O peritônio é uma membrana serosa transparente, contínua, brilhante e escorregadia. Reveste a cavidade abdominopélvica e
recobre as vísceras (Figura 2.23). O peritônio consiste em duas lâminas contínuas: o peritônio parietal, que reveste a face
interna da parede abdominopélvica, e o peritônio visceral, que reveste vísceras como o estômago e intestino. As duas lâminas
de peritônio consistem em mesotélio, uma lâmina de epitélio pavimentoso simples.
Figura 2.23 Corte transversal do abdome no nível da bolsa omental. A figura de orientação (detalhe) indica o nível do corte
superficialmente. A seta escura passa da cavidade peritoneal (P), atravessa o forame omental (epiploico) e atravessa toda a
extensão da bolsa omental.
O peritônio parietal tem a mesma vasculatura sanguínea e linfática e a mesma inervação somática que a região da parede
que reveste. Como a pele sobrejacente, o peritônio que reveste o interior da parede do corpo é sensível a pressão, dor, calor e
frio, e laceração. A dor no peritônio parietal geralmente é bem localizada, exceto na face inferior da parte central do
diafragma, que é inervada pelos nervos frênicos (analisados adiante neste capítulo); a irritação nesse local costuma ser referida
nos dermátomos C3–C5 sobre o ombro.
O peritônio visceral e os órgãos que ele cobre têm a mesma vasculatura sanguínea e linfática e inervação visceral. O
peritônio visceral é insensível a toque, calor e frio, e laceração; é estimulado basicamente por distensão e irritação química. A
dor provocada é mal localizada, sendo referida para os dermátomos dos gânglios vertebrais que emitem as fibras sensitivas,
sobretudo para as partes medianas desses dermátomos. Consequentemente, a dor oriunda de derivados do intestino anterior
geralmente é sentida no epigástrio; a dor proveniente de derivados do intestino médio, na região umbilical; e aquela originada
em derivados do intestino posterior, na região púbica.
O peritônio e as vísceras estão na cavidade abdominopélvica. A relação entre as vísceras e o peritônio é a seguinte:
Os órgãos intraperitoneais são quase completamente cobertos por peritônio visceral (p. ex., o estômago e o baço).
Intraperitoneal neste caso não significa dentro da cavidade peritoneal (embora o termo seja usado clinicamente para
designar substâncias injetadas nessa cavidade). Os órgãos intraperitoneais foram conceitualmente, se não literalmente,
invaginados para o saco fechado, como ao pressionarmos a mão fechada contra uma bola de aniversário cheia (ver
Introdução sobre a discussão dos espaços potenciais)
Os órgãos extraperitoneais, retroperitoneais e subperitoneais também estão situados fora da cavidade peritoneal —
externamente ao peritônio parietal — e são apenas parcialmente cobertos por peritônio (geralmente apenas em uma face).
Órgãos retroperitoneais, como os rins, estão entre o peritônio parietal e a parede posterior do abdome e só têm peritônio
parietal nas faces anteriores (não raro com uma quantidade variável de gordura interposta). Do mesmo modo, a bexiga
urinária subperitoneal só tem peritônio parietal em sua face superior.
A cavidade peritoneal está dentro da cavidade abdominal e continua inferiormente até a cavidade pélvica. A cavidade
peritoneal é um espaço potencial com espessura capilar, situado entre as lâminas parietal e visceral do peritônio. Não contém
órgãos, mas contém uma fina película de líquido peritoneal, que é composto de água, eletrólitos e outras substâncias
derivadas do líquido intersticial em tecidos adjacentes. O líquido peritoneal lubrifica as faces peritoneais, permitindo que as
vísceras movimentem-se umas sobre as outras sem atrito e permitindo os movimentos da digestão. Além de lubrificar as faces
das vísceras, o líquido peritoneal contém leucócitos e anticorpos que resistem à infecção. Os vasos linfáticos, sobretudo na
face inferior do diafragma, cuja atividade é incessante, absorvem o líquido peritoneal. A cavidade peritoneal é completamente
fechada nos homens. Nas mulheres, porém, há uma comunicação com o exterior do corpo através das tubas uterinas,
cavidade uterina e vagina. Essa comunicação é uma possível via de infecção externa.
Embriologia da cavidade peritoneal
Por ocasião de sua formação, o intestino tem o mesmo comprimento do corpo em desenvolvimento. No entanto, cresce muito
para proporcionar a grande superfície de absorção necessária para a nutrição. Ao fim da 10
a semana de desenvolvimento, o
intestino é muito mais longo do que o corpo. Para que haja esse aumento do comprimento, o intestino deve obter liberdade de
movimento em relação à parede do corpo em um estágio inicial, mas ainda manter a conexão com ele necessária para
inervação e irrigação. Esse crescimento (e mais tarde, a atividade do intestino) é acomodado pelo desenvolvimento de uma
cavidade serosa no tronco que abriga o intestino cada vez mais longo e contorcido em um espaço relativamente compacto.
Inicialmente, a velocidade de crescimento do intestino supera o desenvolvimento de espaço adequado no tronco, e, durante
um período, o intestino, que se alonga rapidamente, estende-se para fora da parede do corpo em desenvolvimento (ver “Breve
revisão da rotação embriológica do intestino médio”, mais adiante, neste capítulo).
No início de seu desenvolvimento, a cavidade embrionária do corpo (celoma intraembrionário) é revestida por
mesoderma, o precursor do peritônio. Em uma fase um pouco mais tardia, a cavidade abdominal primordial é revestida por
peritônio parietal derivado do mesoderma, que forma um saco fechado. O lúmen do saco peritoneal é a cavidade peritoneal.
À medida que os órgãos se desenvolvem, eles invaginam (protraem) em graus variáveis para o saco peritoneal, adquirindo um
revestimento peritoneal, o peritônio visceral. Uma víscera (órgão) como o rim se protrai apenas parcialmente para a cavidade
peritoneal; portanto, é basicamente retroperitoneal, sempre permanecendo externa à cavidade peritoneal e posterior ao
peritônio que reveste a cavidade abdominal. Outras vísceras, como o estômago e o baço, protraem-se completamente para o
saco peritoneal e são quase totalmente revestidas por peritônio visceral — isto é, são intraperitoneais.
Essas vísceras estão ligadas à parede do abdome por um mesentério de comprimento variável, que é formado por duas
lâminas de peritônio com uma fina lâmina de tecido conjuntivo frouxo entre elas. Em geral, as vísceras cujo tamanho e
formato variam pouco, como os rins, são retroperitoneais, enquanto as vísceras que sofrem grandes alterações de formato
devido ao enchimento, esvaziamento e peristalse, como o estômago, são revestidas por peritônio visceral. As vísceras
intraperitoneais com um mesentério, como a maior parte do intestino delgado, são móveis, e o grau de mobilidade varia com o
comprimento do mesentério. Embora o fígado e o baço não mudem de formato em virtude da atividade intrínseca (embora
possam mudar de tamanho lentamente quando ingurgitados com sangue), a necessidade de um revestimento de peritônio
visceral é determinada pela necessidade de acomodar alterações passivas da posição impostas pelo diafragma adjacente, que é
muito ativo.
Quando os órgãos protraem-se para o saco peritoneal, seus vasos, nervos e linfáticos permanecem conectados à suas
fontes ou destinos extraperitoneais (geralmente retroperitoneais), de modo que essas estruturas de conexão situam-se entre as
lâminas do peritônio que formam seus mesentérios. Inicialmente, todo o intestino primordial encontra-se suspenso no centro
da cavidade peritoneal por um mesentério posterior fixado à linha mediana da parede posterior do corpo. À medida que os
órgãos crescem, diminuem gradualmente o tamanho da cavidade peritoneal até que este seja apenas um espaço virtual entre as
lâminas parietal e visceral do peritônio. Consequentemente, várias partes do intestino localizam-se contra a parede posterior do
abdome, e seus mesentérios posteriores diminuem gradualmente por causa da pressão de órgãos sobrejacentes (Figura 2.24).
Por exemplo, durante o desenvolvimento, a massa espiralada crescente de intestino delgado empurra a parte do intestino que
dará origem ao colo descendente para o lado esquerdo, e comprime seu mesentério contra a parede posterior do abdome. O
mesentério é mantido nesse lugar até que a lâmina de peritônio que formou o lado esquerdo do mesentério e a parte do
peritônio visceral do colo situada contra a parede do corpo se fundam ao peritônio parietal da parede do corpo.
Consequentemente, o colo é fixado à parede posterior do abdome no lado esquerdo e o peritônio cobre apenas sua face
anterior. Assim, o colo descendente (bem como o colo ascendente no lado direito) tornou-se secundariamente
retroperitoneal, tendo já sido intraperitoneal (Moore et al., 2012).
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Figura 2.24 Migração e fusão do mesocolo descendente. Partindo da posição primordial, suspenso na linha mediana da
parede posterior do abdome (A), o mesocolo desvia-se para a esquerda (B) e se funde gradualmente ao peritônio parietal
posterior esquerdo (C). D. O colo descendente tornou-se secundariamente retroperitoneal. A seta aponta o sulco paracólico
esquerdo, o local onde é feita uma incisão durante a mobilização do colo na cirurgia. Às vezes o colo descendente preserva um
mesentério curto, semelhante ao estágio mostrado em C, principalmente quando o colo está na fossa ilíaca.
As lâminas do peritônio que se fundiram agora formam uma fáscia de fusão, um plano de tecido conjuntivo no qual ainda
estão localizados os nervos e vasos do colo descendente. Assim, o colo descendente do adulto pode ser separado da parede
posterior do corpo (mobilizado cirurgicamente) por incisão do peritônio ao longo da margem lateral do colo descendente e
depois por dissecção romba ao longo do plano da fáscia de fusão, elevando as estruturas neurovasculares da parede posterior
do corpo até que seja atingida a linha mediana. O colo ascendente pode ser mobilizado da mesma forma no lado direito.
Várias partes do sistema digestório e órgãos associados tornam-se secundariamente retroperitoneais (p. ex., a maior parte
do duodeno e do pâncreas, além das partes ascendente e descendente do colo). São cobertas por peritônio apenas na face
anterior. Outras partes das vísceras (p. ex., o colo sigmoide e o baço) mantêm um mesentério relativamente curto. Entretanto,
as raízes dos mesentérios curtos não permanecem fixadas à linha mediana, mas desviam-se para a esquerda ou para a direita
por um processo de fusão como aquele descrito para o colo descendente.
Formações peritoneais
A cavidade peritoneal tem um formato complexo. Alguns dos fatos relacionados com isso incluem:
A cavidade peritoneal abriga uma grande extensão de intestino, a maior parte da qual é revestida por peritônio
São necessárias extensas áreas de continuidade entre o peritônio parietal e visceral para dar passagem às estruturas
neurovasculares da parede do corpo até as vísceras
Embora o volume da cavidade abdominal corresponda a uma fração do volume do corpo, os peritônios parietal e visceral
que revestem a cavidade peritoneal internamente têm uma área de superfície muito maior do que a face externa do corpo
(pele); portanto, o peritônio é extremamente convoluto.
Vários termos são usados para descrever as partes do peritônio que unem os órgãos a outros órgãos ou à parede do
abdome, e os compartimentos e recessos resultantes.
O mesentério é uma lâmina dupla de peritônio formada pela invaginação do peritônio por um órgão, e é a continuidade
dos peritônios visceral e parietal. Constitui um meio de comunicação neurovascular entre o órgão e a parede do corpo (Figura
2.25A e E). O mesentério une um órgão intraperitoneal à parede do corpo — geralmente a parede posterior do abdome (p.
ex., o mesentério do intestino delgado).
O mesentério do intestino delgado costuma ser denominado simplesmente “mesentério”; entretanto, os mesentérios
relacionados a outras partes específicas do sistema digestório recebem denominações de acordo — por exemplo, mesocolos
transverso e sigmoide (Figura 2.25B), mesoesôfago, mesogástrio e mesoapêndice. Os mesentérios têm um cerne de tecido
conjuntivo que contém sangue e vasos linfáticos, nervos, linfonodos e gordura (ver Figura 2.48A).
O omento é uma extensão ou prega de peritônio em duas camadas que vai do estômago e da parte proximal do duodeno
até os órgãos adjacentes na cavidade abdominal (Figura 2.25).
O omento maior é uma prega peritoneal proeminente, que tem quatro camadas e pende como um avental da curvatura
maior do estômago e da parte proximal do duodeno (Figura 2.25A, C e E). Após descer, dobra-se de volta e se fixa à face
anterior do colo transverso e seu mesentério
O omento menor é uma prega peritoneal muito menor, dupla, que une a curvatura menor do estômago e a parte proximal
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do duodeno ao fígado (Figura 2.25B e D). Também une o estômago a uma tríade de estruturas que seguem entre o
duodeno e o fígado na margem livre do omento menor (Figura 2.23).
Um ligamento peritoneal consiste em uma dupla camada de peritônio que une um órgão a outro ou à parede do abdome.
O fígado está unido:
À parede anterior do abdome pelo ligamento falciforme (Figura 2.26)
Ao estômago pelo ligamento hepatogástrico, a porção membranácea do omento menor
Ao duodeno pelo ligamento hepatoduodenal, a margem livre espessa do omento menor, que dá passagem à tríade
portal: veia porta, artéria hepática e ducto colédoco (Figuras 2.23 e 2.26).
Os ligamentos hepatogástrico e hepatoduodenal são partes contínuas do omento menor e são separados apenas por
conveniência para descrição.
O estômago está unido:
À face inferior do diafragma pelo ligamento gastrofrênico
Ao baço pelo ligamento gastroesplênico, que se reflete para o hilo esplênico
Ao colo transverso pelo ligamento gastrocólico, a parte do omento maior semelhante a um avental, que desce da
curvatura maior, inferiormente, recurva-se e, então, ascende até o colo transverso.
Todas essas estruturas têm uma fixação contínua ao longo da curvatura maior do estômago, e todas fazem parte do
omento maior, sendo separadas apenas para fins de descrição.
Embora os órgãos intraperitoneais possam ser quase totalmente cobertos por peritônio visceral, todo órgão precisa ter uma
área que não é coberta para permitir a entrada ou saída de estruturas neurovasculares. Essas áreas são denominadas áreas
nuas, formadas em relação às fixações das formações peritoneais aos órgãos, inclusive mesentérios, omentos e ligamentos que
dão passagem às estruturas neurovasculares.
Uma prega peritoneal é uma reflexão de peritônio elevada da parede do corpo por vasos sanguíneos, ductos e ligamentos
formados por vasos fetais obliterados subjacentes (p. ex., as pregas umbilicais na face interna da parede anterolateral do
abdome, Figura 2.13). Algumas pregas peritoneais contêm vasos sanguíneos e sangram quando seccionadas, como as pregas
umbilicais laterais, que contêm as artérias epigástricas inferiores.
Figura 2.25 Principais formações peritoneais. A. Nesta cavidade peritoneal aberta, partes do omento maior, colo transverso e
intestino delgado com seu mesentério foram removidas para mostrar estruturas profundas e as lâminas das estruturas
mesentéricas. O mesentério do jejuno e íleo (intestino delgado) e o mesocolo sigmoide foram seccionados perto de suas fixações
parietais. B. A secção mediana da cavidade abdominopélvica de um homem mostra as relações das fixações peritoneais. C. O
omento maior é mostrado em sua posição “normal”, cobrindo a maior parte das vísceras abdominais. D. O omento menor, que fixa
o fígado à curvatura menor do estômago, é mostrado ao serem rebatidos o fígado e a vesícula biliar superiormente. O omento
maior foi removido da curvatura maior do estômago e do colo transverso para mostrar o intestino. E. O omento maior foi rebatido
superiormente e o intestino delgado foi afastado para o lado direito a fim de revelar o mesentério do intestino delgado e o
mesocolo transverso.
Um recesso ou fossa peritoneal é uma bolsa de peritônio formada por uma prega peritoneal (p. ex., o recesso inferior da
bolsa omental entre as lâminas do omento maior e as fossas supravesical e umbilical entre as pregas umbilicais; ver Figura
2.13).
Subdivisões da cavidade peritoneal
Após a rotação e o surgimento da curvatura maior do estômago durante o desenvolvimento (ver, no boxe azul, “Breve revisão
da rotação embriológica do intestino médio”), a cavidade peritoneal é dividida em sacos peritoneais maior e menor (Figura
2.27A). A cavidade peritoneal é a parte principal e maior. Uma incisão cirúrgica através da parede anterolateral do abdome
entra na cavidade peritoneal. A bolsa omental situa-se posteriormente ao estômago e ao omento menor.
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Figura 2.26 Partes dos omentos maior e menor. O fígado e a vesícula biliar foram rebatidos superiormente. A parte central do
omento maior foi seccionada para mostrar sua relação com o colo e o mesocolo transverso. Muitas vezes o termo omento maior é
usado como sinônimo de ligamento gastrocólico, mas, na verdade, também inclui os ligamentos gastroesplênico e gastrofrênico,
todos os quais têm uma fixação contínua à curvatura maior do estômago. O ligamento hepatoduodenal (margem livre do omento
menor) dá passagem à tríade portal: artéria hepática, ducto colédoco e veia porta.
O mesocolo transverso (mesentério do colo transverso) divide a cavidade abdominal em um compartimento
supracólico, que contém o estômago, o fígado e o baço, e um compartimento infracólico, que contém o intestino delgado e
os colos ascendente e descendente. O compartimento infracólico situa-se posteriormente ao omento maior e é dividido em
espaços infracólicos direito e esquerdo pelo mesentério do intestino delgado (Figura 2.27B). Há comunicação livre entre
os compartimentos supracólico e infracólico através dos sulcos paracólicos, os sulcos entre a face lateral dos colos
ascendente e descendente e a parede posterolateral do abdome.
A bolsa omental é uma cavidade extensa, semelhante a um saco, situada posteriormente ao estômago, omento menor e
estruturas adjacentes (Figuras 2.23, 2.27A e 2.28). A bolsa omental tem um recesso superior, limitado superiormente pelo
diafragma e as camadas posteriores do ligamento coronário do fígado, e um recesso inferior entre as partes superiores das
camadas do omento maior (Figuras 2.26 e 2.28A).
A bolsa omental permite o livre movimento do estômago sobre as estruturas posteriores e inferiores a ela, pois as paredes
anterior e posterior da bolsa omental deslizam suavemente uma sobre a outra. A maior parte do recesso inferior da bolsa é
separada da parte principal posterior ao estômago após aderência das lâminas anterior e posterior do omento maior (Figura
2.28B).
A bolsa omental comunica-se com a cavidade peritoneal por meio do forame omental, uma abertura situada
posteriormente à margem livre do omento menor (ligamento hepatoduodenal). O forame omental pode ser localizado
passando-se um dedo ao longo da vesícula biliar até a margem livre do omento menor (Figura 2.29). O forame omental
geralmente admite dois dedos. Os limites do forame omental são:
Anteriormente: o ligamento hepatoduodenal (margem livre do omento menor), contendo a veia porta, a artéria hepática e
o ducto colécodo (Figuras 2.23 e 2.26)
Posteriormente: a VCI e uma faixa muscular, o pilar direito do diafragma, cobertos anteriormente pelo peritônio parietal
(eles são retroperitoneais)
Superiormente: o fígado, coberto por peritônio visceral (Figuras 2.28 e 2.29)
Inferiormente: a parte superior ou primeira parte do duodeno.
Figura 2.27 Subdivisões da cavidade peritoneal. A. Esta secção mediana da cavidade abdominopélvica mostra as
subdivisões da cavidade peritoneal. B. Compartimentos supracólico e infracólico do saco maior após a retirada do omento maior.
Os espaços infracólicos e os sulcos paracólicos determinam o fluxo de líquido ascítico (setas) em posição inclinada ou ortostática.
Figura 2.28 Paredes e recessos da bolsa omental. A. Esta secção mostra que a bolsa omental é uma parte isolada da
cavidade peritoneal, situada dorsalmente ao estômago e estendendo-se superiormente até o fígado e diafragma (recesso
superior) e inferiormente entre as lâminas do omento maior (recesso inferior). B. Esta secção mostra o abdome de um adulto após
fusão das lâminas do omento maior. O recesso inferior agora estende-se inferiormente apenas até o colo transverso. As setas
vermelhas passam do saco maior para a bolsa omental através do forame omental.
Figura 2.29 Forame omental (epiploico) e bolsa omental. O dedo indicador está atravessando o forame omental, passando
da cavidade peritoneal para a bolsa omental. O ligamento hepatoduodenal está sendo pinçado entre o polegar e o dedo indicador,
o que comprimiria as estruturas da tríade portal (veia porta, artéria hepática e ducto colédoco).
PERITÔNIO E CAVIDADE PERITONEAL
Perviedade e obstrução das tubas uterinas
Embora teoricamente seja possível a entrada de microrganismos na cavidade peritoneal feminina diretamente através
das tubas uterinas, essa peritonite primária é rara, comprovando a efetividade dos mecanismos de proteção do
sistema genital feminino. Um mecanismo primário na prevenção dessa infecção é um tampão de muco que
efetivamente bloqueia o óstio do útero à maioria dos patógenos, mas não aos espermatozoides. A perviedade das tubas
uterinas pode ser avaliada clinicamente por meio de uma técnica na qual se injeta ar ou contraste radiopaco na cavidade
uterina, de onde este normalmente flui pelas tubas uterinas para a cavidade peritoneal (histerossalpingografia; ver mais
detalhes no Capítulo 3).
Peritônio e procedimentos cirúrgicos
Como o peritônio é bem inervado, os pacientes submetidos à cirurgia abdominal sentem mais dor nas incisões
grandes e invasivas do peritônio (laparotomia) do que nas pequenas incisões laparoscópicas ou cirurgias vaginais.
É o revestimento de peritônio (muitas vezes denominado clinicamente serosa), que torna relativamente fácil obter
anastomoses terminoterminais impermeáveis de órgãos intraperitoneais, como o intestino delgado. É mais difícil obter
anastomoses impermeáveis de estruturas extraperitoneais que têm uma lâmina adventícia externa, como a parte torácica do
esôfago.
Em vista da alta incidência de complicações como peritonite e aderências (ver, no boxe azul, “Aderências peritoneais e
adesiólise”, adiante) após cirurgias nas quais a cavidade peritoneal é aberta, são feitos esforços para permanecer fora da
cavidade peritoneal sempre que possível (p. ex., acesso translombar ou anterior extraperitoneal aos rins). Quando é
necessário abrir a cavidade peritoneal, é feito grande esforço para evitar contaminação da cavidade.
Peritonite e ascite
Quando há contaminação bacteriana durante laparotomia ou quando há perfuração traumática ou ruptura do
intestino em virtude de infecção e inflamação (p. ex., apendicite), permitindo a entrada de gás, material fecal e
bactérias na cavidade peritoneal, a consequência é infecção e inflamação do peritônio — peritonite. Há exsudação de
soro, fibrina, células e pus para a cavidade peritoneal, acompanhada por dor na pele sobrejacente e aumento do tônus dos
músculos anterolaterais do abdome. Considerando-se a extensão das superfícies peritoneais e a rápida absorção de material,
inclusive de toxinas bacterianas, da cavidade peritoneal, quando uma peritonite torna-se generalizada (disseminada na
cavidade peritoneal), é potencialmente fatal. Além da intensa dor abdominal espontânea, há dor à palpação, náusea e/ou
vômito, febre e constipação.
A peritonite generalizada também ocorre quando uma úlcera perfura a parede do estômago ou duodeno, derramando
conteúdo ácido na cavidade peritoneal. O líquido em excesso na cavidade peritoneal é denominado líquido ascítico. O
distúrbio clínico caracterizado por líquido ascítico é denominado ascite. A ascite também pode ser decorrente de lesão
mecânica (que também pode causar hemorragia interna) ou de outras doenças, como hipertensão porta (congestão venosa),
metástase disseminada de células cancerosas para as vísceras abdominais e inanição (quando há deficiência da produção das
proteínas plasmáticas, alterando os gradientes de concentração e produzindo protuberância paradoxal do abdome). Em todos
esses casos, a cavidade peritoneal pode ser distendida com vários litros de líquido anormal, que interferem com os
movimentos das vísceras.
Os movimentos rítmicos da parede anterolateral do abdome normalmente acompanham as incursões respiratórias. Se o
abdome for retraído enquanto o tórax se expande (ritmo abdominotorácico paradoxal) e houver rigidez muscular, pode haver
peritonite ou pneumonite (inflamação dos pulmões). Como a dor intensa se agrava com o movimento, as pessoas com
peritonite costumam deitar com os joelhos fletidos para relaxar os músculos anterolaterais do abdome. Elas também
apresentam respiração superficial (e, portanto, mais rápida), reduzindo a pressão intra-abdominal e a dor.
Aderências peritoneais e adesiólise
Se houver lesão do peritônio por uma ferida perfuroincisa, por exemplo, ou por infecção há inflamação das
superfícies peritoneais, tornando-as viscosas com fibrina. Quando há cicatrização, a fibrina pode ser substituída por
tecido fibroso, formando fixações anormais entre o peritônio visceral das vísceras adjacentes ou entre o peritônio
visceral de um órgão e o peritônio parietal da parede adjacente do abdome. Também podem formar-se aderências (tecido
cicatricial) após uma cirurgia abdominal (p. ex., devido à ruptura do apêndice vermiforme), limitando os movimentos
normais das vísceras. Esse aprisionamento pode causar dor crônica ou complicações de emergência, como obstrução
intestinal quando o intestino é torcido ao redor de uma aderência (vólvulo).
A adesiólise refere-se à separação cirúrgica de aderências. As aderências frequentemente são encontradas durante a
dissecção de cadáveres (ver a aderência que une o baço ao diafragma na Figura 2.39B, por exemplo).
Paracentese abdominal
O tratamento da peritonite generalizada inclui retirada do líquido ascítico e, na vigência de infecção, administração de
altas doses de antibióticos. Por vezes, pode ser necessário remover acúmulos mais localizados de líquido para
análise. A punção cirúrgica da cavidade peritoneal para aspiração ou drenagem de líquido é denominada paracentese.
Após injeção de um anestésico local, insere-se uma agulha ou trocarte e uma cânula na parede anterolateral do abdome até a
cavidade peritoneal através da linha alba, por exemplo. A agulha é introduzida superiormente à bexiga urinária vazia, em um
local que evite a artéria epigástrica inferior.
Injeção intraperitoneal e diálise peritoneal
O peritônio é uma membrana semipermeável com extensa área superficial, grande parte da qual (as partes
subdiafragmáticas em especial) situa-se sobre os leitos dos capilares sanguíneos e linfáticos; portanto, o líquido
injetado na cavidade peritoneal é rapidamente absorvido. Por essa razão, agentes anestésicos, como soluções de
barbitúricos, podem ser injetados na cavidade peritoneal por injeção intra-peritoneal (I.P.).
Na insuficiência renal, escórias nitrogenadas como a ureia acumulam-se no sangue e nos tecidos e, por fim, alcançam
níveis fatais. Pode ser realizada diálise peritoneal, na qual as substâncias solúveis e o excesso de água são removidos do
sistema por transferência através do peritônio, usando uma solução estéril diluída que é introduzida na cavidade peritoneal
em um lado e depois drenada do outro lado. Solutos difusíveis e água são transferidos entre o sangue e a cavidade peritoneal
em virtude de gradientes de concentração entre os dois compartimentos de líquido. No entanto, a diálise peritoneal
geralmente é apenas temporária. A longo prazo, é preferível usar o fluxo sanguíneo direto através de um aparelho de diálise
renal.
Funções do omento maior
O omento maior, grande e cheio de gordura, impede a aderência do peritônio visceral ao peritônio parietal. É
bastante móvel e desloca-se ao redor da cavidade peritoneal com os movimentos peristálticos das vísceras. Não raro
forma aderências adjacentes a um órgão inflamado, como o apêndice vermiforme, algumas vezes isolando-o e assim
protegendo outras vísceras. Portanto, é comum, ao penetrar a cavidade abdominal, na dissecção ou durante uma cirurgia,
encontrar o omento muito deslocado da posição “normal” na qual é quase sempre representado em ilustrações anatômicas. O
omento maior também protege os órgãos abdominais contra lesão e proporciona isolamento contra a perda de calor
corporal.
Formação de abscesso
Perfuração de uma úlcera duodenal, ruptura da vesícula biliar ou perfuração do apêndice vermiforme pode causar a
formação de um abscesso (coleção circunscrita de exsudato purulento, isto é, pus) no recesso subfrênico. O abscesso
pode ser isolado inferiormente por aderências (ver, no boxe azul, “Abscessos subfrênicos”, mais adiante).
Disseminação de líquidos patológicos
A importância clínica dos recessos peritoneais está associada à disseminação de líquidos patológicos como o pus, um
produto da inflamação. Os recessos determinam a extensão e o sentido da disseminação de líquidos que podem
entrar na cavidade peritoneal quando um órgão está doente ou é lesado.
Fluxo de líquido ascítico e pus
Os sulcos paracólicos são importantes clinicamente porque proporcionam vias para o fluxo de líquido ascítico e a
disseminação de infecções intraperitoneais (Figura 2.27B). O material purulento (que consiste em [ou contém] pus)
no abdome pode ser transportado ao longo dos sulcos paracólicos para a pelve, sobretudo quando a pessoa está em
posição ortostática. Assim, para facilitar o fluxo de exsudato para a cavidade peritoneal, onde a absorção de toxinas é lenta,
os pacientes com peritonite frequentemente são colocados sentados (no mínimo a 45°). Por outro lado, as infecções pélvicas
podem estender-se superiormente até um recesso subfrênico situado sob o diafragma (ver, no boxe azul, “Abscessos
subfrênicos”, mais adiante), principalmente quando a pessoa está em decúbito dorsal. Do mesmo modo, os sulcos paracólicos
são vias para a disseminação de células cancerosas que se soltaram da superfície ulcerada de um tumor e penetraram a
cavidade peritoneal.
Líquido na bolsa omental
A perfuração da parede posterior do estômago provoca a passagem de seu conteúdo líquido para a bolsa omental. A
inflamação ou lesão do pâncreas também pode permitir a passagem de líquido pancreático para a bolsa, com
formação de um pseudocisto pancreático.
Intestino na bolsa omental
Embora raro, uma alça de intestino delgado pode atravessar o forame omental, entrar na bolsa omental e ser
estrangulada pelas margens do forame. Como não se pode fazer incisão em nenhum dos limites do forame porque
todos contêm vasos sanguíneos, o intestino edemaciado deve ser descomprimido usando-se uma agulha, de modo
que possa ser recolocado na cavidade peritoneal através do forame omental.
Secção da artéria cística
A artéria cística tem de ser ligada ou clampeada e depois seccionada durante a colecistectomia, a retirada da vesícula
biliar. Às vezes, entretanto, é seccionada acidentalmente antes de ser adequadamente ligada. O cirurgião pode
controlar a hemorragia comprimindo a artéria hepática no ponto em que atravessa o ligamento hepatoduodenal. O
dedo indicador é colocado no forame omental e o polegar sobre sua parede anterior (Figura 2.29). Compressão e liberação
alternadas da artéria hepática permitem ao cirurgião identificar a artéria que está sangrando e clampeá-la.
Pontos-chave
PERITÔNIO, CAVIDADE PERITONEAL E FORMAÇÕES PERITONEAIS
Peritônio e cavidade peritoneal: O peritônio é uma membrana serosa contínua que reveste a cavidade abdominopélvica
(o peritônio parietal) e as vísceras contidas (o peritônio visceral). ♦ A cavidade peritoneal colapsada entre as lâminas parietal
e visceral normalmente contém apenas líquido peritoneal suficiente (cerca de 50 ml) para lubrificar a face interna da
membrana. Essa disposição permite que o intestino tenha a liberdade de movimento necessária para alimentação (digestão).
♦ Aderências decorrentes de infecção ou lesão interferem com esses movimentos. ♦ O peritônio parietal é uma membrana
sensível, semipermeável, com leitos capilares sanguíneos e linfáticos abundantes profundamente à sua superfície
subdiafragmática.
Formações peritoneais e subdivisões da cavidade peritoneal: As continuidades e conexões entre os peritônios
visceral e parietal ocorrem nos locais em que o intestino entra e sai da cavidade abdominopélvica. ♦ Partes do peritônio
também ocorrem como pregas duplas (mesentérios e omentos, e subdivisões chamadas ligamentos) que dão passagem às
estruturas neurovasculares e aos ductos de órgãos acessórios que entram e saem das vísceras. ♦ Os ligamentos peritoneais
recebem os nomes das estruturas específicas unidas por eles. ♦ Em virtude da rotação e do crescimento exuberante do
intestino durante o desenvolvimento, a disposição da cavidade peritoneal torna-se complexa. A parte principal da cavidade
peritoneal é dividida pelo mesocolo transverso em compartimentos supracólico e infracólico. ♦ Uma parte menor da cavidade,
a bolsa omental situa-se posteriormente ao estômago, separando-o das vísceras retroperitoneais na parede posterior.
Comunica-se com o saco maior através do forame omental. ♦ A disposição complexa da cavidade peritoneal determina o
fluxo e o acúmulo de excesso de líquido (ascítico) na cavidade peritoneal em casos de doença.
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