilíacos externos (Figura 3.48C; Quadro 3.7). Os vasos linfáticos das partes superiores das glândulas seminais e da próstata terminam principalmente nos linfonodos ilíacos internos, mas parte da drenagem destes últimos segue para os linfonodos sacrais. DRENAGEM LINFÁTICA DAS VÍSCERAS PÉLVICAS FEMININAS Os vasos linfáticos dos ovários, unidos aos vasos das tubas uterinas e à maioria dos vasos do fundo do útero, seguem as veias ováricas enquanto ascendem para os linfonodos lombares (cavais/aórticos) direitos e esquerdos (Figura 3.48D; Quadro 3.7). Figura 3.48 Drenagem linfática das vísceras pélvicas. Quadro 3.7 Drenagem linfática das estruturas da pelve e do períneo. Grupo de linfonodos Estruturas que costumam drenar para o grupo de linfonodos Lombar Mulher: ao longo dos vasos ováricos Gônadas e estruturas associadas; linfonodos ilíacos comuns Mulher: ovário; tuba uterina (exceto istmo e partes intrauterinas); fundo do útero Homem: ao longo dos vasos testiculares Uretra masculina: testículo; epidídimo Mesentérico inferior Parte superior do reto; colo sigmoide; colo descendente; linfonodos pararretais Ilíaco comum Linfonodos ilíacos externos e internos Ilíaco interno Estruturas pélvicas inferiores; estruturas profundas do períneo; linfonodos sacrais Mulher: base da bexiga urinária; região inferior da parte pélvica do ureter; canal anal (acima da linha pectinada); parte inferior do reto; partes média e superior da vagina; colo do útero; corpo do útero Homem: parte prostática da uretra; próstata; base da bexiga urinária; região inferior da parte pélvica do ureter; porção inferior das glândulas seminais; corpos cavernosos; canal anal (acima da linha pectinada); parte inferior do reto Ilíaco externo Estruturas anterossuperiores da pelve; linfonodos inguinais profundos Mulher: parte superior da bexiga urinária; região superior da parte pélvica do ureter; parte superior da vagina; colo do útero; parte inferior do corpo do útero Homem: parte superior da bexiga urinária; região superior da parte pélvica do ureter; parte superior da glândula seminal; parte pélvica do ducto deferente; partes membranácea e esponjosa da uretra (secundária) Inguinal superficial Membro inferior; drenagem superficial do quadrante inferolateral do tronco, incluindo a parede abdominal anterior inferior ao umbigo, região glútea e estruturas superficiais do períneo Mulher: parte superolateral do útero (perto da fixação do ligamento redondo); pele do períneo incluindo o pudendo; óstio da vagina (inferior ao hímen); prepúcio do clitóris; pele perianal; canal anal inferior à linha pectinada Homem: pele do períneo, incluindo a pele e o prepúcio do pênis; escroto; pele perianal; canal anal inferior à linha pectinada Inguinal profundo Glande do clitóris ou pênis; linfonodos inguinais superficiais Mulher: glande do clitóris Homem: glande do pênis; região distal da parte esponjosa da uretra Sacral Estruturas pélvicas posteroinferiores: parte inferior do reto; parte inferior da • • • • • • • vagina Pararretal Parte superior do reto Figura 3.49 A fáscia inferior do diafragma da pelve (M. levantador do ânus) é a fronteira que separa a pelve do períneo. Os vasos linfáticos do útero drenam em muitas direções, seguindo junto com os vasos sanguíneos que irrigam o órgão e também com os ligamentos fixados a ele: A maioria dos vasos linfáticos do fundo e da parte superior do corpo do útero segue ao longo dos vasos ováricos até os linfonodos lombares (cavais/aórticos); mas alguns vasos do fundo do útero, sobretudo aqueles próximos da entrada das tubas uterinas e fixações dos ligamentos redondos, seguem ao longo do ligamento redondo do útero até os linfonodos inguinais superficiais Os vasos da maior parte do corpo do útero e alguns do colo seguem dentro do ligamento largo até os linfonodos ilíacos externos Os vasos do colo do útero também seguem ao longo dos vasos uterinos, dentro dos ligamentos transversos do colo, até os linfonodos ilíacos internos, e ao longo dos ligamentos retouterinos (uterossacrais) até os linfonodos sacrais. Os vasos linfáticos da vagina drenam as partes da vagina da seguinte forma: Parte superior: para os linfonodos ilíacos internos e externos Parte média: para os linfonodos ilíacos internos Parte inferior: para os linfonodos ilíacos sacrais e comuns (Figura 3.48; Quadro 3.7) Óstio: para os linfonodos inguinais superficiais. • • • • • • • • • PERÍNEO O períneo é um compartimento pouco profundo do corpo (compartimento do períneo) limitado pela abertura inferior da pelve e separado da cavidade pélvica pela fáscia que reveste a face inferior do diafragma da pelve, formado pelos músculos levantador do ânus e isquiococcígeo (Figura 3.49). Na posição anatômica, a superfície do períneo — a região perineal — é a região estreita entre as partes proximais das coxas; entretanto, quando os membros inferiores são abduzidos, é uma área romboide que se estende do monte do púbis anteriormente em mulheres, das faces mediais (internas) das coxas lateralmente, e as pregas glúteas e a extremidade superior da fenda interglútea posteriormente (Figura 3.50). Figura 3.50 Regiões perineais masculina e feminina. Limites e pontos de referência superficiais da região perineal com projeções dos limites ósseos e dos músculos superficiais do períneo. O pênis e parte do escroto (parte da região perineal) foram rebatidos anteriormente e, portanto, não são mostrados. As estruturas osteofibrosas que marcam os limites do períneo (compartimento do períneo) (Figura 3.51A e B) são: Sínfise púbica, anteriormente Ramos isquiopúbicos (ramos inferiores do púbis e ramos do ísquio associados), anterolateralmente Túberes isquiáticos, lateralmente Ligamentos sacrotuberais, posterolateralmente Parte inferior do sacro e cóccix, posteriormente. Uma linha transversal que une as extremidades anteriores dos túberes isquiáticos divide o períneo romboide em dois triângulos, cujos planos oblíquos se cruzam na linha transversal (Figura 3.51B e C). A região anal situa-se posteriormente a essa linha. O canal anal e seu orifício, o ânus, são os principais pontos de referência profundo e superficial do triângulo, situados no centro e circundados pelo corpo adiposo isquioanal. A região urogenital (UG) situa-se anteriormente a esta linha. Ao contrário da região anal, aberta, a região UG é “fechada” por uma fina lâmina de fáscia profunda e resistente, a membrana do períneo, que se estende entre os dois lados do arco púbico, cobrindo a parte anterior da abertura inferior da pelve (Figura 3.52C). Assim, a membrana do períneo ocupa a abertura anterior no diafragma da pelve (o hiato urogenital, Figura 3.52A), mas é perfurada pela uretra em ambos os sexos e pela vagina na mulher. A membrana e os ramos isquiopúbicos aos quais se fixa proporcionam uma base para os corpos eréteis dos órgãos genitais externos — o pênis e escroto dos homens e o pudendo das mulheres — que são as características superficiais da região (Figura 3.50). O ponto médio da linha que une os túberes isquiáticos é o ponto central do períneo. Essa é a localização do corpo do períneo, que é uma massa irregular, com tamanho e consistência variáveis, e que contém fibras colágenas e elásticas, músculo esquelético e liso (Figura 3.52E). O corpo do períneo situa-se profundamente à pele, com relativamente pouco tecido subcutâneo sobrejacente, posteriormente ao vestíbulo da vagina ou bulbo do pênis e anteriormente ao ânus e canal anal. O corpo do períneo é o local de convergência e entrelaçamento de fibras de vários músculos, inclusive: M. bulboesponjoso M. esfíncter externo do ânus Músculos transversos superficial e profundo do períneo. Alças lisas e voluntárias dos músculos esfíncter externo da uretra e levantador do ânus e túnicas musculares do reto. Figura 3.51 Limites e disposição do períneo. A. Cíngulo do membro inferior mostrando pontos de referência ósseos que limitam o períneo. Os dois triângulos que formam o períneo romboide são superpostos. B. São identificadas as estruturas osteofibrosas que limitam a abertura inferior da pelve e o períneo. Esta vista da pelve feminina é a que têm os obstetras quando a paciente está na mesa de exame. C. A região anal e a região urogenital que compõem o períneo não ocupam o mesmo plano. O plano entre a bexiga urinária e o reto é ocupado pelos órgãos genitais internos e por um septo formado durante o desenvolvimento embrionário quando o seio urogenital foi dividido em bexiga urinária e uretra anteriormente e anorreto posteriormente. Figura 3.52 Camadas dos períneos masculino e feminino. As camadas do períneo são mostradas da mais profunda (A) para a mais superficial (E). A. A abertura inferior da pelve é quase fechada pelo diafragma da pelve (músculos levantador do ânus e isquiococcígeo), formando o assoalho da cavidade pélvica e, como visto aqui, o teto do períneo. A uretra (e a vagina nas mulheres) e o reto atravessam o hiato urogenital do diafragma da pelve. B e C. Os músculos esfíncter externo da uretra e transverso profundo do períneo cobrem a região do hiato urogenital, que é fechada inferiormente pela membrana do períneo que se estende entre os ramos isquiopúbicos. D e E. Inferiormente à membrana do períneo, o espaço superficial do períneo contém os corpos eréteis e os músculos associados a eles. Anteriormente, o corpo do períneo funde-se com a margem posterior da membrana do períneo e superiormente com o septo retovesical ou retovaginal (Figura 3.53A e B). Fáscias e espaços da região urogenital FÁSCIAS DO PERÍNEO 2 A fáscia do períneo tem camadas superficial e profunda. A tela subcutânea do períneo, como aquela da parede abdominal anteroinferior, consiste em um panículo adiposo superficial e uma camada membranácea profunda, o estrato membranáceo (fáscia de Colles). Nas mulheres, o panículo adiposo da tela subcutânea do períneo forma os lábios maiores do pudendo e o monte do púbis e é contínuo anterior e superiormente com o panículo adiposo da tela subcutânea do abdome (fáscia de Camper) (Figura 3.53A e C). Nos homens, o panículo adiposo é muito diminuído na região urogenital, sendo totalmente substituído no pênis e no escroto por músculo liso (dartos). É contínuo entre o pênis ou escroto e as coxas com o panículo adiposo da tela subcutânea do abdome (Figura 3.53B e D). Em ambos os sexos, o panículo adiposo da tela subcutânea do períneo é contínuo posteriormente com o corpo adiposo isquioanal na região anal (Figura 3.53E). O estrato membranáceo da tela subcutânea do períneo não se estende até a região anal, está fixado posteriormente à margem posterior da membrana do períneo e ao corpo do períneo (Figura 3.53A e B). Lateralmente, fixa-se à fáscia lata (fáscia dos músculos) da face medial superior da coxa (Figura 3.53C e E). Anteriormente, em homens, o estrato membranáceo da tela subcutânea é contínuo com a túnica dartos do pênis e escroto; entretanto, de cada lado e anteriormente ao escroto, o estrato membranáceo torna-se contínuo com o estrato membranáceo da tela subcutânea do abdome (fáscia de Scarpa) (Figura 3.53B). Nas mulheres, o estrato membranáceo passa superiormente ao panículo adiposo, formando os lábios maiores do pudendo e torna-se contínuo com o estrato membranáceo da tela subcutânea do abdome (Figura 3.53A e C). • Figura 3.53 Fáscias do períneo. A e B. Cortes medianos, vistos da esquerda, mostram as fáscias na mulher (A) e no homem (B). São indicados os planos dos cortes mostrados nas partes C–F. C. Este corte coronal da região urogenital feminina está situado no plano da vagina. São mostrados os componentes fibroareolares da fáscia parietal da pelve (ligamento transverso do colo do útero e paracolpo). D. Este corte coronal da região urogenital masculina está situado no plano da parte prostática da uretra. E. Este corte coronal da região anal está no plano da porção inferior do reto e do canal anal. F. Este corte coronal mostra a tela subcutânea da parte proximal do pênis e do escroto. A Figura 3.61C mostra uma vista aumentada das camadas do pênis. A fáscia superficial do períneo (fáscia de Gallaudet) reveste intimamente os músculos isquiocavernoso, bulboesponjoso e transverso superficial do períneo (Figura 3.53A e E). Também está fixada lateralmente aos ramos isquiopúbicos. Anteriormente, funde-se ao ligamento suspensor do pênis (ver Figura 3.63) e é contínua com a fáscia dos músculos que cobre o músculo oblíquo externo do abdome e a bainha do músculo reto do abdome. Nas mulheres, a fáscia superficial do períneo está fundida ao ligamento suspensor do clitóris e, como em homens, à fáscia profunda de revestimento do abdome. ESPAÇO SUPERFICIAL DO PERÍNEO O espaço superficial do períneo é um espaço virtual entre a fáscia do períneo e a membrana do períneo, limitado lateralmente pelos ramos isquiopúbicos (Figuras 3.52D e E e 3.53). Nos homens, o espaço superficial do períneo contém: Raiz (bulbo e ramos) do pênis e músculos associados (isquiocavernoso e bulboesponjoso) • • • • • • • • • • • • • • • • • • Porção proximal (bulbar) da parte esponjosa da uretra Músculos transversos superficiais do períneo Ramos perineais profundos dos vasos pudendos internos e nervos pudendos. Nas mulheres, o espaço superficial do períneo contém: Clitóris e músculos associados (isquiocavernoso) Bulbos do vestíbulo e músculo adjacente (bulboesponjoso) Glândulas vestibulares maiores Músculos transversos superficiais do períneo Vasos e nervos relacionados (ramos perineais profundos dos vasos pudendos internos e nervos pudendos). As estruturas do espaço superficial do períneo serão discutidas com mais detalhes, específicos para cada sexo, adiante, neste capítulo. ESPAÇO PROFUNDO DO PERÍNEO O espaço profundo do períneo é limitado inferiormente pela membrana do períneo, superiormente pela fáscia inferior do diafragma da pelve, e lateralmente pela porção inferior da fáscia obturatória (cobrindo o músculo obturador interno) (Figura 3.53C a D). Inclui os recessos anteriores cheios de gordura das fossas isquioanais. O limite superior na região do hiato urogenital é indistinto. Em ambos os sexos, o espaço profundo do períneo contém: Parte da uretra, centralmente A parte inferior do músculo esfíncter externo da uretra, acima do centro da membrana do períneo, circundando a uretra Extensões anteriores dos corpos adiposos isquioanais. Nos homens, o espaço profundo do períneo contém: Parte intermédia da uretra, a parte mais estreita da uretra masculina Músculos transversos profundos do períneo, imediatamente superiores à membrana do períneo (em sua face superior), seguindo transversalmente ao longo de sua face posterior Glândulas bulbouretrais, inseridas na musculatura profunda do períneo Estruturas neurovasculares dorsais do pênis. Nas mulheres, o espaço profundo do períneo contém: Parte proximal da uretra Massa de músculo liso no lugar dos músculos transversos profundos do períneo na margem posterior da membrana do períneo, associada ao corpo do períneo Rede neurovascular dorsal do clitóris. Conceito passado do espaço profundo do períneo e músculo esfíncter externo da uretra. Segundo a descrição tradicional, o diafragma UG triangular e trilaminar formava o espaço profundo do períneo. Embora as descrições clássicas pareçam justificadas quando se vê apenas a face superficial das estruturas que ocupam o espaço profundo (Figura 3.54A), o conceito antigo de um diafragma plano, essencialmente bidimensional, é errado. De acordo com esse conceito, o “diafragma UG” trilaminar consistia na membrana do períneo (fáscia inferior do diafragma UG) inferiormente, uma fáscia superior do diafragma UG superiormente, e os músculos transversos profundos do períneo entre eles. O espaço profundo era o espaço entre as duas membranas fasciais, ocupado por uma lâmina muscular aparentemente plana formada por um esfíncter da uretra discoide situado anterior a, ou dentro de, um músculo transverso profundo do períneo igualmente bidimensional e com orientação transversal. Nos homens, as glândulas bulbouretrais também eram consideradas ocupantes do espaço. Apenas as descrições da membrana do períneo e dos músculos transversos profundos do períneo do homem (com as glândulas inseridas) parecem ser apoiadas por evidências, que incluem imagens de indivíduos vivos (Myers et al., 1998a, 1998b). Muitos textos, atlas e ilustrações médicas continuam a apresentar o modelo antigo, e os estudantes devem encontrar imagens e conceitos obsoletos no treinamento e na prática clínica e devem estar cientes das inexatidões a esse respeito. Conceito atual do espaço profundo do períneo e músculo esfíncter externo da uretra. Na mulher, a margem posterior da membrana do períneo é tipicamente ocupada por massa de músculo liso no lugar dos músculos transversos profundos do períneo (Wendell-Smith, 1995). Imediatamente superior à metade posterior da membrana do períneo, o músculo transverso profundo do períneo, plano, semelhante a uma lâmina, quando desenvolvido (em geral apenas em homens), oferece sustentação dinâmica para as vísceras pélvicas. Entretanto, segundo a descrição de Oelrich (1980), o músculo esfíncter da uretra não é uma estrutura plana e horizontal, e a única “fáscia superior” é a fáscia intrínseca do músculo esfíncter externo da uretra. As opiniões atuais consideram a fáscia inferior do diafragma da pelve o limite superior do espaço profundo (Figura 3.53C e E). Nas duas opiniões, a forte membrana do períneo é o limite inferior (assoalho) do espaço profundo, separando-o do espaço superficial. Na verdade, a membrana do períneo é, junto com o corpo do períneo, a sustentação passiva final das vísceras pélvicas. Figura 3.54 Espaço profundo do períneo e músculos esfíncteres externos da uretra no homem e na mulher. A. O espaço profundo do períneo é visto através (lado esquerdo) da membrana do períneo e após sua remoção (lado direito). B. As fibras escavadas do músculo esfíncter externo da uretra superior no homem ascendem até o colo da bexiga como parte do istmo da próstata. O músculo esfíncter inferior tem uma porção cilíndrica e outra semelhante a uma alça (músculo compressor da uretra). C. Complexo do músculo esfíncter da uretra feminino. O músculo esfíncter externo da uretra masculina assemelha-se mais a um tubo ou canal do que a um disco. No homem, apenas a parte inferior do músculo forma um revestimento circular (um esfíncter verdadeiro) para a parte intermédia da uretra inferior à próstata (Figura 3.54B). Sua maior parte, escavada, estende-se verticalmente até o colo da bexiga como parte do istmo da próstata, deslocando o tecido glandular e revestindo a parte prostática da uretra apenas nas regiões anterior e anterolateral (ver também Figura 3.38). Aparentemente, o primórdio muscular é estabelecido ao redor de toda a extensão da uretra antes do desenvolvimento da próstata. À medida que a próstata se desenvolve a partir das glândulas uretrais, o músculo posterior e posterolateral sofre atrofia ou é deslocado pela próstata. Há controvérsia se essa parte do músculo comprime ou dilata a parte prostática da uretra. Na mulher, o músculo esfíncter externo da uretra é mais propriamente um “esfíncter urogenital” (Oelrich, 1983). Aqui, também, uma parte forma um esfíncter anular verdadeiro ao redor da uretra (Figura 3.54C), e várias outras partes estendemse a partir dele: uma parte superior, que se estende até o colo da bexiga; uma subdivisão que se estende inferolateralmente até o ramo do ísquio de cada lado (o músculo compressor da uretra); e, ainda, outra parte semelhante a uma faixa, que circunda a • • • • vagina e a uretra (esfíncter uretrovaginal). Tanto no homem quanto na mulher, a musculatura descrita situa-se perpendicular à membrana do períneo, e não em um plano paralelo a ela. Características da região anal FOSSAS ISQUIOANAIS As fossas isquioanais de cada lado do canal anal são grandes espaços triangulares, revestidos por fáscia, entre a pele da região anal e o diafragma da pelve (Figuras 3.53D, 3.55A e 3.56). O ápice de cada fossa situa-se superiormente onde o músculo levantador do ânus origina-se da fáscia obturatória. As fossas isquioanais, largas inferiormente e estreitas superiormente, são preenchidas por gordura e tecido conjuntivo frouxo. As duas fossas isquioanais comunicam-se através do espaço pós-anal profundo sobre o corpo anococcígeo, massa fibrosa localizada entre o canal anal e a extremidade do cóccix (Figuras 3.53A e B e 3.55B). Figura 3.55 Diafragma da pelve e fossas isquioanais. A. Corte coronal da pelve no plano do reto e canal anal, mostrando as paredes lateral e medial e o teto das fossas isquioanais. B. A fáscia que cobre a face inferior do diafragma da pelve forma o teto das fossas isquioanais. O ligamento sacroespinal esquerdo foi retirado para mostrar o músculo isquiococcígeo. Abscessos das fossas isquioanais direita ou esquerda podem estender-se até a fossa contralateral através do espaço profundo pós-anal (seta de pontas duplas). Cada fossa isquioanal é limitada: Lateralmente pelo ísquio e parte inferior superposta do músculo obturador interno, coberto pela fáscia obturatória Medialmente pelo músculo esfíncter externo do ânus, com uma parede medial superior inclinada ou teto formado pelo músculo levantador do ânus quando desce para se fundir ao esfíncter; as duas estruturas circundam o canal anal Posteriormente pelo ligamento sacrotuberal e músculo glúteo máximo Anteriormente pelos corpos dos púbis, inferiormente à origem do músculo puborretal. Essas partes das fossas, que se estendem até a região UG superiormente à membrana do períneo (e à musculatura em sua face superior), são conhecidas como recessos anteriores das fossas isquioanais. Cada fossa isquioanal é preenchida por um corpo adiposo da fossa isquioanal. Esses corpos adiposos sustentam o canal anal, mas são facilmente deslocados para permitir a descida e a expansão do canal anal durante a passagem das fezes. Os corpos adiposos são atravessados por faixas fibrosas e resistentes, e também por várias estruturas neurovasculares, inclusive os vasos e nervos anais inferiores/retais e dois outros nervos cutâneos, o ramo perfurante de S2 e S3 e o ramo perineal do nervo S4. CANAL DO PUDENDO E SEU FEIXE NEUROVASCULAR O canal do pudendo (canal de Alcock) é uma passagem praticamente horizontal na fáscia obturatória que cobre a face medial do músculo obturador interno e reveste a parede lateral da fossa isquioanal (Figuras 3.55A e 3.56). A artéria e veia pudendas internas, o nervo pudendo e o nervo para o músculo obturador interno entram nesse canal na incisura isquiática menor, inferiormente à espinha isquiática. Os vasos pudendos internos e o nervo pudendo irrigam, drenam e inervam, respectivamente, a maior parte do períneo. Quando a artéria e o nervo entram no canal, dão origem à artéria retal inferior e ao nervo anal inferior, que seguem medialmente para suprir o músculo esfíncter externo do ânus e a pele perianal (Figuras 3.56 a 3.58; Quadro 3.8). Próximo à extremidade distal (anterior) do canal pudendo, a artéria e o nervo bifurcam-se, dando origem ao nervo e à artéria perineais, que são distribuídos principalmente para o espaço superficial (inferior à membrana do períneo), e à artéria e nervo dorsais do pênis ou clitóris, que seguem no espaço profundo (superior à membrana). Quando essas últimas estruturas chegam ao dorso do pênis ou do clitóris, os nervos seguem distalmente na face lateral da continuação da artéria pudenda interna enquanto ambos prosseguem até a glande do pênis ou do clitóris. Figura 3.56 Reto e canal anal, músculo levantador do ânus e fossa isquioanal. O terço posterolateral esquerdo do reto e do canal anal foi retirado para mostrar as características do lúmen. Os vasos e nervos pudendos passam pelo canal do pudendo, um espaço na fáscia obturatória que cobre a face medial do músculo obturador interno, revestindo a parede lateral da fossa isquioanal. O nervo perineal tem dois ramos: o ramo perineal superficial dá origem aos nervos escrotais ou labiais (cutâneos) posteriores, e o ramo perineal profundo supre os músculos dos espaços profundo e superficial do períneo, a pele do vestíbulo da vagina e a túnica mucosa da parte inferior da vagina. O nervo anal inferior comunica-se com os nervos escrotais ou labiais posteriores e com os nervos perineais. O nervo dorsal do pênis ou clitóris é o principal nervo sensitivo do órgão masculino ou feminino, sobretudo a glande sensível na extremidade distal. CANAL ANAL O canal anal é a parte terminal do intestino grosso e de todo o sistema digestório. Estende-se da face superior do diafragma da pelve até o ânus (Figuras 3.55B e 3.56). O canal (2,5 a 3,5 cm de comprimento) começa no ponto onde a ampola do reto se estreita, no nível da alça em formato de U formada pelo músculo puborretal (Figura 3.12). O canal anal termina no ânus, a abertura de saída do sistema digestório. O canal anal, circundado pelos músculos esfíncteres interno e externo do ânus, desce posteroinferiormente entre o corpo anococcígeo e o corpo do períneo. O canal apresenta-se colapsado, exceto durante a passagem de fezes. Os dois esfíncteres devem relaxar para que haja defecação. Figura 3.57 Distribuição do nervo pudendo. As cinco regiões atravessadas pelo nervo. O nervo pudendo supre a pele, os órgãos e os músculos do períneo; portanto, está relacionado a micção, defecação, ereção, ejaculação e, na mulher, parto. Embora o nervo pudendo seja mostrado aqui no homem, sua distribuição é semelhante na mulher porque as partes do períneo feminino são homólogas às do homem. O músculo esfíncter interno do ânus (Figuras 3.55A e 3.56) é um esfíncter involuntário que circunda os dois terços superiores do canal anal. É um espessamento da túnica muscular circular. Sua contração (tônus) é estimulada e mantida por fibras simpáticas dos plexos retal superior (periarterial) e hipogástrico. A contração é inibida por estimulação das fibras parassimpáticas, tanto intrinsecamente em relação à peristalse quanto extrinsecamente por fibras que passam via nervos esplâncnicos pélvicos. Na maior parte do tempo há contração tônica do esfíncter para evitar a perda de líquido ou flatos; no entanto, ele relaxa (é inibido) temporariamente em resposta à distensão da ampola do reto por fezes ou gases, o que exige a contração voluntária dos músculos puborretal e esfíncter externo do ânus para que não haja defecação nem flatulência. A ampola do reto relaxa após a distensão inicial (quando a peristalse cessa) e o tônus retorna até a próxima peristalse ou até que haja um nível limiar de distensão, momento em que a inibição do esfíncter é contínua até o alívio da distensão. O músculo esfíncter externo do ânus é um grande esfíncter voluntário que forma uma faixa larga de cada lado dos dois terços inferiores do canal anal (Figuras 3.52E, 3.55 e 3.56). Esse esfíncter está fixado anteriormente ao corpo do períneo e posteriormente ao cóccix por meio do corpo anococcígeo; funde-se superiormente ao músculo puborretal. A descrição do músculo esfíncter externo do ânus divide-o em partes subcutânea, superficial e profunda; estas são zonas, e não ventres musculares, e muitas vezes são indistintas. O músculo esfíncter externo do ânus é suprido principalmente por S4 através do nervo anal inferior (Figura 3.57), embora sua parte profunda também receba fibras do nervo para o músculo levantador do ânus, em comum com o puborretal, com o qual se contrai em uníssono para manter a continência quando o esfíncter interno está relaxado (exceto durante a defecação). Internamente, a metade superior da túnica mucosa do canal anal é caracterizada por uma série de estrias longitudinais denominadas colunas anais (Figura 3.56). Essas colunas contêm os ramos terminais da artéria e veia retais superiores. A junção anorretal, indicada pelas extremidades superiores das colunas anais, é o local onde o reto se une ao canal anal. Nesse ponto, há um estreitamento abrupto da ampola do reto ampla ao atravessar o diafragma da pelve. Válvulas anais unem-se às extremidades inferiores das colunas anais. Superiormente às válvulas há pequenos recessos denominados seios anais. Quando comprimidos por fezes, os seios anais liberam muco, o que ajuda na evacuação de fezes do canal anal. O limite inferior das válvulas anais, que se assemelha a um pente, forma uma linha irregular, a linha pectinada, que indica a junção da parte superior do canal anal (visceral; derivada do intestino posterior embrionário) com a parte inferior (somática; derivada do proctodeu embrionário). As partes do canal anal superior e inferior à linha pectinada têm suprimento arterial, inervação e drenagem venosa e linfática distintos (Figura 3.59). Essas diferenças resultam das origens embriológicas distintas das partes superior e inferior do canal anal (Moore, Persaud e Torchiam, 2012). Irrigação arterial do canal anal. A artéria retal superior irriga o canal anal acima da linha pectinada (Figuras 3.32A e 3.59). As duas artérias retais inferiores irrigam a parte do canal anal abaixo da linha pectinada, bem como os músculos adjacentes e a pele perianal (Figuras 3.32, 3.58 e 3.59; Quadro 3.8). As artérias retais médias auxiliam a vascularização do canal anal formando anastomoses com as artérias retais superiores e inferiores. Drenagem venosa e linfática do canal anal. O plexo venoso retal interno drena nas duas direções a partir do nível da linha pectinada. Superiormente à linha pectinada, o plexo retal interno drena principalmente para a veia retal superior (uma tributária da veia mesentérica inferior) e o sistema porta (Figuras 3.32B e 3.59). Inferiormente à linha pectinada, o plexo retal interno drena para as veias retais inferiores (tributárias do sistema venoso cava) ao redor da margem do músculo esfíncter externo do ânus. As veias retais médias (tributárias das veias ilíacas internas) drenam principalmente a túnica muscular externa da ampola do reto e formam anastomoses com as veias retais superiores e inferiores. Além das abundantes anastomoses venosas, os plexos retais recebem várias anastomoses arteriovenosas (AAV) das artérias retais superiores e médias. Figura 3.58 Artérias do períneo. Quadro 3.8 Artérias do períneo. Artéria Origem Trajeto Distribuição no períneo Pudenda interna Divisão anterior da A. ilíaca interna Deixa a pelve através do forame isquiático maior; faz uma volta ao redor da espinha isquiática para entrar no períneo através do forame isquiático menor; entra no canal do pudendo Principal artéria do períneo e órgãos genitais externos Retal inferior A. pudenda interna Origina-se na entrada do canal do pudendo; atravessa a fossa isquioanal até o canal anal Canal anal inferior à linha pectinada; esfíncteres anais; pele perianal Perineal Origina-se no canal do pudendo; segue até o espaço superficial do períneo na saída Irriga os músculos superficiais do períneo e o escroto no homem/vestíbulo da vagina na mulher Escrotal (♂) ou labial (♀) posterior Ramo terminal da A. perineal Segue na fáscia superficial da parte posterior do escroto ou lábios maiores do pudendo Pele do escroto ou lábios maiores e menores Irriga o bulbo do pênis (inclusive a Do bulbo do pênis (♂) ou do vestíbulo (♀) Perfura a membrana do períneo para chegar ao bulbo do pênis ou vestíbulo da vagina parte bulbar da uretra) e a glândula bulbouretral (homem) ou bulbo do vestíbulo e glândula vestibular maior (mulher) Profunda do pênis (♂) ou clitóris (♀) Ramo terminal da A. pudenda interna Perfura a membrana do períneo para entrar nos ramos dos corpos cavernosos do pênis ou clitóris; os ramos seguem em sentido proximal e distal Irriga a maior parte do tecido erétil dos corpos cavernosos do pênis ou clitóris através das artérias helicinas Dorsal do pênis (♂) ou clitóris (♀) Segue até o espaço profundo; perfura a membrana do períneo e atravessa o ligamento suspensor do pênis ou clitóris para seguir ao longo do dorso do pênis ou clitóris até a glande Espaço profundo do períneo; pele do pênis; fáscia do pênis ou clitóris; região distal do corpo esponjoso do pênis, inclusive a parte esponjosa da uretra; glande do pênis ou clitóris Pudenda externa, ramos superficiais e profundos A. femoral Segue medialmente a partir da coxa para chegar à face anterior do trígono urogenital do períneo Face anterior do escroto e pele na raiz do pênis no homem; monte do púbis e face anterior dos lábios do pudendo na mulher Figura 3.59 Transições que ocorrem na linha pectinada. Os vasos e nervos superiores à linha pectinada são viscerais; aqueles inferiores à linha pectinada são parietais ou somáticos. Essa orientação reflete o desenvolvimento embriológico do anorreto. A tela submucosa normal da junção anorretal apresenta espessamento acentuado, e ao corte tem a aparência de um tecido cavernoso (erétil), por causa das veias saculadas do plexo venoso retal interno. A tela submucosa vascularizada é mais espessa nas posições lateral esquerda, anterolateral direita e posterolateral direita, formando coxins anais, no ponto de fechamento do canal anal. Como esses coxins contêm plexos de veias saculares capazes de receber sangue arterial diretamente através de várias AAV, têm flexibilidade e turgor variáveis e formam um tipo de válvula unidirecional que contribui para o fechamento normalmente hermético para gases e líquido do canal anal. Superiormente à linha pectinada, os vasos linfáticos drenam profundamente para os linfonodos ilíacos internos e por meio deles para os linfonodos ilíacos comuns e lombares (Figuras 3.48B e 3.59; Quadro 3.7). Inferiormente à linha pectinada, os vasos linfáticos drenam superficialmente para os linfonodos inguinais superficiais, assim como a maior parte do períneo. Inervação do canal anal. A inervação do canal anal superior à linha pectinada é a inervação visceral do plexo hipogástrico inferior, incluindo fibras aferentes simpáticas, parassimpáticas e viscerais (Figuras 3.33 e 3.59). As fibras simpáticas mantêm o tônus do músculo esfíncter interno do ânus. As fibras parassimpáticas inibem o tônus do músculo esfíncter interno do ânus e provocam contração peristáltica para defecação. A parte superior do canal anal, assim como o reto superior a ela, situa-se abaixo da linha de dor pélvica (ver Quadro 3.3); todas as fibras aferentes viscerais seguem com as fibras parassimpáticas até os gânglios sensitivos de nervos espinais S2–S4. Superiormente à linha pectinada, o canal anal é sensível apenas à distensão, o que provoca sensações tanto em nível consciente quanto inconsciente (reflexo). Por exemplo, a distensão da ampola do reto inibe (relaxa) o tônus do esfíncter interno. A inervação do canal anal inferior à linha pectinada é a inervação somática derivada dos nervos anais (retais) inferiores, ramos do nervo pudendo. Portanto, essa parte do canal anal é sensível à dor, ao toque e à temperatura. As fibras eferentes somáticas estimulam a contração do músculo esfíncter externo do ânus, que é voluntário. PERÍNEO Ruptura do corpo do períneo O corpo do períneo é uma estrutura importante, sobretudo em mulheres, pois é a sustentação final das vísceras pélvicas, unindo músculos que se estendem através da abertura inferior da pelve, como feixes cruzados que sustentam o diafragma da pelve sobrejacente. Pode haver distensão ou ruptura das fixações dos músculos perineais ao corpo do períneo durante o parto, excluindo a sustentação do assoalho pélvico. Consequentemente, pode haver prolapso das vísceras pélvicas, inclusive o prolapso da bexiga urinária (através da uretra) e prolapso do útero e/ou vagina (através do óstio da vagina). (Vários graus de prolapso são ilustrados no boxe azul, “Disposição do útero e prolapso uterino”, anteriormente). A ruptura do corpo do períneo também pode ser causada por traumatismo, doença inflamatória e infecção, que podem resultar na formação de uma fístula conectada ao vestíbulo (ver, no boxe azul, “Fístulas vaginais”, anteriormente). O enfraquecimento do corpo do períneo, associado à diástase (separação) das partes puborretal e pubococcígea do músculo levantador do ânus, também pode resultar na formação de uma cistocele, retocele e/ou enterocele, protrusões herniárias de parte da bexiga urinária, reto ou escavação retovaginal, respectivamente, para a parede da vagina (Figura B3.28). Figura B3.28 Episiotomia Durante a cirurgia vaginal e o trabalho de parto, pode-se fazer uma episiotomia (incisão cirúrgica do períneo e parede posteroinferior da vagina) para aumentar o óstio da vagina, visando diminuir a laceração traumática excessiva do períneo e ruptura irregular descontrolada dos músculos do períneo. As episiotomias ainda são realizadas em grande número de partos vaginais nos Estados Unidos (Gabbe et al., 2007). Há consenso geral de que a episiotomia é indicada quando há interrupção ou atraso da descida do feto, quando é necessário o uso de instrumentos (p. ex., uso de fórceps obstétrico) ou para acelerar o parto quando há sinais de sofrimento fetal. Entretanto, há grande discussão sobre a episiotomia profilática rotineira e sua frequência vem diminuindo. O corpo do períneo é a principal estrutura incisada durante uma episiotomia mediana (Figura B3.29A e B). A justificativa para a incisão mediana é que a cicatriz deixada pela ferida não será muito diferente do tecido fibroso ao seu redor. Além disso, como há apenas incisão parcial desse tecido fibroso, alguns médicos acreditam que é mais provável que haja autolimitação da incisão e resistência à ruptura adicional. No entanto, quando ocorre, a ruptura adicional se faz em direção ao ânus, com a possibilidade de sequelas como a lesão do esfíncter ou fístulas anovaginais. Estudos recentes indicam que as episiotomias medianas estão associadas a maior incidência de lacerações graves, associadas, por sua vez, a maior incidência de incontinência a longo prazo, prolapso pélvico e fístulas anovaginais. Figura B3.29 As episiotomias mediolaterais (Figura B3.29A) parecem resultar em menor incidência de laceração grave e é menor o risco de lesão dos esfíncteres e do canal anal. (Nota: o uso clínico do termo mediolateral é tecnicamente impróprio aqui; na verdade, refere-se a uma incisão que inicialmente é mediana e depois segue em direção lateral e posterior, evitando o corpo do períneo e a ruptura em direção ao ânus.) Ruptura da uretra em homens e extravasamento de urina As fraturas do cíngulo do membro inferior, sobretudo aquelas resultantes da separação da sínfise púbica e ligamentos puboprostáticos, muitas vezes causam ruptura da parte membranácea da uretra. A ruptura dessa parte da uretra resulta no extravasamento de urina e sangue para o espaço profundo do períneo (Figura B3.30A); pode haver passagem superior do líquido através do hiato urogenital e distribuição extraperitoneal ao redor da próstata e da bexiga urinária. Figura B3.30 O local comum de ruptura da parte esponjosa da uretra e extravasamento de urina é o bulbo do pênis (Figura B3.30B). Essa lesão geralmente resulta de um golpe forte no períneo (queda a cavaleiro), como a queda sobre uma barra de metal ou, menos comumente, da introdução errada (falso trajeto) de um cateter ou dispositivo transuretral que não consegue transpor o ângulo da uretra no bulbo do pênis. A ruptura do corpo esponjoso e da parte esponjosa da uretra resulta em extravasamento de urina para o espaço superficial do períneo. As fixações do estrato membranáceo do períneo determinam a direção do fluxo da urina extravasada. A urina pode passar para o tecido conjuntivo frouxo no escroto, ao redor do pênis, e, superiormente, profundamente ao estrato membranáceo do tecido conjuntivo subcutâneo da parede abdominal anteroinferior. • • • • A urina não chega às coxas porque o estrato membranáceo da tela subcutânea do períneo funde-se à fáscia lata, envolvendo os músculos da coxa, imediatamente distal ao ligamento inguinal. Além disso, a urina não pode seguir posteriormente para a região anal, pois as camadas superficial e profunda da fáscia do períneo são contínuas entre si ao redor dos músculos superficiais do períneo e com a margem posterior da membrana do períneo situada entre elas. A ruptura de um vaso sanguíneo para o espaço superficial do períneo causada por traumatismo resultaria em contenção semelhante do sangue no espaço superficial do períneo. Inanição e prolapso retal Os corpos adiposos das fossas isquioanais estão entre as últimas reservas de tecido adiposo a desaparecerem na inanição. Na ausência da sustentação assegurada pela gordura isquioanal, o prolapso retal é relativamente comum. Linha pectinada A linha pectinada é um ponto de referência muito importante porque é visível e aproxima-se do nível de importantes alterações anatômicas relacionadas à transição da região visceral para a região parietal (Figura 3.59), afetando aspectos como os tipos de tumores que ocorrem e a direção na qual metastatizam. Fissuras anais e abscessos isquioanais e perianais Às vezes as fossas isquioanais são locais de infecção, o que pode resultar na formação de abscessos isquioanais (Figura B3.31A). Esses acúmulos de pus são muito dolorosos. As infecções podem atingir as fossas isquioanais de várias formas: Após criptite (inflamação dos seios anais) Extensão de um abscesso pelvirretal Após ruptura na túnica mucosa anal A partir de uma ferida penetrante na região anal. Os sinais diagnósticos de um abscesso isquioanal são volume e dor à palpação entre o ânus e o túber isquiático. Um abscesso perianal pode se romper espontaneamente, abrindo-se para o canal anal, reto ou pele perianal. Como as fossas isquioanais comunicam-se posteriormente através do espaço pós-anal profundo, um abscesso em uma fossa pode disseminar-se para a outra e formar um abscesso semicircular “em forma de ferradura” ao redor da face posterior do canal anal. Em pessoas com constipação intestinal crônica, as válvulas e a túnica mucosa anal podem ser rompidas por fezes endurecidas. A fissura anal geralmente está localizada na linha mediana posterior, inferior às válvulas anais. É dolorosa porque essa região é suprida por fibras sensitivas dos nervos anais inferiores. O abscesso perianal pode suceder a infecção da fissura anal, e a infecção pode propagar-se para as fossas isquioanais e formar abscessos isquioanais ou propagar-se para a pelve e formar um abscesso pelvirretal. Figura B3.31 A fístula anal pode resultar da disseminação de infecção anal e criptite (inflamação de um seio anal). Uma extremidade desse canal anormal (fístula) abre-se no canal anal, e a outra extremidade abre-se em um abscesso na fossa isquioanal ou na pele perianal. Hemorroidas As hemorroidas internas são prolapsos da túnica mucosa retal (mais especificamente, dos “coxins anais”) que contêm as veias normalmente dilatadas do plexo venoso retal interno (Figura B3.31B). As hemorroidas internas resultam de ruptura da muscular da mucosa, uma camada de músculo liso situada profundamente à túnica mucosa. As hemorroidas internas que prolapsam através do canal anal são muitas vezes comprimidas pelos esfíncteres contraídos, impedindo o fluxo sanguíneo. Consequentemente, tendem a estrangular e ulcerar. Por causa das anastomoses arteriovenosas abundantes, o sangramento de hemorroidas internas é caracteristicamente vermelho-vivo. A conduta atual é tratar apenas as hemorroidas internas ulceradas e com prolapso. As hemorroidas externas são trombos nas veias do plexo venoso retal externo e são cobertas por pele. Os fatores predisponentes para hemorroidas incluem gravidez, constipação intestinal crônica e permanência prolongada sentado no banheiro e esforço, além de qualquer distúrbio que impeça o retorno venoso, inclusive o aumento da pressão intra-abdominal. As anastomoses entre as veias retais superiores, médias e inferiores formam comunicações clinicamente importantes entre os sistemas venosos porta e sistêmico (ver Figura 2.75A). A veia retal superior drena para a veia mesentérica inferior, enquanto as veias retais médias e inferiores drenam através da circulação sistêmica para a veia cava inferior. Qualquer aumento anormal da pressão no sistema porta sem válvulas ou nas veias do tronco pode causar dilatação das veias retais superiores, resultando em aumento do fluxo sanguíneo ou estase no plexo venoso retal interno. Na hipertensão porta que ocorre em consequência da cirrose hepática, a anastomo-se portocava entre as veias retais superiores e as veias retais médias e inferiores, juntamente com anastomoses portocavas em outras partes, pode tornar-se varicosa. É importante notar que as veias dos plexos retais normalmente parecem varicosas (dilatadas e tortuosas), mesmo em recém-nascidos, e que as hemorroidas internas são mais comuns na ausência de hipertensão porta. Em relação à dor das hemorroidas e ao seu tratamento, é importante notar que o canal anal superior à linha pectinada é visceral; assim, é inervado por fibras de dor aferentes viscerais, de modo que a incisão ou inserção de agulha nessa região é indolor. As hemorroidas internas não são dolorosas e podem ser tratadas sem anestesia. Inferiormente à linha pectinada, o canal anal é somático, suprido pelos nervos anais inferiores que contêm fibras sensitivas somáticas. Portanto, é sensível a estímulos dolorosos (p. ex., à espetada com uma agulha hipo-dérmica). As hemorroidas externas podem ser dolorosas, mas não raro se resolvem em alguns dias. Incontinência anorretal O estiramento do(s) nervo(s) pudendo(s) durante um parto traumático pode resultar em lesão do nervo pudendo e incontinência anorretal. Pontos-chave PERÍNEO E REGIÃO PERINEAL O períneo é o compartimento romboide limitado perifericamente pela abertura inferior da pelve osteofibrosa e profundamente (superiormente) pelo diafragma da pelve. ♦ A área de superfície sobre esse compartimento é a região do períneo. ♦ A região urogenital (anteriormente) e a região anal (posteriormente) que formam essa área romboide situam-se em ângulos opostos. ♦ Os planos cruzados definem a linha transversa (que se estende entre os túberes isquiáticos) que forma a base de cada região. ♦ O centro é perfurado pela uretra e, nas mulheres, pela vagina. ♦ A região anal é perfurada pelo canal anal. ♦ O corpo do períneo é uma massa musculofibrosa situada entre as estruturas que perfuram as regiões UG e anal, no ponto central do períneo. Região UG: A tela subcutânea do trígono urogenital inclui um panículo adiposo superficial e um estrato membranáceo mais profundo (fáscia de Colles), que são contínuos com as camadas correspondentes da parede abdominal anteroinferior. ♦ Nas mulheres, o panículo adiposo é espesso no monte do púbis e nos lábios maiores do pudendo, mas em homens, é substituído pelo músculo liso dartos no pênis e escroto. ♦ O estrato membranáceo do períneo é limitado a região UG, fundindo-se com a membrana do períneo na margem posterior (base) da região. ♦ Nos homens, essa camada estende-se até o pênis e o escroto, onde está intimamente associada à pele frouxa e móvel dessas estruturas. ♦ A membrana do períneo plana divide a região urogenital do períneo em espaços superficial e profundo do períneo. ♦ O espaço superficial do períneo está entre o estrato membranáceo da tela subcutânea do períneo e a membrana do períneo, e é limitado lateralmente pelos ramos isquiopúbicos. ♦ O espaço profundo do períneo está situado entre a membrana do períneo e a fáscia inferior do diafragma da pelve, e é limitado lateralmente pela fáscia obturatória. ♦ O espaço superficial contém os corpos eréteis dos órgãos genitais externos e os músculos associados, o músculo transverso superficial do períneo, os nervos e vasos perineais profundos e, nas mulheres, as glândulas vestibulares maiores. ♦ O espaço profundo compreende os recessos anteriores das fossas isquioanais preenchidos por gordura (lateralmente), o músculo transverso profundo do períneo e a parte inferior do músculo esfíncter externo da uretra, a parte da uretra que atravessa a membrana do períneo (a parte membranácea da uretra nos homens), os nervos dorsais do pênis/clitóris e, nos homens, as glândulas bulbouretrais. Região anal: As fossas isquioanais são espaços cuneiformes, revestidos por fáscia, ocupados pelos corpos adiposos isquioanais. ♦ Os corpos adiposos oferecem sustentação, podem ser comprimidos ou afastados para permitir a descida e a expansão temporárias do canal anal ou da vagina para a passagem de fezes ou de um feto. ♦ Os corpos adiposos são atravessados pela rede neurovascular anal inferior/retal. ♦ O canal do pudendo é uma importante passagem na parede lateral da fossa, entre as lâminas da fáscia obturatória, para os nervos e vasos que entram e saem da região urogenital. Canal anal: O canal anal é a parte terminal do intestino grosso e do sistema digestório, sendo o ânus a saída para o meio externo. ♦ O fechamento (e, portanto, a continência fecal) é mantido pela ação coordenada dos músculos esfíncteres interno (voluntário) e externo (involuntário) do ânus. ♦ O tônus simpático do esfíncter interno mantém o fechamento, exceto durante o enchimento da ampola do reto e quando inibido durante uma contração peristáltica do reto estimulada pelo sistema parassimpático. ♦ Durante esses momentos, o fechamento é mantido (exceto se for permitida a defecação) por contração voluntária dos músculos puborretal e esfíncter externo do ânus. ♦ Internamente, a linha pectinada demarca a transição visceral para somática do suprimento e da drenagem neurovasculares. ♦ O canal anal é circundado por plexos venosos superficial e profundo, cujas veias normalmente têm uma aparência varicosa. ♦ As tromboses no plexo superficial e o prolapso da túnica mucosa, inclusive de partes do plexo profundo, formam hemorroidas externas dolorosas e hemorroidas internas insensíveis, respectivamente. 

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